O blog O Olho do Ogre é composto de artigos de opinião sobre economia, política e cidadania, artigos de interesse sobre assuntos diversos com uma visão sociológica, e poesia, posto que a vida se não for cantada, não presta pra nada. O autor. Após algum tempo muitas dessas crônicas passaram a ser publicadas em jornais e revistas portugueses e brasileiros, esporadicamente.
segunda-feira, 2 de agosto de 2021
DA SUPRA-ANIMALIDADE HUMANA.
Desde o desejo de posse, às tatuagens e às alterações do corpo, passando pelas máscaras e rituais de iniciação, ao 'patronus' de Mrs. Howlings no seu Harry Potter, temos nossa identificação animal, que se traduz em insensibilidade, em indiferença, e, sobretudo em decisões duras, sem sentimentos, que vão desde a opção por um comportamento ou ação que no limite irá resultar na morte de quem ela afetar, até uma ação direta de forçar, atacar, ferir, e mesmo matar alguém, outra vez com fim último. Podem ocorrer individualmente, ou atingir milhões através de ações ou decisões que afetam populações inteiras, que vão desde a negação de ocorrências de situações que irão resultar em morte, até as guerras, ou extermínios, que atingem à todos contra quem forem perpetrados, verificado neste campo especial destaque para o Holocausto. Motivações que residem nas raizes mais profundas de nossa animalidade, no cérebro reptiliano, recriando nossas múltiplas tendências animalescas, mas com selvageria hiper-selvagem, as quais podemos anotar desse modo:
Por sua manifestação individual.
Como um sentimento dominante, como uma força que surge inusitada e inesperadamente, uma possessão, (Na idade média dizia-se que estavam possuídos pelo demônio.)inevitável energia que nos domina e leva-nos a cometer atos muito para além dos que os animais seriam capazes de cometer, posto que levam-nos a matar futilmente, quando os animais só matam para comer ou por medo (Por isso chamo de super-animalidade, matar por gosto.). Manifesta-se num indivíduo como uma presença, afetando-o, ou como consequência dos já afetados. Afetando àqueles que se deixam dominar por sua presença, num caso, ou noutro surge essa presença para aqueles que já estavam afetados (pelo ódio, pelas drogas, pelo álcool, ou mesmo por uma falsa e/ou justificada impressão perturbadora) a qual reagem com violência, quase sempre maior da que qualquer animal seria capaz. Ademais os humanos possuem instrumentos que os animais não possuem, dos venenos às armas, dos gestos às palavras (uma palavra pode ser mais contundente, mortífera, e letal, muitas vezes mais que uma arma).
O que está na raiz dessa insurgência é, na maioria dos casos, a ambição, noutros casos vaidade e presunção, e noutros ainda puro e simples desejo de poder, que muitas vezes se manifesta em absoluta maldade, e no gosto de exercer domínio e/ou superioridade de toda ordem.
Por sua manifestação colectiva.
O 'animal' que surge para além da individualidade quando se forma um grupo, e é substancialmente mais irracional que qualquer indivíduo que o forma. Uma vez perdida a individualidade, a consciência bloqueia, ou se anula em cada um de nós, e ganhamos aquilo que se acostumou chamar de 'consciência colectiva', que estimulada em modo pró-violência, consegue alcançar altíssimos níveis de irrascibilidade, que, ao se manterem, transformam-se em tirania e opressão, que também são faces outras da super-animalidade humana (em muitos grupos animais existe também alguma opressão superveniente, fruto da dominação dos alfas).
O animal em nós é muito mais perigoso, muito mais agressivo, e muito mais violento do que aquilo que qualquer animal pode ser.
Em sua face tribalista.
O homem em sua organização primitiva para viver em colectividade organizou-se em tribos, a memória desta primeira fase da vida em grupo guarda um comportamento público de instigação, com maldade e violência muito agressivo, com intenções que são manifestas no grupo, ou, para além do grupo, também nos rivais externos, com um norte bem definido, atacar ao inimigo, inicialmente com palavras vexatórias para dentro e para fora da tribo, e, logo a seguir, com a prática da exclusão, primeiro psicológica e moral, logo depois física, daquele que ganhou a inimizade, é rival ou bode expiatório, passando este a ser alvo da agressão, que pode evoluir até a eliminação do indesejado com sua morte.
Pelos punhos.
Os punhos, essa característica humana muito desenvolvida, mais visível no gênero masculino, inevitável herança ancestral do animal que somos, leva quase sempre a uma série de distúrbios e atos violentos muito recorrentes entre grupos diversos, e nas relações de convívio, sobretudo os domésticos, nos quais a manifestação alfa de domínio faz com que os punhos entrem em ação para exercerem seu poder sobre os elementos da casa.
No entanto essa forma de ser é o que nos dá possibilidades infinitas de criação e ciatividade, e nossas infinitas capacidades de e para nos reinventarmos, o ímpeto 'animal' é mister, só carece de fazermos as escolhas certas, com o livre-arbítrio de ir pelo caminho da violência, ou não.
Da evidência histórico-fenotípica.
A história em nós, conta a história da Humanidade. E qual foi ela? Qual tem sido? Foi, é, e tem sido sempre uma história de violência, desde as tribos guerreando entre si, até grupos de nações fazendo o mesmo, unicamente o que aconteceu neste interregno temporal até chegarmos a ser países, foi apenas aprimorar os métodos de matar, a funda, o arco, transformou-se em mísseis balístico, mas o objetivo é o mesmo, e este só. E nossa História, a das nações, das religiões, das culturas, é a história do ódio, da violência, do extermínio. A repetição constante dos processos de violência nos foi moldando, transformando-nos no que somos, e consolidando os instintos primitivos, os do cérebro reptiliano, e foi formando nosso fenótipo de agressividade brutal, muito superior a animal, mais mortífera, mais letal, e mais violenta, com a característica esdrúxula de ser fútil, como a própria a Natureza a analisaría, posto que em sua ação universal repudia tudo que é inútil.
Em sua pior face: O TERROR.
Quem gosta de história, a primeira coisa de que se lembrará ao ouvir a palavra terror, é de um certo período da Revolução Francesa, onde milhares perderam a cabeça, cortada por ordem do Estado, que para acelerar e facilitar o processo criou um instrumento de triste memória, epônimo do Dr. Guillotin, que sugeriu sua utilização. Mas o terror institucional, ou aquele o qual grupos de poder ocasionam, não é expontâneo, tem uma componente premeditada que visa exercê-lo com o intuito de prevenir e conter toda e qualquer ação contra seus interesses, através da intimidação.
O terror expontâneo que se apodera, ao manifestar-se, do indivíduo que o provoca ou acolhe, é muito mais consistente e irracional, uma vez que ultrapassa sua dimensão humana, e, se alimentando de si mesmo, só visa compelir e constranger todos quanto afeta, numa torrente com fluxo em crescendo, buscando ser sempre mais horrivel, para mais temível ser. [E malo nascitur omne malum.] Eis o terror criado por alguém ou por um grupo, que nesta e com essa ação gera uma entidade supra-existente, que, superveniente, se alimenta de si mesma, sendo terror para gerar mais terror, num caudal incontrolável. Nesse momento seus autores já não são humanos, muito menos animais, são outra coisa que não tem rosto, e que não tem controle.
Da maldição de assim ser.
Somos como somos porque vive em nós tudo que fomos. É tudo em nós. Se abrimos a porta a um sentimento escuro, seremos escuridão, já se convocarmos a luz, seremos claridade. Tudo que excitarmos se manifestará e viverá em nós, essa é nossa maldição.
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