Então terminaremos de retirar ineditismo a essas quadras zelosamente entesouradas por oitenta e cinco anos no patrimônio familiar dos Faria de Castro com estes dois últimos nomes da lista, uma última mulher, completando uma dezena, e um homem, o único nesse álbum.
A mulher que nos falta é Oliva Guerra, conforme se assinava Oliva Correia de Almada Meneses Guerra (1898 -1982). Poetisa, musicóloga (pianista e historiadora de música) e cronista. Exatamente no três de Novembro de mil novecentos e catorze publicava, no número 487 da Ilustração Portuguesa, seu poema Avante, onde incitava os portugueses à luta na primeira grande guerra, e que teve repercussão abrindo-lhe as portas da Imprensa à época, destacando a menina (com 15 anos) de São Pedro de Penaferrim, em Sintra, nascida na rua Manuel Adriano Mourato Vermelho, na casa ancestral que depois herda e vai conservar a vida inteira. Vida que sempre esteve ligada à Sintra, foi presidente de seu Instituto, autora de seu roteiro, o famoso Roteiro lírico de Sintra, local onde nasce e morre nessa mesma casa, da mesma rua, de seu adorado São Pedro, onde no fim de vida passou momentos difíceis, como nos revela sua prima Antonieta. Hoje, desde 1992, empresta seu nome ao concurso de poesia desse concelho, onde lembramos em sua contemporaneidade o poeta Joaquim Nunes Claro (1878 - 1949), que nascido em Lisboa, vivia em Sintra, onde era médico, e onde criara a famosa tertúlia clara, na qual Oliva participava com outros como Álvaro de Castro, Henrique de Vilhena, e Matos Sequeira, lembremos também sua amiga Olga Cadaval (1900 - 1996), a condessa italiana, com quem tinha duas grandes afinidades, a música e a cultura italiana, e que conhecera quando essa se instalou em Colares no ano anterior ao dessa festa da Revista Feminina, 1929, na quinta dos Álvares Pereira de Mello, a Quinta da Piedade, onde eu ainda tive a oportunidade de a conhecer velhinha, pouco antes de falecer, sempre com o sotaque, era essa a propriedade que recebera de seu marido, D. Álvaro Caetano, que também lhe legara os apelidos portugueses, pois nascera Nicolis de Robilant, e, onde junto com o compositor José Vianna da Motta (1868 - 1948), com quem Oliva discutia sobre música, sua outra grande paixão, participavam, os três, na Sociedade de Concertos, fundada por Vianna da Motta em 1917, quando voltara do Conservatório de Genebra onde fora professor de virtuosidade, após sua formação em Berlim custeada pela Condessa de Edla, o que quer dizer por D. Fernando II, o que nos leva à Feteira da Condessa, no Parque da Pena, onde um mármore imortaliza um poema de Oliva datado de 1957, colocado junto à ponte perto do chalet. Memórias de um tempo que mais ninguém cuida. Entre os livros de Oliva a destacar estão, para além do roteiro, os "Passos ao longe", e "Encantamento".
É no Diário de Lisboa onde é mais ativa na sua atividade de cronista, além de outros jornais como O Século e A Voz, e contribuindo também em inúmeras revistas, entre estas, essa que promoveu este sarau que recordo, a Feminina, a dessa festa que vos fui contando ao longo desses seis artigos sobre um álbum, um registro de memórias, e uma cápsula do tempo, que guardou sentimentos e vontades, nomes e talentos, numa preservação agoara aqui revelada, e que de outra sorte quedaria onde se encontra, entre os velhos papéis dos Faria de Castro, escondendo tanta lembrança, ocultando tanto passado, essa diáfana circunstância da memória que só depende da vontade de recordar, e prestar tributo à todos que deixaram sua marca em seu tempo, pois aqui fica, então, a quadra de autoria de Oliva, naquela festa em pleno verão do remoto ano trinta do século passado:
Caravellas sonhadoras
Trouxeram-nos do alto mar
Lindos sonhos que hoje ainda
Portugal anda a sonhar...
A outra figura deste álbum é o poeta João Silva Tavares (1893 - 1964) o anarquista de quem ainda encontrei na minha biblioteca o seu Comentário ao Cortejo do Roteiro do Mundo Português, que, com quarenta livros de poesia publicados, era também escritor e dramaturgo com mais de noventa peças, mas sua grande revelação deu-se na revista portuguesa, que cultivou com seu caráter ligeiro e popular que empregava na sua lírica, tendo sido muito afeito também à opereta, não tendo deixado de compor o libreto da ópera D. João IV com a qual se reabriu o teatro de São Carlos em 1940 no ciclo das comemorações do oitavo centenário. Nascido em Estremoz, alentejano portanto, onde na biblioteca de sua cidade natal está representado em busto que a essa instituição legou em testamento. Viveu também muito ligado à rádio, tendo sido chefe da coordenação de programas da Emissora Nacional por três décadas, também foi bom fadista, e quem não sabe cantarolar o seu" Que Deus me perdoe " que Amália imortalizou? Ou "A casa da Mariquinhas", cantado primeiro por Alfredo Marceneiro e depois pela Amália? Entre tantos outros fados. Não confundir com outro grande poeta de mesmo apelido, de nome Vítor (1937 - 2015) que era também editor e que não tinha nenhum parentesco com o João que evoco aqui. Sua quadra no álbum é datada de 1945, de Julho, em Santarém, ou seja quinze anos depois das outras dez, e em local diverso, não tendo estado na festa que começou o álbum que termina com a quadra que é assim:
Entre mulher e marido
Arrufos não valem nada:
-Por ter a pouco chovido
é que a rua está lavada...
Assim termino esse passeio pela memória, de onde tiramos do ineditismo uns quantos versos de diferentes e variadas autoras, que bem demostraram a força da produção literária da mulher portuguesa no XX. Para logo teremos acesso a parte do acervo de José Blanc de Portugal e Fausto Lopo de Carvalho, de onde se porão à luz outras tantas peças de muitos outros autores portugueses, dando continuidade a essa série de artigos com interesse literário, que amenizam o panorama do Jornal, tão acossado pela discussão científica e política à qual não me posso furtar.
É no Diário de Lisboa onde é mais ativa na sua atividade de cronista, além de outros jornais como O Século e A Voz, e contribuindo também em inúmeras revistas, entre estas, essa que promoveu este sarau que recordo, a Feminina, a dessa festa que vos fui contando ao longo desses seis artigos sobre um álbum, um registro de memórias, e uma cápsula do tempo, que guardou sentimentos e vontades, nomes e talentos, numa preservação agoara aqui revelada, e que de outra sorte quedaria onde se encontra, entre os velhos papéis dos Faria de Castro, escondendo tanta lembrança, ocultando tanto passado, essa diáfana circunstância da memória que só depende da vontade de recordar, e prestar tributo à todos que deixaram sua marca em seu tempo, pois aqui fica, então, a quadra de autoria de Oliva, naquela festa em pleno verão do remoto ano trinta do século passado:
Caravellas sonhadoras
Trouxeram-nos do alto mar
Lindos sonhos que hoje ainda
Portugal anda a sonhar...
A outra figura deste álbum é o poeta João Silva Tavares (1893 - 1964) o anarquista de quem ainda encontrei na minha biblioteca o seu Comentário ao Cortejo do Roteiro do Mundo Português, que, com quarenta livros de poesia publicados, era também escritor e dramaturgo com mais de noventa peças, mas sua grande revelação deu-se na revista portuguesa, que cultivou com seu caráter ligeiro e popular que empregava na sua lírica, tendo sido muito afeito também à opereta, não tendo deixado de compor o libreto da ópera D. João IV com a qual se reabriu o teatro de São Carlos em 1940 no ciclo das comemorações do oitavo centenário. Nascido em Estremoz, alentejano portanto, onde na biblioteca de sua cidade natal está representado em busto que a essa instituição legou em testamento. Viveu também muito ligado à rádio, tendo sido chefe da coordenação de programas da Emissora Nacional por três décadas, também foi bom fadista, e quem não sabe cantarolar o seu" Que Deus me perdoe " que Amália imortalizou? Ou "A casa da Mariquinhas", cantado primeiro por Alfredo Marceneiro e depois pela Amália? Entre tantos outros fados. Não confundir com outro grande poeta de mesmo apelido, de nome Vítor (1937 - 2015) que era também editor e que não tinha nenhum parentesco com o João que evoco aqui. Sua quadra no álbum é datada de 1945, de Julho, em Santarém, ou seja quinze anos depois das outras dez, e em local diverso, não tendo estado na festa que começou o álbum que termina com a quadra que é assim:
Entre mulher e marido
Arrufos não valem nada:
-Por ter a pouco chovido
é que a rua está lavada...
Assim termino esse passeio pela memória, de onde tiramos do ineditismo uns quantos versos de diferentes e variadas autoras, que bem demostraram a força da produção literária da mulher portuguesa no XX. Para logo teremos acesso a parte do acervo de José Blanc de Portugal e Fausto Lopo de Carvalho, de onde se porão à luz outras tantas peças de muitos outros autores portugueses, dando continuidade a essa série de artigos com interesse literário, que amenizam o panorama do Jornal, tão acossado pela discussão científica e política à qual não me posso furtar.