segunda-feira, 22 de abril de 2024

NÓS SOMOS TERRA.

Nós somos terra. O pó ao qual voltaremos A água em que é o planeta O que alimenta a terra Esta Terra em que vivemos Absolutamente nada no Universo Terra que te quero água Terra que te quero terra Terra que é tudo Terra que é nada Parte de nós enquanto vida Somos parte tua enquanto morte Pertence-me inteira e desmedida Compromisso de toda vida e melhor sorte.

UNE SEM PRÉDIO - a caminho dos 50 anos - percuciência e destino.

UNE SEM PRÉDIO – a caminho dos 50 anos – percuciência e destino. Helder Paraná Do Coutto | Abril 7, 2024 Predio da UNE hoje. Salvador – Bahia – 30/5/1979: 31º Congresso Nacional da UNE. Foi aí a refundação da União Nacional dos Estudantes do Brasil – UNE – portanto era normal falarmos no Congresso, de que o prédio da Praia do Flamengo deveria ser retomado. Esta conversa, simples e ocasional, repercutiu fortemente nos estamentos do poder em Brasília. E, com medo do símbolo que o prédio representava, contrataram logo uma empresa de demolição para que pusesse abaixo o que restava da sede da União no Rio de Janeiro, o antigo Clube Germânia, confiscado na 2ª Guerra Mundial, após sua ocupação pelos estudantes em 1942, tendo sido entregue por Vargas à UNE, formada poucos anos antes, para ser sua sede. Rio de Janeiro – fins de 1979. Tentando evitar a demolição eminente, eu, o autor deste texto, tenho a ideia de que a Justiça poderia interferir, embargando a demolição. Movimento os alunos da Uni-Rio, que tiveram no prédio a sua escola. Transformamos a Casa do Estudante em Botafogo em Quartel General da resistência, e onde todos nos reuníamos para decidir das ações. Encontro no advogado Matta Machado o bravo que aceita patrocinar a causa. A ação é contra a União, e sorteada no âmbito das Varas Federais do Rio de Janeiro, cai na 3ª Vara Federal 2, cujo Juiz era o Dr. Carlos David dos Santos Aarão Reis, outro que põe sua vida em risco em meio a essa tragédia que foi a Ação Popular que encabecei na Justiça para paralisar a demolição do prédio. Os dados estavam lançados. (*) Rio e Brasília – 10/6/1980. Após meses de luta Judiciária, com grande movimentação popular e imprensa todo dia, o movimento que criei acabou por levar ao Juiz Aarão Reis, de arma em punho, a ir à demolição que prosseguia contra a suspensão que decretara, dando ordem de prisão aos 13 funcionários da empresa de demolição, vi então que era necessário introduzir a componente política, e para tal era necessária uma ida a Brasília. Forneceu o bilhete o deputado companheiro da Branca Moreira Alves, que não me lembro o nome. Chegado ao DF a 9, tinha agenda cheia para o 10. Todos sabiam em Brasília que o autor da ação contra a derrubada do prédio viera pedir ajuda. E enquanto a UNE em peso, os estudantes cariocas, e não só, sofriam os horrores da água de comichão, do gaz lacrimogênio, e da porrada da polícia na manifestação do flamengo, uns 100.000, com agressões e prisões. Em Brasília eu tive desmarcada quase todas as audiências. Por fim fui informado que o Dr. Ulisses Guimarães queria falar comigo. Fui ao gabinete da presidência do MDB, me informaram que o Dr. Ulisses estava no seu carro me esperando. Fui levado ao carro que estava na praça dos 3 poderes, foi posto logo em marcha começando um passeio pelas quadras de Brasília. Então o Dr. Ulisses me disse que era escusado eu pedir ajuda, porque o prédio tinha de ir ao chão. Porque? Era a ordem do Golbery. Não haveria abertura com o prédio de pé. Era um preço a pagar. O processo que lá estava em andamento, com enorme expectativa dos políticos, começara com o novo ditador que tinha cara para as mudanças: o General João Baptista de Oliveira Figueiredo, ex-chefe do SNI, que já promulgara, logo no começo de seu período, a Lei 6683, de 28/8/1979, que dava anistia geral – lei contra a qual eu era – e sou – uma Renovação da farsa da legalidade. – Eu disse ao dr. Ulisses que entendia que minha luta ia ser inglória, mas que eu ia até o final. Assim também fez o Juiz da causa. A resposta da ditadura foi pronta, reuniu numa noite pela madrugada dentro, os ministros do Superior Tribunal de Justiça para caçarem as decisões e extinguir a ação, e o castigo ao Dr. Aarão Reis, foi pô-lo em disponibilidade proporcional remunerada, o que, como juiz muito novo então, com o que passou a receber não dava para pagar suas contas. A falsa abertura. Sabedores os militares que viria uma terrível crise financeira internacional, entendiam que esta combinada com a ditadura era uma matéria muito explosiva, e que era melhor afrouxar para evitar a convulsão. E assim foi. Como era este o único intento da abertura, todo o processo de repressão, raptos, tortura, assassinatos, e intimidação montado era para manter, e assim foi. E, como antes, como se havia passado com o deputado Engenheiro Rubens Paiva, 22/1/1971, com a Zuzu Angel, 4/4/1976, para citar apenas dois exemplos, tudo ia continuar como dantes, que não duvidassem. Assim foi com a carta-bomba enviada ao presidente da OAB, dr. Seabra Fagundes, que explodiu nas mãos de sua secretária, D. Lyda Monteiro, 27/8/1980, matando-a. Ou como a bomba do Riocentro, 1/5/1981. Bombas em bancas de jornal, para intimidar e coibir a venda dos alternativos, o que foi conseguido. E neste 1980 houve dezenas de bombas, duas especialmente foram explodidas na sede do Jornal onde eu era diretor, uma mesmo embaixo da minha mesa de trabalho no Hora do Povo. O processo de abertura programado pela ditadura, especialmente coordenado pelo gal. Golbery, deveria ser lento e gradual. Teríamos ainda o homem do PDS, já no PMDB, presidente por mais cinco anos, um civil, é verdade, mas que civil mais reaça. A história continua – o 132 da Praia do Flamengo é apenas um terreno já há 20 anos, mas tem dono. 1996- Terreno devolvido, mas com um estacionamento lá dentro. FHC. 2000- Tentativa de retomada administrativa do terreno. Pres. da UNE: Wadson Ribeiro. 2001- 2º projeto Niemeyer apresentado na 2ª Bienal da UNE. (**) 2007- Tomada na marra do terreno pelos estudantes – posse efetiva. Pres. da UNE: Gustavo Pitta. Depois de 11 anos de luta na Justiça o terreno continuava na mão do estacionamento. 3º Projeto Niemeyer. 2008- É atribuída pelo Presidente Lula verba de 30 milhões para a construção do prédio – Lei 3931/08. Fui contra, preferia que o governo contratasse a obra. 2010- Lançamento da pedra fundamental com a presença de Niemeyer e Lula. Pres. da UNE: Augusto Chagas. 2012- Início das obras. 2016- O prédio devia estar acabado com 13 andares. 2024- Lá está o esqueleto se degradando com apenas seis. “Casa dos sonhos invencíveis.” Passado quase meio século, o prédio da UNE não existe, existe um esqueleto. O Golbery, já falecido na época dos últimos acontecimentos que ocorreram na história do prédio (morreu em 1987) ainda deve estar a rir-se hoje lá do inferno onde habita, pois grande conhecedor da alma brasileira e dotado de um fino humor, antevia que, uma vez derrubado, a reconstrução iria enfrentar inúmeros percalços, porque a índole brasileira não é de atingir resultados como meta. Por isso só permitia a abertura política com o prédio no chão. Foi assim com a situação dos desaparecidos, que nunca foi explicada, foi assim com os que a justiça excluiu, e com os administrativamente excluídos pela ditadura, todos mantidos no limbo, o conveniente limbo de existirem, mas permanecerem punidos sem terem regularizada sua situação. Assim é com o prédio, permanece punido sem ver regularizada sua situação. Golbery vence. (*) Coincidentemente Advogado e Juiz com familiares presos, torturados e assassinados pela Ditadura Militar. (**) O primeiro projeto de Niemeyer era de depois da demolição, eu tinha falado com ele, levado pela Ana Maria, e vira na oportunidade o 1º projeto que se perdeu. Em 2001 foi feito um segundo, o apresentado em maquete da 2ª Bienal da UNE. Em 2007 Niemeyer faz um 3º projeto para o prédio. Créditos das fotos: Lúcia Helena Velloso dos Reis e UNE.