Por alguma razão que desconheço, ciclicamente emerge uma fermentação latente que, vindo ao de cima, desnatura todo o sistema, infectando e envenenando a relação normal que as instituições e as pessoas mantinham, dividindo-as entre nós e eles, promovendo o ódio geral, onde algum deste é mais particular, sendo dirigido a um grupo específico, bode expiatório que sirva para justificar a revolta e a raiva que fez por emergir esse veneno.
Muitos bebem-no com desmesurado ânimo e desenfreado ímpeto, sôfregos da mudança, malsofridos da lentidão aparente com que as coisas evoluem, como se houvesse uma solução mágica, uma bala de prata, que solucionasse todos os problemas. E na falta dela, apregoam a sua, a mistificação absoluta que toca a reunir milhões de iludidos, crédulos em uma nova vida, uns, e dando apenas azo a sua revolta, outros.
Deste dipolo emocional a praga se espalha, infectando multidões de crentes em ambas as vertentes, que motivados por razões tão opostas confluem na mentira da embriaguez de uma suposta esperança ou no impulso inconformista, esquecendo que a Democracia é uma forma de governo que, por sistema, acolhe e alberga o inconformismo, dando-lhe vaza em seu processo, e promovendo soluções que o satisfaçam. Porém estes, em sua insatisfação, essas multidões, servem exemplarmente aos que as lideram, que, ascendendo meteoricamente, tomam o poder, ou parte dele, passando a viver vida regalada de destaque e proeminência pela manipulação desses sentimentos que se espalharam.
Para além da falta de líderes, esse vazio de homens e mulheres que tenham capacidade e ideias para criarem os caminhos do futuro, e que saibam fazer frente a esses que espalham seus venenos, com isso há um certo ar bafio e pestilento que se vai entranhando em tudo, como há também perspectivas tão anômalas, baseadas em improbabilidades e gostos excêntricos, que geram sentimentos pouco conformes com a herança ética que receberam. Vimos ao longo da história várias vezes estas correntes terem feito a escolha do lado negro, atacando e ferindo conceitos fundamentais como o império da Lei, os Direitos das minorias, e as liberdades democráticas, bem como a de expressão e a liberdade de imprensa. Temos portanto uma música estranha a tocar, com valores alterados e padrões retorcidos. Tendo tudo mudado tão depressa não houve tempo para que uma filosofia da e para esta nova realidade se estabelecesse, e deste modo nos perdemos nela, na nova realidade, e se vamos por esse desvirtuado rumo, penso que nos iremos perder a nós mesmos.
PERIGO!
Já Vos falei de que há um vírus que está no ar, foi quando vos lembrei Machado no seu delicioso conto que nos fala da Igreja do diabo, várias vezes, e ao longo de vários anos Vos tenho insistentemente prevenido para o perigo desta ascensão arrivista. E ela tem se tornado sempre e cada vez pior! Tudo que não for prevenido e acautelado, terá que ser remediado, podendo entrementes cobrar milhões de vida como preço do remédio que a queira remediar, porque para inflectir e voltar ao normal uma sociedade, sofreremos a vertigem do vértice ao vórtice colocando-nos a beira do precipício, e o preço do retorno é sempre muito alto, mas como nós (Humanidade) só somos bons e efetivos nos extremos, e reagimos quando estamos quase a cair no abismo, temos então, antes, que experimentar a vertigem, triste condição a humana esta que se repete em ciclos catastróficos.
E agora por toda parte vemos que essa gente sem medidas e sem escrúpulos, que a todo custo busca ascender, trazendo essas qualidades de empregar o arrivismo como método, está ganhando espaço, e apesar das experiências passadas, pois esse filme é déjà vu, em que todos sabemos onde vão dar, não promovem os responsáveis e toda gente, uma reação forte e efetiva para purgar o ambiente democrático desses instiladores do único veneno que pode efetivamente matar a tão poderosa e ao mesmo tempo frágil DEMOCRACIA.