"A vida é a arte do encontro, malgrado haja tanto desencontro nessa vida."
Vinícius de Morais.
Dos extremos, como nas estações do ano, para o calor e o frio, 'locus horrendus' versus 'locus amoenus' como se demarcava então na visão literária romântica, posto que será com essa visão literária que se consolidará a ideia antiga, consumada no sexto século antes de Cristo, donde teremos o 'testimonii loco', o 'Colletio loco', um 'locus tutum', lugar seguro, o lugar do encontro, posto que com as oferendas das Musas na Grécia antiga, formaram-se coleções de objetos preciosos e exóticos que eram exibidos mediante o pagamento de uma pequena taxa. Pouco depois, no final da época Neobabilônica (530 a.C) a princesa Enigaldi-Nana, filha de Nabonido, com as coleções da dinastia caldeia, que vinham desde Nabucodonosor II, formou o primeiro Museu, entendido como hoje o entendemos, com finalidade eminentemente cultural. Teria de transcorrer mais de um milénio, onze séculos, para voltarmos a valorizar esta ideia - museu - lugar de encontro.
'Collectio loco'.
Essa expressão, que é a forma latina do título escolhida para este artigo, bem como sua introdução via literária, se devem ao fato de que é do coleccionismo que nascem os museus, mesmos os coleccionismos involuntários, como ocorre tantas vezes com as peças que deixaram de ter uso corrente e permaneceram guardadas nas cafuas das famílias e instituições. E tanto é, o que quer significar aqui 'encontro', exatamente como está também na raiz da palavra coleção, como temos as Musas, as nove filhas de Zeus com a Memória [Mnemósine] (e que eram as das Poesias, épica e lírica, a da História, as da tragédia e da comédia, as das Músicas, a corrente e a sacra, a da Dança, e a da Astronomia e Astrologia) Calíope, Erato, Clío, Melpomêne, Tália, Euterpe, Polímia, Terpsicore, e Urânia respectivamente, que deram origem com suas coleções de objetos preciosos ao termo Museu, para o local da exposição dos mesmos.
E é deste encontro que Vos quero falar, posto que o lugar de encontro que desejo referir aqui e agora, é o Museu da Misericórdia de Cascais que se inaugura neste dez de Abril de 2022, data solene, visto que é enfática e infunde respeito a um só tempo, daí sua solenidade, a que na magia do tempo restará por testemunho, capsula do tempo, universo de referências, razão nossa, posto que nos define, razão de memória, com M grande, da mãe das Musas, que reunem todas as artes, visto que sem Arte, a vida é nada. A mim, que escrevo esse texto, cabe uma mui pequenina responsabilidade por esse Museu vir a existir, cuja Missão é a da Misericórdia, assumida em sua plenitude pela sua Provedora, Dra. Isabel Miguéns de Almeida Bouças, na realização das obras que a definem, tanto as corporais, como as espirituais, que aqui permanecerão no testemunho de sua realização, e cujo incumbente é, por sua visão maior, o Presidente da Câmara, Dr. Carlos Manuel Lavrador de Jesus Carreiras, que com sua simplicidade e objetividade, tem assumido a lúcida visão do futuro mister.
Futuro necessário.
Na continuidade do passado é que se constrói o futuro, uma vez que ninguém pode partir do nada, posto que quando todos aqui chegamos havia já uma realidade estabelecida, ignorá-la é desmerecer a História (Clio) e a Memória (Mnemósine, sua mãe). Assumir esse passado é a grande obra necessária ao futuro, que em si mesma se alimenta, posto que por preservá-lo criamos o que virá, o testemunho rico, o registo da História que remanesce após a vida ter acontecido em cada sítio, preservar o conhecimento dessa história, é criar o futuro necessário. Para o turismo, por exemplo, mais frequência, mais negócios, que ninguém vem a uma terra onde não há o que ver. Para os da terra, um outro exemplo, é o de seu passado, o caminho que estabelece seu auto-respeito, seu patriotismo, e seu orgulho. Infelizmente pouca gente entende isso, mas o futuro, esse que é necessário, revelará que assim é.
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