sábado, 30 de dezembro de 2017

A espontaneidade de Marcelo.





                                                                                  Para desejar pronto restabelecimento ao professor.



Quase onipresente, Marcelo Rebelo de Souza é o presidente de todos os portugueses, e de alguns estrangeiros, como eu. Sua absoluta espontaneidade põem-no absolutamente à vontade em todas as situações, desde quando invade a casa de uma senhora e a ajuda a pendurar roupa, ou quando abraça os que perderam os seus em Pedrógão, até quando brinca com crianças, dança, ou toma banho de mar. É sempre o mesmo Marcelo, sem máscaras, já as teve outrora, sabemos, mas o tempo nos ensina a todos, e o professor aprendeu, e foi corrigindo esse seu defeito antigo. Agora temos Marcelo no seu melhor.

Bom de boca, prova tudo, come de tudo, come com toda gente e com toda gente come. Deixa todos a vontade, deixa todos bem, conforta, aconchega, aproxima, traz paz. Não pode ver uns bolinhos que não os ponha na boca, não pode ver um grupinho de gente que não vá os apertar as mãos. Beija toda gente, a todos beija, e tira selfies, e os aproxima, arruma a foto, coordena a bagunça. É Marcelo no seu melhor. (Mas nem todos pensam assim.)

Tudo entende, a todos entende, e se faz entender, dá e recebe a moeda mais importante para os seres humanos: o respeito, que também pode se chamar dignidade, que é seu reflexo, e vice-verse, numa relação absoluta de dar e receber, e o faz com proximidade, como a dizer estou contigo meu irmão. Com a alta dignidade de seu cargo somada a seu proceder, promove absoluta presença, que pelo só efeito desta, se manifesta o regozijo e o bem estar dos presentes. Estão com o presidente, autoridade máxima do país.

Experto em humanidade, doutor em empatia, mestre da proximidade, absoluto em suscitar afetos, único em sua espontaneidade, o professor presidente está presente com sua gente, está com eles em  corpo e alma literalmente, como nunca houve antes ninguém, como nunca se viu. Indomável, o adjetivou o primeiro ministro António Costa, incansável, inabalável, infatigável, mais que tudo presente, e essa presença reconforta, concilia, repõe a normalidade muitas vezes perdida, consola, evoca, valoriza, respeita e traduz tudo isso com seu olhar de verdade porque o professor é assim, e como é, se revela.

Como em tudo há os detratores, os analistas do risco de perder a autoridade, os indicadores de uma postura inadequada, os que lhe apontam uma postura não condizente com o alto cargo que ocupa, e associam-no com uma atividade que menoriza sua posição cimeira, e que quando precisar do respeito e da força para impor uma serenidade ou um divisor de águas aos conflitos tão intensos na política, não encontrará os meios, pois os terá gasto em sua superexposição, em sua constante presença, amesquinhando seu estatuto e sua respeitabilidade. Só mesmo quem não conhece o Professor pode pensar assim. Lembro de meu avô todo sujo a participar com seus empregados numas tarefas difíceis, mas sempre brincando e animando a toda gente no seu desempenho, muito igual, muito brincalhão, quando de repente surge um desaguisado entre dois ou mais dos que ali estavam. Bastou um olhar de meu avô, não pronunciou palavra, sabia o poder de sua autoridade, tudo cessou. Assim é Marcelo, que nós tratamos pelo nome, mas todos sabemos ser o Senhor Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, e, ademais agora, o Presidente da República.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Dickens alive.






                                                                           



Charles John Huffan Dickens que caminha já para século e meio de morto, está mais vivo do que nunca, e a cada Natal revive com mais força, ainda que durante o ano também viva e ponha-se a correr nas pernas de meninos valentes como Oliver Twist e David Copperfield, ou nos faça chorar com Nell Trent ou com a pequena Dorrit. Mr Dickens sempre viverá enquanto houver sentimento digno deste nome nesse mundo.

Vejo-o anunciado por todo o lado como se ainda saíssem semanal ou mensalmente suas histórias no Household words, ou no Master Humphrey's clock, e a acolhida pelos vistos é a mesma, pois que a força de seu nome é ainda grande atrativo para jornais que oferecem, junto às suas edições, as obras do Grande Dickens, e subitamente vemo-nos em meio àquela Londres untuosa do período vitoriano, a caminhar por seus orfanatos e prisões, e a correr por suas ruas estreitas com medo de entidades portentosas que nos perseguem. A força do verbo de Mr. Charles toca profundas verdades, e como mágica faz-nos estáticos e inebriados ante uma realidade ficcional poderosa que sai de suas páginas como neblina ou fumaça que nos envolve, nos enreda e nos prende com a força de suas palavras, e mais que isso nos transforma a alma.

Cento e oitenta anos faz que nos deu a conhecer esse traquinas Oliver Twist e ainda  mais a Mr. Pickwick que é do ano anterior, o contesto vitoriano não tem traço no nosso mundo, aquela gente, grotesca ou bela, esvaneceu-se numa realidade mudada por ainda outras três revoluções industriais, e novos hábitos, nova sensibilidade, mas é como se fosse ontem nas páginas, e muitas páginas, nas histórias, e muitas histórias, que deram peças, filmes, e ainda outros romances dos que seguiram o imortal Charles Dickens, na força de sua criação, na graça de seu dizer.

Vivo, mais que vivo, nos leva a voar com Scrooge a cada Natal, do passado, do presente ou do futuro, no sentimento de realidades que nos ultrapassam, mas que nos tocam tão fundo que nos compungem e nos martirizam, para nos tornar melhor e mais conscientes. Sim Mr. Dickens You're alive, much more alive than many others dead in their silence.

A razão desta crônica é mesmo a de ser retrato de nosso tempo, crônica portanto, uma vez que vejo Dickens por aí, pelas ruas, nos jornais e anúncios, diretamente, ou através de suas personagens, bem como ele gostava, menino do porto a rodopiar pelos mídias, imortal como é.


segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

A homilia do Galo e o Urbi et Orbi de 2017.



                     


                                                                           "O sedento, o forasteiro, o nu, o doente, o recluso..."
                                                                                                             Da homilia.
                                                                              " ... um modelo de progresso já ultrapassado."
                                                                                                              Da Urbi et Orbi.



Esse homem é perigoso, disseram alguns. Eu não percebi logo. Hoje vejo que tinham razão, não tendo. Sim esse homem é perigoso pelo seu caráter revolucionário, posto que deseja uma revolução intensa, profunda, absoluta! Diziam também àquele início de seu pontificado: "Herege! Esse Papa é capaz de destruir a Igreja, de mudar tudo, de alterar a ordem das coisas." Sim destruir aquela Igreja sem a presença plena do Cristo, em todas as suas vertentes, aquela Igreja conivente com tantos males, aquela Igreja que é necessário reformar, mudar em sua essência, alterar profundamente seu comportamento, trabalho imenso, que demanda forças enormes, que não são só de um homem.

Sim esse homem é extremamente perigoso para aqueles que não querem a revolução completa da palavra do Cristo, e assim mantém as exclusões, as de gênero, as de padrão de conduta, as de diferentes padrões econômicos, as daqueles que estão na condição de sem pátria, sem trabalho, sem lar, sem futuro. Todos os excluídos que Jesus evoca e convida para a sua ceia.

E é fácil de perceber porque esse homem é mesmo muito perigoso, e ademais incômodo, porque insiste não só nas palavras como também nos atos, na sua preferência pelos excluídos, pela justeza, pela verdade, e pela dignidade humana. Poderá haver comportamento mais perigoso? Mais em contra de interesses estabelecidos? Como se passou no Banco Vaticano, que fora transformado uma enorme lavanderia.

Sim esse Papa é o centro de um perigo que representa mais que o perigo pelo perigo de suas ações, mas um perigo porque suas ações legitimam uma igualdade que ofende os privilégios, que revoga a superioridade, que rebaixa as classes superiores, e eleva as inferiores, esse Papa é um homem muito perigoso, sim. E bem sabemos para quem!

Francisco é um revolucionário, partidário da revolução final, a revolução de todas as revoluções, a interna, a da alma, a mesma que Jesus (outro homem muito perigoso) pregava, mas que a ambição, os complexos, a ganância, a ligeireza, a indiferença, a superficialidade e o desamor dos homens vem evitando que se deflagre, essa mesma condição que deu sucessivos Papas não revolucionários, logo não representativos do Cristo.

Francisco é a revolução num lugar perigoso, Francisco é o perigo da revolução, Francisco é a voz que tem de ser ouvida, que se fará ouvir como revolução que é e representa incomodamente, fortemente, absolutamente, plena revolução na palavra e nos atos, que esperamos dê frutos.

sábado, 23 de dezembro de 2017

JOANA escondida do mundo.





                                                                               A Joana Vasconcelos a caminho de Bilbao.


A Walquiria portuguesa
Do mundo escondida
Põe agora sobre a mesa
Uma nova medida

No Guggenheim se revela
Após luta titânica
Das linhas de Gehry com as dela
Em que sai hegemônica

Onde tudo é impressionante
Como impressionar ?
Só com graça alucinante
Que se possa encontrar

Para esconder os mortos
Sua cor, sua linha, sua forma
Atracando outros portos
Toda realidade transforma

Aos mortos não se pode mudar . . .

Então põe na realidade o sonho
Que é sua única verdade
Que como um cunho
Revela a eternidade.

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

CARTA ENVIADA A REDAÇÃO DA VISÃO.







Prezados Senhores,

    Não vos ia escrever, tenho lá eu com isso, se ganham ou não ganham dinheiro!
Hesitei duas semanas! Se a vossa revista satisfaz ou não, se vocês se dão conta disso, se é válida a 
informação que fornecem. De fato não é da minha conta. 

                                     Refletindo melhor, dei-me conta que o que pretendo fazer: NUNCA MAIS 
COMPRAR A VISÃO, porque tem textos ruins, porque senti-me logrado, afeta, para além da minha 
pessoal consideração, que é tão somente excluí-los de minha vida por insatisfeito, afeta muita gente, 
primeiro que todos aos bons jornalistas que aí trabalham e que inocentes da muito má qualidade 
redacional do, seja lá quem seja, autor da matéria de capa de vosso número 1291, correm o sublimado 
risco de ficarem sem emprego, pois se muitos e muitos mais sentirem o desgosto que sinto de ter disposto 
de três euros e vinte cêntimos para investir em texto que me desse prazer, o que de forma alguma 
alcancei, acabarão por ficar sem leitores

    A matéria em questão creio há de ser uma, entre as muitas, que lá terão reservadas 
para semanas menos noticiosas, como há de ter sido esta primeira do mês em curso. O que leva ao leitor
consciente a esperar mais esmero, posto que pode ser elaborada com calma, essa mesma calma e esse
mesmo esmero que os eventos semanais hão de roubar ao escrevente muitas vezes pressionado pela
hora da edição concernente ao texto que desenvolve, e para o qual busca mais informação e cuidado, sem
poder dispor do tempo mister.

            E foram exatos esses dois substantivos esperados, de que careceu o texto a que me
refiro, sem manifestação de inquietação de espírito e diligência, essas duas vertentes da  informação e do
cuidado que podem fazer toda a diferença entre um bom e um mau texto. 

    Dir-me-á que informação sobre notícias, algumas quase milenárias, não há, penso
exatamente o contrário, que é o que mais há, posto haver o tempo de hiato para suscitar toda informação 
imaginável, desde as muitas críticas aos fatos, como as múltiplas análises históricas que se desenvolveram
em tão largo período que transcorreu, necessário é ir colhe-las, o que nos reporta à diligência, e de  posse 
das informações, motivado por boa inquietação de espírito, o que nos reporta ao cuidado para compor um 
texto atrativo, agradável, absorvente; como vêem é um jogo cruzado, já que as palavras são para quem as 
conhece.

            A primeira ideia que devera nortear a quem escreve um texto desses, é de que, ademais
se ele será matéria de capa, ele atrairá leitores com especial apreço pela história, como se fosse sobre flores, 
seriam os que apreciam botânica e jardinagem, se fosse sobre insetos, os da zoologia, e assim por diante, sendo
que todo o amante de seja lá o que for tem noções sobre a matéria e se quer ver envolvido pelo relato que lhe 
apresentem sobre aquilo que estima.

   Palha meus carossenhores, nada mais que palha encontrei no AS LOUCURAS DOS REIS 
DE PORUGAL, e por fim convenci-me que a única loucura foi eu ter comprado a VISÃO.

    Atentamente,
    Helder Paraná Do Coutto. 

sábado, 16 de dezembro de 2017

CARTA ENVIADA A ALA. ACADEMIA DO ESTORIL.





Helder Paraná Do Coutto



A ALA
Academia de Letras e Artes
Estoril 8/11/2017


Querendo concitar valores que nos são comuns, das Letras, das Artes, da História, e sobretudo da verdade, venho propor-Vos um encargo, senão uma missão: RECUPERAR A FIGURA HISTÓRICA DO MARQUÊS DE POMBAL, tido como cruel e sem misericórdia pelo modo como teria tratado aos Távora, no famoso processo, tratando sem complacência os que foram implicados.



Acredito haver provas cabais para mudar esta opinião vigente ainda mais de dois séculos e meio depois do ocorrido, posto que é conhecida referência fidedigna da interveniência pombalina para proteger os Távora, e que inclemente terá sido D. José, do que se arrependeu, como tenho prova documental de época, onde nas suas Recomendações, as que faz a filha, a futura soberana D. Maria I, onde deixa clara sua culpa e seu temor. Estando na posse desse documento fui buscar o que se sabia sobre Pombal, e tomei conhecimento de sua interveniência através de carta de Nuno de Távora, irmão do Marquês de Távora, também preso no cárcere da Junqueira, agradecendo tudo quanto Pombal tinha feito pelos Távora. Com esta carta poremos fim a toda difamação que sofre o marquês há séculos, resta encontra-la, e para tal temos boa pista, mas há todo um trabalho a ser feito, e é a este que conclamo essa Academia.

H.P.C.


25/1/2016
A Academia na pessoa de seu Presidente Dr. António de Sousa Lara, aceitou o 'desafio'.
Vai se marcar uma palestra na Academia, onde eu explanarei porque acredito haver provas e o que deve ser feito para encontra-las.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

40 anos sem Clarice.




                                                                                    "... eu também sou o escuro da noite."
                                                                                                                   Clarice Lispector.


Fez a nove próximo passado quatro décadas que nos deixou a mais brasileira das ucranianas, e como foi brasileira, bem como também foi algo que traduz um senso mais taciturno em plena alegria, contradição existencial que a define, só a poderia lembrar com um poema, que espero represente um pouco de sua magia.



A vida NÃO inventada, ou
"Viver ultrapassa qualquer entendimento."

                                                                              "Liberdade é pouco, o que eu desejo não tem nome."
                                                                                                                          Clarice Lispector.                                    



Como mulher tinha o útero do mundo
E com isso toda sua imensa tristeza e alegria
Intrínseca e necessária contradição
Portanto desdobramento é a palavra
Que tem tudo a ver com implantação
Como se para ver o conjunto das coisas fosse necessária
Esta prévia fixação
Que pervagando este mapa
Seguindo linhas já traçadas
A caminho de não sei onde
Em busca de não sei que
Segue
Porque aprendeu a seguir
E isto é o quanto basta para o efeito
De fazer sentido
Porém fazer sentido é pouco
A "Liberdade é pouco . . ."
É imprescindível recusar a vida
Pois é absolutamente necessário o desejo do que não tem nome.



domingo, 10 de dezembro de 2017

CORAÇÃO EMPRESTADO.








                                                                         Para Salvador Sobral
                                                                         em sua recuperação.




Meu coração emprestado
Terá de "Amar pelos dois"
Por si mesmo e por mim, coitado
E ainda por quem vier depois. . .

Meu coração tem o mundo
E nele todo o mar
Naufragou muito mais fundo
Em sua capacidade de amar

Uma vez perdido e achado
A bater de emoção
Que bata redobrado
Sinta em dobro meu coração

E de quem ame dobrado
Espera-se que o faça perfeito
Batendo descompassado
Só por estar no meu peito!


terça-feira, 5 de dezembro de 2017

VOLUNTARIEDADE.






Dentre as atitudes mais bonitas que conheço está a de alguém oferecer-se para ajudar, "dar de si sem pensar em si" como aprendi em Rotary. Sim, eu sou voluntário, e o sou desde que me lembro de mim, voluntarioso e cheio de vontade, sempre me entreguei à tudo que achei que valia a pena, desde a defesa do meio ambiente, até a Cruz Vermelha, passando por muitas e diversas ONGs e organizações das mais estruturadas, sempre para ajudar.

Como conheço o sentimento, esse da voluntariedade, na sua acepção de ser voluntário, de oferecer-se,  posso falar sobre ele nesse 5 de Dezembro, que é o dia dedicado ao voluntário internacionalmente, essa forma de sentir para além de si, de reconhecer no outro o irmão, aquele que próximo passa por um momento menos feliz, e deve ser auxiliado, ou a situação que a qualquer nível precise de intervenção, seja a natureza que esteja sendo agredida ou um cão abandonado, seja o planeta que corre perigo ou um profissional que busca emprego e carece de auxílio. É um sentimento mágico, creio mesmo que divino, porque dar sem nada receber, é transumano, é algo tão maior que podemos considerar divino. Só me vêm à cabeça os versos de Reinaldo Ferreira, musicados por Vasco Matos Sequeira e Artur Fonseca, para descrever a casa portuguesa, essa vertente tão pulsante em mim, no meu verbo, no meu sangue, no meu sentir, quando diz: " Fica bem essa franqueza, fica bem, que o povo nunca desmente. A alegria da pobreza está nessa grande  riqueza de dar e ficar contente."

Dar e ficar contente, algo de si para consigo, um ato íntimo, um ato de amor, e poderá haver maior riqueza?

A magia do sentimento vive na sua intimidade, na sua ação volitiva  que o define, pois para sentir é necessário querer, na mesma medida que para querer é necessário sentir, nessa fusão absoluta e incompreensível que define o transcendente, tudo aquilo que vai para além de nós, metafísico, transumano, como disse, transcendental, sublime, portanto divino.

Como tudo o que o homem busca é ser deus, ser como Deus, ser mais que a sua matéria que a cada momento, todos os seus sentidos mais seus sentimentos dizem-lhe que é pouco, que é insuficiente, e querendo exceder os limites do ordinário, voluntária-se, dá-se, ama, excede-se,  alça-se, e brinca um pouquinho de Deus.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Centeno: In some sense...






Mas o Senhor é Bruxelas!

Numa negociação futura  entre os membros da 'geringonça'  O Dr. Mario Centeno alegará:

    - Teremos que consultar Bruxelas.
     (Face a uma impossibilidade de pronta resposta.)
    - Mas o Senhor é Bruxelas . .
      (Responderão os negociadores do PCP, e/ou do BE.)
    - E estarão corretos, ou não?
      (Indagarão outros afectos às negociações.)



Muito aprecio a eleição do Dr. Mário Centeno para a presidência do Eurogrupo, é um forte sinal da maturidade governativa portuguesa, sobretudo no que toca a área mais sensível de todas, as finanças, por um lado e a capacidade excepcional de ser e estar o escolhido, por outro.

Dr. Centeno, sem arrogância, sem presunção, sem afectações, sem ter engolido espadas, como tantos outros com aquelas suas posturas afetadas, vem reiteradas vezes testemunhando uma posição ponderada, uma forma inclusiva e conciliatória, com todos, inclusive os jornalistas, um conteúdo maduro que vê só o que importa, enquanto muitos outros ficam-se pela espuma dos dias, dessa forma tem feito bem a seu país, diminuindo a dívida e seu custo, impulsionando a economia, o que gera centena de milhares de empregos, tem um aspecto humano, inclusive físico, tem cara de anjo, eu já disse isso no face, e é verdade, mas tem a cara lavada de quem diz verdade, de quem tem matéria com que laborar, de quem sabe o que está fazendo em assunto tão delicado como as finanças, mergulhadas nesse mar de incertezas e improbabilidades.

Gosto do homem, gosto do que escreveu antes de ter poder, gosto da fidelidade de Centeno ministro ao Centeno economista, gosto das soluções adotadas por ele, e mais ainda gosto que seja Portugal desse Sul de "bêbedos e namoradores" no dizer do anterior presidente do Eurogrupo, esqueçam-lhe o nome, porque difícil, e porque indesejável, aquele que não se desdisse, pois dissera o que quisera dizer, provavelmente acreditando ser mesmo assim essa gente do Sul: Certamente os gregos que deram ao ocidente toda, grifemos toda, a sua cultura e filosofia, os ibéricos que tiveram o planeta nas mãos, o tendo descoberto quase todo, esses que a história prova serem os mais criativos, exultantes e deslumbrantes povos da História da Humanidade, que a recriou tantas vezes, e que legaram às mãos cheias tudo que há de valor e todo valor que há ( Só isso!). O que para o de nome difícil será certamente a Holanda, ou os países baixos, que andaram a perseguir as conquistas ibéricas em toda parte, pensando que Portugal não poderia se aguentar com tão fabuloso império (Se enganaram: Aguentou!).

Agora esperamos do Dr. Centeno, na mais forte tradição lusitana, que dê provas de engenho e arte e possa mostrar o valor dessa "gente do Sul".

Entretanto quanto a ser Bruxelas, o será como diz o título desse artigo, em algum sentido, mas tanto mais o será quanto mais for Portugal, quanto mais for esse Sul que deve e tem de contar na Europa, essa que se pretende uma União.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Lendo as cartas de Mandela.




Com uma letra muito regular, indicadora de sua fluência cultural, com raros erros ou enganos, com uma lógica vernácula onde transpira conhecimentos muito para além dos de seu país, expressa-se em inglês, idioma de múltiplas faces, que exige um certo rigor na linha de expressão para ser rico, e a linha que Mandela percorre revela sua riqueza vernácula, mesmo em textos íntimos como são estes a que tive acesso, escritos à sua amada, e na pior e mais cruel situação que um homem se pode encontrar, preso injustamente, sem sentença definida, ou seja por tempo indeterminado. Nada lhe rouba a paz de espírito, nada lhe subtrai a serenidade altiva e consciente, as cartas revelam a face de um homem muito para além de sua condição.



São cartas a Winnie, a enfermeira com quem era casado, e a quem depois o sucesso sobe a cabeça, julgando-se mais importante que Nelson Mandela, perdendo a visão ajustada de sua importância relativa, e da grandiosidade humilde do homem com quem vivera. A serenidade revelada por Nelson Mandela como se visse o que o futuro lhe reservava, como se soubesse que viria a ser um grande nome da história mundial, sem hesitações, sem dúvidas, sem ódios e sem rancores, desde sempre, como que numa preparação consciente e volitiva do porvir que lhe aguardava, para acabar com os ódios e as misérias de seu país, a África do Sul dominada por rancores que a dividiam e geravam radicalização irracional, a pior delas, a racial, onde se odeia só pela cor da pele, maior estupidez impossível. Em nenhum momento Mandela deixa-se influenciar, nunca se deixa envolver por essa avalanche de ódio que dominava seu país, a mesma que o havia posto na prisão de onde escreve essas cartas, e onde jamais perde a tolerância e a sua capacidade de perdão, a interlocutora certamente não o compreendia, e procurava incita-lo ao ódio, mas com a serenidade verdadeira da convicção, nunca se afasta do perdão, sentimento maior que cria, que gera, que revoluciona, como o do padre de Victor Hugo nos Miseráveis que com seu perdão transforma definitivamente Jean Valjan, o perdão de Mandela vai transformar um país inteiro.

As cartas são uma revelação, uma água clara onde transparece a personalidade de um homem que conforma seu caminho sem hesitações, sem dúvidas, e, o mais importante, sem rancores, que confronta seu destino, não se perdendo no acessório. Como Príncipe que era (Não se esqueçam que Mandela nasceu príncipe da Suazilândia.) e como jurista (advogado) entendia perfeitamente que a autoridade só poderia vir de um valor moral, ético, sem mácula, e todo confronto, todo ódio é mácula indelével, portanto vai construindo na prisão esta superioridade moral que o distinguirá de todos, mas com afabilidade, com proximidade, com calor humano, para nunca perder o rumo da fraternidade, único valor humano que importa na relação com outro ser humano, posto que com esse valor em abundância se conformará o tripé que soergue uma sociedade justa e de princípios, como o pensamento revolucionário francês já o evidenciara, e que Mandela na sua busca concretiza absolutamente para legar os outros dois, essência que sustenta o que é hoje a África do Sul que criou.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

The War Man.








"The Rocket Man" é como chama a Kim Jong Un, Donald Trump, porém o 'epitetista' valha o neologismo, merece também um epíteto, e aí está o que lhe assenta bem, The War Man, por ser seu tema constante, porque suas declarações voltadas para esse tema estarem sempre aparecendo, o que vai revelando o que ele, Donald Trump, tem na cabeça, entretanto essas revelações sucessivas evidenciam uma preocupação quase obsessiva com o tema da guerra, e, creio mesmo, que foi com essa intenção que Trump foi eleito. Como sabemos todos os presidentes têm agendas escondidas, interesses a que servem ocultamente, e muitos se podem notar pelo financiamento das campanhas, bem como pela temáticas dessas voltadas para esses pontos que, ocultos, não podem deixar de constar das campanhas para se legitimarem e, de futuro, quando aparecerem na governação não poderem ser bloqueados como exógenos, posto que faziam parte dos programas de governo. É bem verdade que ninguém tem como programa de governo a guerra, nem o poderia num mundo que se pretende civilizado, porém a forma como irá responder como presidente a situações beligerantes, ou a conflitos instalados deve ficar clara para o eleitorado, justificando destarte as futuras decisões que o governante venha a tomar nesse âmbito. Assim Trump, The War Man, nunca escondeu sua predileção por respostas truculentas a países que oponham-se à sua política, e soluções agressivas em caso de conflitos que se proporcionem. Ademais toda a indústria bélica o financiou, portanto não podíamos esperar nada de diferente do The War Man.

Entretanto com o surgimento do The Rocket Man, e dos rockets propriamente ditos, temos uma situação muito favorável à beligerância que se instalou na Casa Branca, por um lado até com alguma compreensão por parte de toda a gente, porque esse estúpido do Jong Un dá todas e mais algumas razões para a beligerância com sua atitude provocadora, que terá evidentemente suas justificativas, mas que no final, face da desproporção dos meios e da ameaça que representa, é apenas provocação fútil, que permite por seu turno, que. se algo de agressivo ocorrer, mesmo por acidente, haja uma retaliação brutal, e venhamos a ter a primeira guerra termo-nuclear da história da humanidade, nada mais propício que dois psicopatas com poder com as mãos sobre os botões dos rockets.

A ICAN International Campaign to Abolish Nuclear Weapons, agora Premio Nobel, ressalta pontos deste confronto, evidenciando a perda de controle de ambas as partes. O Congresso americano agora está avaliando a capacidade de Trump em comandar um ataque nuclear. É bem provável que não seja obedecido. O 'establishment' já percebeu nitidamente as intenções subalternas do Sr.Trump e se movimenta para dete-lo. Um confronto dessa ordem entre o homem na sala oval e a estrutura mais profunda da administração americana cria ruptura muito aguda na linha de comando e na imagem de respeitabilidade dos EEUU, que é muito difícil de recompor. Os pretextos estão estabelecidos, os interesses movimentam-se, essa ida a Região Ásia-pacífico, é mais uma evidência da agenda escondida, a pretensa mão estendida para o "little rocket man", mais um subterfúgio para atender as imposições do establishment, podendo justificar muita coisa que venha a suceder.

Eu temo pelas reais intenções do Sr.Trump, já sabemos de muita coisa que mostra que ele atua sempre com duas caras, que é perigoso, que tem envolvimentos obscuros, estejamos atentos!

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Um "maluco beleza"...




A expressão se disseminou a partir da música homônima de Raul Seixas, ele mesmo um maluco beleza, expressão que serve para designar um extravagante, alguém que foge aos cânones sociais, e projeta sua personalidade diferentemente, e que, certamente, provoca estranheza e incompreensão.

"A usura é um cancer no azul..."

Esta forte imagem que me marcou, eu que venho de uma família com muitos usurários, gente que só soube amealhar pelo efeito de amealhar, nada mais, sem  maior perspectiva social, humana ou pessoal, que a de deter dinheiro. Aonde isso leva? Esse ponto leva a uma grande discussão. Entretanto a imagem de que esse procedimento é desruptivo, e que destrói a beleza, destrói o entorno, a proposta de uma vida incluída numa razão importante e num objetivo maior de existência, posto que existir é se perder no universo da existência, traz-nos a figura de seu autor, o grande poeta Ezra Pound, que esteve internado  doze anos no St. Elizabeths Hospital para alienados, ele que tinha uma visão tão lúcida, o que prova que às vezes é preciso mesmo se ser louco para ter uma visão lúcida nesse mundo distorcido.


"Enquanto você se esforça para ser um sujeito normal..."


Penso que todos nos esforçamos, mas o busílis é que a norma é a medida da mediocridade, média que é de gente excepcional junto com um sem número de estúpidos e gente banal, insignificante a nível de entendimento, baixíssimos QI, dando um valor muito baixo para a média, o que leva a muita gente ser excluída e incompreendida na sua forma de ser e manifestar seu entendimento do mundo. Ezra Pound certamente foi um desses, ainda que pudesse ter qualquer tipo de comportamento desviante por causa de sua aguçada perceção.

O adorável livro de Daniel Swift sobre a vida de Ezra Pound recentemente editado com o sugestivo título de Maluco (ou mentalmente perturbado) Bughouse no original em inglês, conta a história da vida do grande poeta, considerado insano aos sessenta anos, tendo passado mais de doze anos da vida internado, e nos conta a história de uma maneira sugestiva e com uma visão não preconceituosa.


"Eu vou ficar com certeza . . ."


Não apontando o dedo ao poeta por sua condição, nem esquecendo o amigo por sua situação excepcional, iam visita-lo ao St. Elizabeths nomes como Elizabeth Bishop, John Berryman, T. S. Eliot, Charles Olson, William Carlos Williams, Robert Lowell, que, como nos conta Daniel Swift, sentavam-se com ele (Ezra) no chão do hospital para longas conversas, em suas frequentes visitas. A doença mental que inspira uma repulsa ainda maior que a maioria das doenças fisiológicas, e lançam o doente no ostracismo, não levou Ezra Pound a esta condição miserável de abandono, pelo apreço que lhe tinham seus amigos, que continuaram o visitando, acreditando no que afinal de contas era aquela situação, uma maneira de evitar sua condenação por envolvimento com o fascismo, retirando-o da terrível condição de pária em que fora lançado. Desde o pós-guerra até 58 ficará 'internado'. Ainda viverá até aos 87 anos em Itália para onde seguiu depois que foi libertado do hospital de Washington.

Porém o que fica dessa história é a beleza da presença dos amigos, sua 'recuperação' social, e o valor enorme de sua poesia que sempre a continuou fazendo como uma profunda análise social e humana, a que seus versos evocam. Tendo influenciado além dos que o visitaram, já mencionados, nomes como Yeats e Joyce. Com a sonoridade da língua que tanto sublinhava estendeu sua influência a muita gente, mesmo até a esse que aqui vos escreve, que acredita piamente na musicalidade da poesia juntamente com um forte poder da imagem que concite. E aí somos todos malucos belezas. . .


domingo, 5 de novembro de 2017

Terrível retrato do Brasil.





Recebo o New Yorker onde esta estampada uma foto do Deputado Bolsonaro, esse equívoco político-eleitoral, e a informação terrível de que a cada dez minutos uma pessoa é assassinada no Brasil e ainda mais uma além dessas para perfazer o total de sete por hora que são 168 (175) por dia e os 60.000 anuais de que nos fala a manchete do New Yorker, esse descalabro que por si só é um susto, um absurdo, números de guerra, e uma incompatibilidade com a ordem, a democracia e a justiça, pilares de um país que se queira decente, uma falência do Estado de Direito, como nas guerras. E o Brasil está em guerra  com o que?

Recebo também, alguns dias depois, a informação de que o Movimento dos Sem Terra estaria a apoiar Bolsonaro em uma eventual candidatura a presidente. E aqui devo em breves linhas dizer quem é Bolsonaro, para os meus leitores de outros países, que não o Brasil, que desconhecem a figura. É um deputado federal que repetidamente se elegeu sob o lema : "Bandido bom é bandido morto." acirrando para uma extrema a necessidade absoluta de combate ao banditismo, que tem se institucionalizado no Brasil, no sentido de evidenciar sua intolerância com a situação, intolerância que é de todos nós, mas a diferença é que não advogamos nem a morte, nem uma ação excessiva da polícia, ou a atribuição de poderes excepcionais, a quem quer que seja, para o combate ao crime. Fato é que os números que divulga o New Yorker, são uma anormalidade que põem em causa a primeira função do Estado, e também a segunda, a saber, proteger os seus habitantes, e administrar Justiça, o que evidencia a falência do Estado brasileiro em suas funções mais básicas, e estabelece uma situação de farwest, para sermos ligeiros na denominação do estado calamitoso a que chegou o Brasil. O deputado Bolsonaro numa sucessão insistente de sua propaganda eleitoral, e na divulgação de suas ideias, radicaliza as soluções, ganhando visibilidade à conta disto; que essa emergência do deputado se verificasse como uma radicalização perseguida pela parte doente do Brasil, que, não entendendo o que verdadeiramente é solução para esse atrito social que degenera em mortes e assassinatos, os mais cruéis, escolhe um desvio degenerado como solução, como tantos defendem a ditadura e outras a repressão brutal, em vez da solução que bem sabemos ser uma política de ascensão social, para que todos possam pertencer a uma classe social mais elevada (e essa ascensão dá-se com educação de qualidade, emprego em quantidade, salários com remuneratórios justos, presença do estado na saúde, na formação de carreiras, nos transportes, etc...) permitindo destarte que se formem indivíduos com cidadania plena, e não parias sociais, excluídos marginais como se formaram aos milhões no Brasil. O Lula mostrou bem com sua governação como se reverte o processo de exclusão, e como se formam cidadãos. Não podendo lutar contra todos os interesses instalados, Lula, decerto, não resolveu o problema dos sem terra, esses que agora dizendo-se cansados entregam-se a Bolsonaro. Esquecem-se que o que mexe a política é o fundo ideológico que a conforma, e que há, mesmo para além de posições de interesse eleitoral, nesse fundo, toda a motivação que divide as pessoas, por isso chamamos a sua organização em grupos, de partidos. E o fato é que a extrema direita, a qual o sr. Bolsonaro pertence, poderá assumir papéis da esquerda, como a suposta defesa da Reforma Agrária, ambição já centenária num Brasil com problemas que se acumulam, e que levaram a radicalização e à formação do MST, que agora, declarando-se cansado de aguardar uma solução, abraça todas as reversões da política, apoiando ao deputado Bolsonaro. É uma solução de absurdo, filha do desespero, posto que desespera quem espera, posto que este assumirá, estes assumirão esta faceta, este aspecto de pretensa salvação, só para pôr as mão no poder, revertendo papéis claros, criando ambiente onde é tudo ilusório, meramente político, falso, um jogo de sombras.

    A conclusão desses números é só uma, esse Brasil do desgoverno, da falência do estado de Direito, que vivemos hoje, é indecente, ou seja indecoroso, obsceno, desonesto. E devemos nos fixar nesse último sinônimo, desonesto, e nos questionarmos COM QUEM É DESONESTO? E a resposta é uma generalização, como se todos estivessem a enganar todos. Uma reversão da ordem das coisas que permite que alguns acreditem que irão encontrara a solução na radicalização, que a terra se consegue invadindo a terra alheia, que a 'vida' se consegue com a morte do próximo.  Essa inversão dos valores é que levou o Brasil a essa situação de calamidade pública em que se encontra. E, infelizmente bem o sabemos pelos exemplos históricos, que em situação de calamidade pública tudo pode acontecer, que com as radicalizações formam-se, às vezes até se institucionalizam, reversões da ordem como solução mágica a querer criar ordem, esta que todos desejam, em sendo justa e, acrescento eu, em sendo democrática, pois bem sabemos aonde nos levam os regimes de força. Lembremos que a Revolução Francesa degenerou na guilhotina e formou um Império para depois voltar ao que era antes, aos mesmos Luíses. Que a Revolução Bolchevique (Russa) degenerou no stalinismo de 60 milhões de mortos, para termos um czar outra vez em Moscou chamado Putin, voltando ao capitalismo mais selvagem, isso para só citarmos dois exemplos.

E essa desonestidade, que se propalou pelo Brasil fora, é inquietante porque quer enganar-se a si mesma, como o MST a escolher Bolsonaro, e mais grave nisso tudo é a reorganização paralela ao Estado que essa mesma desonestidade permitiu com a formação de grupos de extermínio e toda uma cultura de terror, sim de terror, que é a existência de uma milícia, uma grande quantidade de forças para-estatais que atuam livremente, e efetivamente impondo ordem alheia ao interesse geral da cidadania. E se tem como reflexo, sendo também reflexo por si mesma, temos aí dois espelhos um na frente do outro, com uma situação dos seus representantes políticos, como os degenerados que são, como a representar uma degenerescência, como a configuração final, fatal, da subversão de valores traduzida no seu ápice, reflexos de reflexos. É como se tudo e todos os assassinos, os ladrões, os contraventores estivessem justificados, posto que fazem o que faz a alta esfera do poder e seus representantes eleitos. ROUBAM! MATAM! TRAFICAM! (traficam influência e não só!)

Generalizou-se essa situação no Brasil, de tal ordem que o povo passou a desejar a transformação de um poder mais efetivo, o judiciário, no poder de regulação e atuação, tomando o lugar do executivo, do governo, e quase também do legislativo, entregue a uma maioria corrupta e negocista, que para além de todas as medidas só vê seus interesses como se não houvesse amanhã, distorcendo assim todo o edifício longamente construído das instituições. É plenamente compreensível o desespero em que se encontra um cidadão, sem nada poder fazer, vendo tudo corrompido, vendo tudo infectado, vendo a falta de vergonha dos que o representa, vendo o roubo e a corrupção imperarem sem máscaras, ou cujas máscaras são reveladas e expostas pelo terceiro poder que na medida do possível e até do impossível, o judiciário vem tentando por cobro aos descalabros de toda ordem que se verificaram no Brasil, muitas vezes com excesso. O Brasil está em guerra consigo mesmo, obviamente não poderá ganhar. Se ganha, perde.

Sei o quão difícil é clamar por ordem em meio ao caos, sei perfeitamente que as velhas soluções de compromisso (o método democrático eleitoral é uma solução de compromisso) parecem gastas, sei que desejar eleições parece dizer: 'É tirar um ladrão para botar outro.' Sei que tudo parece muito confuso e sem caminho, mas sei também que os caminhos de exceção não são caminho algum. E uma existência abjeta, por tudo que representa, como o sr. Bolsonaro é o último que se possa desejar, sendo uma hipótese não aceitável, porque não se pode desejar o absurdo, ainda que ele, muitas vezes, nos pareça apetecível.


segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Meio milênio de 95 teses que mudaram o mundo.












Sim foi há 500 anos, cinco séculos atras quando um monge das hostes de Santo Agostinho, chamado Martinho, que discordava das posições negligentes, relapsas e/ou distorcidas da Igreja a qual pertencia, a Católica Apostólica Romana, que recusando-se a debater, impunha um silêncio e uma obediência que Martinho não soube acatar, e pregou na porta de sua igreja noventa e cinco teses que tocavam em pontos cruciais do cânone estabelecido, não para  efutá-las, mas para discuti-las.

Tinha 34 anos, e com esse ato estabelecia um protesto contra a intransigência da Igreja em matérias que deveriam ser discutidas, posto que a exegese delas dentro do próprio seio da Igreja divergiam,  e era apenas isso que desejava, discutir. A realidade, como soe acontecer muitas vezes, ultrapassou-o, tornando-o líder de um cisma que deu origem a uma nova religião, a daqueles que protestavam, protestantes como ficaram conhecidos, por quererem ter Direito a discussão, o que a Santa Madre Igreja Católica Apostólica Romana negava.

Entre as teses que defendia estava não aceitar que o perdão de Deus pudesse ser comprado e vendido, e na época havia um grande vendedor de indulgências, Johann Tetzel, que em grande comércio negociava o perdão divino. Revoltado com isso, Martinho se opôs vivamente, recusando-se a atender aos pedidos do Papa Leão X e do Imperador Carlos V para retratar-se, mantendo suas teses, sobretudo a de que Deus oferece gratuitamente através de Jesus cristo Seu perdão, e por isso foi excomungado, mas  manteve-se fiel a seu entendimento. Outra coisa que não entendia era a divisão da Igreja entre clérigos e leigos, entendendo todos os batizados como sacerdotes. Aliás é a palavra que deixa o Cristo sobre o assunto. A questão da justificação pela fé, que é mesmo o caso do perdão divino, só em 1999 foi acordado entre as Igrejas, a católica e as que Martinho gerou, reconhecendo que a tese de Martinho estava certa, seu entendimento de que a fé e sua justificação não era posse da igreja, e que todos e cada um tinham direto acesso a ela, justificando-se perante Deus pela sua fé.  Quem ler as teses de Martinho Lutero à luz do texto bíblico, logo se dará conta de que lado estava a razão.

Hoje passado este meio milênio sobre os fatos, temos a Igreja Católica ainda muito resistente em suas posições contra as teses que dividiram a fé cristã, e que criou a enorme religião Protestante em suas múltiplas denominações, e estabeleceu um confronto que passou por guerras, perseguições, intrigas, e outras desgraças, num efeito de laceração do que haveria de ser mais relevante na Igreja de Cristo, sua união.




terça-feira, 24 de outubro de 2017

A Nova Lei.







Dois Juízes Desembargadores do tribunal da Relação do Porto, com uma sentença que evoca o Código Penal Português do século XIX, já ultrapassado e a Bíblia, em sua parte também já ultrapassada, para acusar a condição de adultera a uma mulher em um processo com os mais fortes adjetivos que encontraram, numa apreciação verdadeiramente medieval, onde evoca até a lapidação, e que é notícia por ter levantado a indignação pública contra a forma da decisão, e, portanto, suscita os reparos seguintes: quanto aos encômios valho-me para responder a isto com recomendar a leitura de meu artigo de maio de 2013 intitulado Mulher, sempre a vítima preferencial.

Entretanto quanto as citações bíblicas consolido aqui uma apreciação mais alargada do fato desses anormais se valerem de textos arcaicos, e não mais em vigor, para justificarem àquilo a que se chama Justiça, posto que um Juiz ao decidir, devendo restringir-se à letra da Lei em vigor, mais aos fatos, e à sua convicção que deles resultam, deve tão somente decidir à luz dessa realidade sem resvalar para sentimentos pessoais, crenças, ou mesmo posições de natureza ideológica. Um Juiz não é ele quando julga, é os fatos à luz da Lei. Tudo o mais fica de fora, poderá ele não concordar com o que a Lei aprecia dos fatos, mas não pode evocar essa discordância para se afastar da disposição legal. Fazer isso é criar precedente pernicioso que afasta seu julgamento da meridiana Justiça.

Entretanto o curioso no 'decisum' desse anormal que legitima a violência doméstica, contra a qual a sociedade tem se batido, repudiando-a, com mudança de comportamento e evidente reflexo na Justiça, e em suas condenações propagadas, criando uma nova e bem vinda cultura de entendimento das relações humanas, com jurisprudência, e, assim, resgatando a mulher de sua condição de ser oprimido pela força física de seu mais frequente agressor, o próprio companheiro, entretanto, repito, é que a evocação bíblica mostra total desconhecimento do texto bíblico em sua totalidade e realidade completa. Vejamos!

Evangelho quer dizer literalmente boa notícia, boa nova, ou seja  traz em si a ideia de que vem trazer até nós, após os milênios de uma Lei de beligerância, uma Nova Lei, a Lei reformulada pelo amor de Jesus Cristo, que reafirma e contradiz valores que considerava maus para as pessoas. Quando falamos Bíblia no Ocidente, incluímos esta importante parte dela a que chamamos evangelhos, e que nos dão a Nova Lei, resgatando milênios de opressão e violência legal, segundo a qual imperava a consciência legislativa de Talião - Dente por dente, olho por olho - Mesmo para o Torá, que guarda a Velha Lei,  não estará bem a letra morta dessa Velha Lei, posto que o trabalho vivificador rabínico, feito ao longo de centenas de gerações, deu nova forma a Velha Lei.

Porém entre os cristãos é absolutamente claro que Jesus reformulou a Lei, com suas palavras e com seu exemplo, com sua forma vívida de interpretar as relações humanas, como máxime Juiz que é, e com a presença do amor na prevalência da Justiça como forma de regular essas relações.

Logo resta relembrar a esse anormal que tendo Jesus encontrado uma mulher dita adúltera pronta a ser lapidada, apedrejada por um grupo de cidadãos que aplicavam a Lei antiga, reformulou-a com o seguinte gesto: Pôs-se à frete da mulher e desafiou aos do grupo que se preparavam para lapida-la, já com as pedras na mão, que atirasse a primeira pedra aquele que nunca tivesse pecado. E por fim dá sua sentença quando diz à mulher que vá e que não peque mais. Esta a Nova Lei para quem crê na Bíblia ou para quem a evoca, e não os ditos da Velha Lei que diz que a adúltera será punida por apedrejamento. Só por sofisma, ou ignorância, se pode hoje evocar o texto bíblico para justificar a condenação da mulher em benefício do homem que a agrida.

Os Senhores Desembargadores hão de decidir qual das duas razões lhes serão atribuídas.


5/12/2017 - O conselho superior da magistratura condenou aos dois juízes. Não podia ser de outra forma.

domingo, 22 de outubro de 2017

"Oh Gente da minha terra...."





Há certos cantores que só existem para glorificar àqueles que imitam. Outro dia ouvi alguém, já não me lembro quem, a cantar "Gente da minha terra" este poema que nos deixou Amália, e é uma revelação de um momento de iluminação de D. Amália, e que Tiago Machado musicou, e ao qual a cantora Marisa dos Reis Nunes Ferreira deu uma dimensão fabulosa, com a responsabilidade que tinha de cantar um poema de Amália, a moçambicana que queria ser fadista, num disco que se chamava Fado em mim e que era sua estréia, onde canta para além desse fados que foram imortalizados na voz de Amália, e para os quais Mariza soube procurar e encontrar o seu próprio caminho a interpreta-los, e subitamente me apercebi que devia um texto a Marisa, pela sua grandeza, pela sua individualidade e por sua simplicidade.

Isto me ficou na cabeça: O que dizer? Como dizer? Até que vi uma homenagem que a RTP fez há muito tempo a Edith Piaf, onde a 'interpretava' uma cantora, boa cantora, mas para ser Piaf, só Piaf.
Mesmo se eu tivesse a voz de um Pavarotti e me pedissem para interpretar Caruso, eu declinaria com a afirmação de que ninguém pode interpretar Caruso, mas há muita gente que não se dá conta e com isto, apesar de muito bons cantores, cumprem a única função de glorificarem aos que imitam.

Os houve muitos, e um dos últimos foi uma moça, que canta bem, mas que quis por força ser Amália, e deu em gritadeira, até que desistiu e desapareceu, é pena, pois podia fazer boa carreira se não tivesse querido ser Amália. Quem tem ouvidos de ouvir sabe que só há uma Amália, uma Edith Piaf, um Caruso. Seres com luz própria que encontraram um caminho de esplendor e nos proporcionaram momentos de maravilha com a cristalização de certos momentos em seu repertório. Quem cantará "Povo que lavas no rio" ou "Foi Deus", ou "Coração independente", ou mesmo a "Casa da Mariquinhas", com o poder de interpretação, a força, ou a densidade de D. Amália? Quem cantará  "Non, je ne retrete rien" ou La Vie en rose", ou "Padam, Padam" ou o "Himne à l'amour" com os vibratos de D. Edith? Quem terá a maviosidade de D. Enrico no "E lucevan le stelle"ou no "Core Ngrato" ou mesmo "O sole mio"? Quem?

É, ao ouvir esses intérpretes que os imitavam ficava claro tudo que não estava lá, a 'décalage', o 'gap', o vazio e a distância para chegar a qualquer um desses cantantes. E com Marisa dava-se o mesmo! Mariza conquistou um lugar no cenário da interpretação vocal da música, como intérprete e como fadista, sendo que nessa segunda condição não seria nada fácil com o vácuo deixado por Amália, e com as tentativas anteriores de muitos em preenchê-lo, e também por ter o 'phyique de rôle' inadequado, por ser moçambicana, e mesmo por ser mulata. Porém é só ouvir Marisa e lá está tudo, toda a magia mister de um grande intérprete, e tudo é ultrapassado. Oh gente da minha terra, só a maravilha da voz e o sentimento importam, e logo todas as almas serão tocadas, e far-se-á a magia da interpretação, única, absoluta, verdadeira, manifesta.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

O fogo.





O fogo é ágil
Corre, pula, salta, voa
E tudo é frágil
Os bosques e casas que despovoa

Febril atravessa montanhas
Impassível na destruição
Como fogo não sagrado
Deixando desgraças tamanhas
Matas, lavouras, gente, gado
Tudo em consumação

Aliado ao vento
Faz-se mais cruel e ligeiro
Rouba tempo e alento
Imparável mata certeiro

Retorce tudo
Tudo destrói
Não poupa velho, mulher ou criança
Rouba o futuro
Sufoca a esperança

Rastro de horror
Na miséria de sua passagem
Fica-nos o estupor
Como se fora tudo miragem.

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

O dono disso tudo, o marquês José Sócrates e Jorge Rosário de crimes Teixeira.




                                                                                                            Da série: Os donos disso tudo.

Nunca escrevi sobre este assunto até hoje por nunca me envolver em especulações, nem nunca me envolver em crimes. Uma posição de repúdio ao comportamento do Saloio de M... ficou no artigo com esse nome. O fiasco anunciado não veio, que seria assim como um diabo para a justiça, mas ainda mais grave porque seria um diabo cotó, um aleijão que levaria a justiça portuguesa a perder toda a credibilidade. Logo só nos resta louvar a ação efetiva e difícil de recolher dados por meio mundo, interrogar duas centenas de pessoas, estudar milhares de documentos, cruzar milhões de informações, para conseguir formatar um libelo acusatório consistente, e, que apesar da presunção de inocência, e não importando os futuros contornos do processo, do que se provará ou não, configura meu entendimento do que verdadeiramente se passou, Ricardo Salgado na expectativa de salvar o Império Espírito Santo, que devido a crise mundial, e aos investimentos gulosos que foram feitos caiu no grande logro das duas crises montadas para arrecadarem alguns bilhões aos incautos como ele, a do sub-prime e a das dívidas soberanas, num arrasto de entidades financeiras e investidores na expectativa de lucros chorudos, onde o Banco Espírito Santo se atolou, e o Dr. Ricardo Salgado fez tudo a seu alcance para tentar salvar da falência seu grupo financeiro-industrial, BES/GES, tendo tentado de tudo, feito todas as jogadas, tendo conseguido falir a PT, arrasar com a Oi e a Vivo, arrebentar sua seguradora, criar enormes rombos na Caixa Geral de Depósitos, destruir a credibilidade de todos os papéis do Grupo, etcétera, mentindo, enganando, envolvendo, corrompendo, negociando, subornando todos que pode para tentar salvar seu Império, essa a tese do Ministério Público a qual corroboro.

Admirável a obstinação da equipe de investigação, mais admirável ainda todos os indícios recolhidos, e as suas conclusões e conexões apresentadas, salvando a face de uma justiça que ficara mal anteriormente contra o mesmo José Sócrates, e que nunca ousara investigar Salgado. Numa década onde os donos disso tudo puderam pôr e dispor a seu bel prazer de recursos e poderes que lhe eram confiados, e que com a sem cerimônia dos atrevidos deles dispuseram para proveito próprio.

No Brasil dir-se-ia: NÃO TERMINOU EM PIZZA!

A grande mácula que fica empanando o Dr. Jorge Teixeira, o obstinado MP à frente das investigações, é a fuga seletiva de informações, do processo em segredo de justiça, para a imprensa. Compreendo que o transbordo de determinadas peças processuais para o conhecimento geral, criava uma facilitação na linha investigativa, permitindo desinformação, e tensão, talvez até necessárias, e indubitavelmente auxiliares, para alcançar o objetivo pretendido, como também fazia conhecer com antecipação a reação da defesa. Pode ter sido o Ticão o autor da façanha, mas isso não iliba o dr. Teixeira até que ele instaure processo crime contra quem ele apurar ter sido quem permitiu as fugas de informação. Porém elas existirem é uma atitude imperdoável por alterar as regras do jogo, incapacitar a justiça, faltar ao compromisso de retidão e decência expectável da Procuradoria, e acima de tudo por SER CRIME!

Destarte por ser o último responsável pelo processo o Dr. Jorge (Rosário de crimes) Teixeira, como será lembrado pelas sucessivas fugas de informação, violando o segredo de justiça, crimes não investigados nem apurados até a data, maculou-se mesmo alcançando um êxito tão bem conseguido.

sábado, 30 de setembro de 2017

Da Insubordinação Civil. "Todo el pueblo, a una."






A insubordinação civil destrói o Estado de Direito, mas não como a guerra o faz, onde por sua ação deixa de haver o próprio Estado, e deixa de haver Direito, podendo, terminada a guerra, haver qualquer outra coisa que os vencedores queiram que haja; nem o destrói como o crime, que corrompe o Estado de Direito, se o destruir, ao menos na aparência, e nem o desmonta, ou o anula, onde se manifesta, sendo mais como uma mancha punctual que logo desaparecerá, porque as forças da ordem e da legitimidade do Estado de Direito são mais poderosas que as do crime. Com a insubordinação civil temos igualmente a derrocada do Estado de Direito por sua ação, mas não como crime porque não sendo individual como é no crime, o Direito que questiona tem uma abrangência mais ampla, e que não é corruptora, mas efetivamente destruidora, portanto, mesmo com sua punição, é alvissareira e não como a guerra porque depois de  realizada não implantará novo Estado de Direito, como podem fazer os vitoriosos da guerra por terem força para tal. Aqui, com a insubordinação, sua força extingue-se em si mesma, como a vida, no ato de realizar-se, não indo para além disto; no entanto esta simples manifestação heróica é suficiente para alterar o Estado de Direito definitivamente, e qualquer perseguição que se lhe façam, a legitima ainda mais. Portanto é como um furacão que muda a paisagem definitivamente, já nada será como dantes, posto que houve aquele ato de insubordinação, alterando mesmo o próprio Estado de Direito.

Gandhi viu isto com clareza, advogado que era, e, com sua formação jurídica, foi destruir a supremacia do Império Britânico ao fazer sal. O Império decretara sua exclusividade na Índia em poder fazer sal, esse bem diário tão precioso e necessário à vida humana. Pois Gandhi com um grande número de seguidores foi ao mar, apropriou-se de uma quantidade de sua água e deixou-a evaporar ao calor intenso do Sol indiano, produzindo, destarte, sal, o que era proibido pelas leis do Império que governava a Índia. Era a insubordinação civil, a arma pacífica que Gandhi escolhera para derrubar o Império Britânico e libertar seu país. E derrubou-o! Sabia que corrompera a essência de uma supremacia iníqua, sabia que depois nada mais voltaria a ser como dantes, e sabia mais, que se os ingleses o perseguissem ou o prendessem, como aconteceu, mais ainda estaria legitimada sua causa.

Esta ocorrência ocasional em Catalunha, posto que os catalães, diferentemente de Gandhi, que o fez conscientemente como ato de insubordinação, foram levados por força da estupidez de Madrid, consubstanciada na posição de um homem sem grande visão, o sr. Rajoy, a cometerem a insubordinação, ou seja,  realizarem o Referendum contra a vontade espanhola, contra a letra dos dispositivos constitucionais, e contra a decisão do Tribunal Constitucional que a confirmou. É um ato de insubordinação civil que destruirá o status quo do Estado de Direito, criando nova realidade, um novo modo de estabelecer as coisas pela vontade, vontade renovada e modificada diferentemente do que tem prevalecido em Espanha até então. Tudo será diferente, ainda que Madrid creia impor sua vontade, punindo exemplarmente os líderes da revolta. A insubordinação civil, assim como um vírus para o qual não se conhece remédio, infectará o Estado de Direito, comendo-o vivo por dentro, e pondo em seu lugar algo diverso, uma realidade absolutamente diferente que revelará possibilidades infinitas, que, para quem as souber conduzir, serão as obreiras do futuro desejado, onde Novo Estado de Direito se irá assentar.

Diga-se como Lope de Vega: "Aqui a vontade do povo é só uma: Fuenteovejuna, Fuenteovejuna."

Está cada vez mais perto o dia de uma autonomia Catalã, que só poderá ser evitada com a oferta de a transformar em Reino-Unido, como foi com o Brasil, reino unido de Portugal quando D. João (que depois será o VI de Portugal) lá foi morar no Rio de Janeiro. Esse anseio Catalão tem muitos séculos de luta, e não desapareceu. Quando em 1640 Portugal era espanhol, a Espanha perdeu Portugal, e a sua outra metade do Império mundial, para manter Catalunha, não evitando a Restauração portuguesa com a aclamação de D. João IV, quando ficou muito evidente o quanto estava disposta a pagar para manter a província catalã. Porém a insubordinação civil que agora se deu, abre novas e inesperadas perspectivas imponderáveis.

A insubordinação Civil tem um poder desalentador, roubando mesmo o fôlego de quaisquer outras ações, porque além de desmoralizar o dito estado de Direito, expondo que não há esse Direito pretendido a manter o Estado, como faz desmoronar todo o edifício do Estado (do Governo) como até então estava estruturado, e desqualifica qualquer nova ordem pretendida a ser instituída. A combinação desses três fatores, mais, como nos lembra Lope de Vega, o de juntar as vontades populares, é fatal, derrubando total e  absolutamente o Edifício do Estado, que só poderá ser reerguido com outras pedras.




terça-feira, 26 de setembro de 2017

Agência Europeia de Segurança Digital.






Dentre todos os pontos do discurso do estado da União do presidente da União Europeia no passado treze de Setembro, onde abordou pontos tão importantes como a política financeira, e econômica, o crescimento da união, terrorismo, defesa. etc..., Jean Claude Junker tocou num ponto crucial para a UE, a Agência para a Segurança Digital, que sendo uma iniciativa transnacional ganha contornos de uma importância vital para o futuro da união, primeiro porque a consolida como tal, sem fronteiras virtuais, segundo que a abrangência da ação de uma agência europeia, permitirá que os mecanismos de defesa se alarguem e formem um sistema de defesa informática que se traduzirá na efetiva defesa de meios que já são interdependentes como os oleodutos, os gasodutos, as refinarias, as linhas de transmissão de energia transfronteiriças, as bolsas de comércio, e tudo o mais que se tem integrado Europa fora, para além da integração territorial num espaço 'sem fronteiras'.

O Sr. Junker acerta na mosca com essa proposta, muito mais porque o espaço virtual é hoje o primeiro campo de ataque onde se desenvolvem as ações básicas a qualquer guerra que pretendam desencadear, e é ao mesmo tempo plataforma para qualquer ação de terror que se esteja a fermentar. O Mundo hoje é algo tão diferente do que era há três décadas, que não pode ter como referência esse tempo, muito menos o que foi a última guerra mundial já tão distante segundo esses rápidos critérios, pois foi já há mais de sete décadas, e os tipos de respostas que se davam então, não são os necessários hoje. Portanto há que se equacionar novos critérios.

Como a maioria do que se passa nessa área é mantido em segredo, pouco se sabe dos malfeitos dos ciber-ataques perpetrados, e dos desenvolvimentos alcançados pelos hackers em conseguir penetrar as instalações mais protegidas por um lado, e a integração digital dessas instalações e seu controle por outro, como busca de se defenderem, mas que as tornam vulneráveis numa medida nunca antes possível. Vejamos alguns dos perigos:

1. O ramsomware - Software que invade o sistema e o bloqueia, e que para liberarem o sistema, os que implantaram o ramsomware exigem pagamento de resgate. Hoje são milhares de ataques desse tipo que andam pelas redes de empresas cujo bloqueio do sistema gera milhões em prejuízo.

2. O malware - É um sistema malicioso destinado a se infiltrar em redes de computadores para causar danos, alterações ou roubos de informação. Uma vez havendo proteção contra o malware, cria-se outro que ultrapasse essa barreira de proteção, por isso são comparados, e mesmo intitulados, virus, pois geram outras estirpes mais 'capazes' à medida que evoluem.

3. O Spyware - Programa que recolhe informações sobre o usuário e seus costumes. As informações recolhidas têm grande clientela que, na posse delas, pode dar uso legal ou ilegal às informações adquiridas.

4.  O rootkit - Funciona como um bloqueador de anti-virus, desta forma protegendo o malware que se queira instalar.

5. O adware - É um malware que gera anúncios para influenciar o consumo do usuário.

Bem, há muitos tipos de ciber-ataques que andam pelas redes, assumindo identidades, se infiltrando nos sistemas e nos computadores, mesmo os domésticos, quem esteve ou está ligado a internet sabe bem do que eu falo, e sabe dos perigos que corre. Isto demonstra a criatividade do ser humano, sua capacidade nociva, bem como de outros seres humanos e suas capacidades defensivas. E isto nos leva a evidência da necessidade de proteção, porque a frequência cada vez maior com que ocorrem tais ataques, a capacidade criativa dos que se dedicam a isso, a formação de redes de ciber-criminosos, que vêm atuando, e que, com as mais diversas formas de ação criminosa, que vai desde o recebimento de chamadas com valor acrescentado, até a penetração e posse dos dados pessoais que alguém tenha no computador, passando por contas bancárias e ativos de negócios, mantêm um alto grau de impunidade.

Estamos todos nas mãos desses bandidos! Desde aqueles que não sabem que têm de pedir às empresas de comunicação por telemóvel que bloqueie o acesso de seu telemóvel aos diversos tipos de chamadas de valor acrescentado, ou de serviço indesejado, com grandes custos para quem as recebe, e que os criminosos, antes de perpetrarem o crime, fazem um estudo do nível do usuário para saberem o tamanho da mordida que podem dar, e que atinge até as grandes corporações com os melhores sistemas de proteção, que são invadidos e se vêm obrigadas a pagarem resgate, pois esperarem pela resolução do problema lhes será muito mais caro, como ainda os sistemas governamentais estão expostos a estes criminosos.  

O grande problema de sua ação criminosa, é que é transnacional, e, como tal desconhecendo fronteiras, podem repetir seus crimes em diferentes países, após haver proteção contra eles num determinado país, encaminham-se para outro, sempre escondidos sob a capa de um programa que os encobre, e lhes dá impunidade, tornando difícil sua punição. Na Europa só há dois organismos transnacionais que atuam nessa área, um é o gabinete europeu da Europol que está habilitado a desenvolver investigações internacionais no ciber-espaço, o que se dá sempre depois da casa arombada, e o EC3 - Centro de proteção contra a ciber-criminalidade, que é preventivo, mais ainda tem uma dimensão muito restrita. Com a criação de uma Agência a nível europeu, como agora é proposto, e o envolvimento dos governos de todos os países com suas agências de informação, que presentemente são estanques, e que com a criação da agência europeia estabeleceriam cooperação entre elas, e passariam a atuar como um bloco, alcançando uma dinâmica mais abrangente com maior capacidade de enfrentar os ciber-ataques e podendo indiciar aos ciber-criminosos, e leva-los a condenações, prevenindo o crime.



sexta-feira, 22 de setembro de 2017

E o mar vai virar sertão. . .



Por fim um jornal de  grande circulação acolhe o tema. Eu já há alguns anos venho alertando, mas ninguém se preocupava, nem nenhum órgão de comunicação se interessou em publicar minhas crônicas sobre esse assunto, Agora com o agravamento da seca na península ibérica, particularmente com zonas muito afetadas no sul de Espanha, sai uma reportagem no El Mundo. Vamos analisar o mapa que prevê a extensão do fenômeno e as zonas que virão a ser atingidas:



Como podem ver meio Portugal vai virar deserto, e é por isso que tenho insistentemente avisado para que comecem a replantarem os Sobreiros se não quiserem perder o negócio da cortiça. Na crônica intitulada 'Está na hora de mover os sobreiros . . .' dou conta de que com a progressão da expansão da área que irá ser afetada pela seca, desertificando-a, onde todo o Alentejo será Sahara, e as zonas de montado acabarão, portanto esta solução econômica tão importante para as populações, e que representa cinco por cento da economia portuguesa, deve ser imediatamente transplantada para além Ribatejo que passará a dispor das condições adequadas para os sobreiros nas zonas com altitude inferior aos trezentos metros,a pouco e pouco, com o progredir das alterações, e, por outro lado, dando o tempo necessário à sua recomposição, não se esqueçam que deverão se deslocar milhões de animais selvagens que compõem a sua fauna, que toda a flora deverá evoluir, e para os humanos, negócio complicado, serão propriedades que dever-se-ão alterar os seus donos.


A alteração da inclinação do planeta.

A solidariedade europeia será posta em xeque, posto que países inteiros afetados pelas alterações climáticas exigirão respostas econômicas para dar horizonte às suas populações que serão gravemente  restringidas em seu modelo sócio-econômico de vida e na possibilidade em altera-lo, o que demandará muita ação governamental para se re-estabilizar, para em breve tempo tentar recompor a vida dos cidadãos, em muitos casos se a ação para essa finalidade não tiver começado com décadas de antecedência, seus modelos de vida e sua soluções econômicas sucumbirão, lançando largas faixas da população na miséria absoluta, o que não nos parece um cenário propriamente europeu.

Assim fica claro essa acertava de que o sertão vai virar mar, mar de areia, deserto, agora o mais complicado é este paradigma contra a fraternidade dos povos que nos impõe "com medo" a ideia de "que algum dia o mar vai virar sertão". . .  valendo-me dos versos  de Sá, Rodrix e Guarabira neste fabuloso xote "Sobradinho".


Referência publicada no face junto com esse artigo: Falam da seca como se esta fosse eventual, informo que este será o novo normal. Também o disse na SIC num debate televisivo. A visão governamental dos países implicados, Portugal e Espanha, não vai para além do que se está a passar, a seca, como se ela não fosse voltar o ano que vem. Em Espanha, em Guadalajara, estão fazendo uma praia pluvial, fazem transferências de caudais entre diferentes bacias pluviais desestabilizando ainda mais a relação alterada em varias bacias. Medidas de contenção que são tomadas vêm só o amanhã de manhã, nenhuma medida a longo prazo que denote que sabem qual é o problema verdadeiramente foi até agora (Novembro de 2017) indicada ou tomada.


terça-feira, 19 de setembro de 2017

A bolha da embaixada do Ecuador. "PRIVAÇÃO É MORTE!"




As embaixadas, como sabemos, são solo estrangeiro nos países onde se encontram, o que equivale a dizer que sendo território do país dono da embaixada, é este país que ali manda, e não o país onde se encontra, são ilhas de excessão pelo mundo fora, que têm dado  muito jeito na defesa da vida de gente que perseguida localmente, tem apoio e respaldo internacional, muitas vezes contra as ditaduras desses países onde se encontravam, por terem se asilado numa embaixada, os permitiu se protegerem e manterem-se vivos mor das vezes.

Sendo o mais comum prestarem proteção a gente de um determinado país perseguida por um regime truculento deste, que conseguindo se abrigar numa embaixada que os acolha, conseguem negociar sua saída para uma nova vida longe do país que os persegue, fora do jugo que os limita, aqui temos uma contradição, uma bolha de excessão na embaixada do Ecuador em Londres, algo tão surrealista que requer uma análise detalhada, e exige que ponhamos os olhos nesse evento desprovidos de qualquer preconceito, imbuídos apenas da vontade de analisar uma situação inaudita.

Há mais de cinco anos Julien Assange, um cidadão australiano, que teve a cidadania sueca, da Suécia onde vivia, encontrando-se em Inglaterra, foi acusado pelo governo dos EEUU, foi preso, perdeu a cidadania sueca para onde tinha sua vida, e se retornasse de sua estada em Inglaterra, corria o risco de ser extraditado para os EEUU, que mantêm com a Suécia amplos acordos de extradição, vendo-se encurralado, consegue, fugindo à polícia metropolitana londrina, esgueirar-se para a sede da embaixada do Ecuador, que lhe dá asilo, e onde se encontra numa 'prisão' posto que a Inglaterra recusa o passo para que ele vá para o Ecuador, tomando um avião em Londres,  criando-se uma bolha muito conveniente às autoridades que o querem ver preso. Vamos á história.

Considerado um alvo a abater nos EEUU, exilado numa embaixada situada em território que lhe é  hostil, o inglês, com o fraco país que lhe dá asilo, o Ecuador, pressionado de todas as maneiras para entrega-lo às autoridades britânicas, que inclusive ameaçaram invadir a embaixada, e que, por decisão já tomada da corte suprema inglesa, prontamente o entregariam à Suécia, que o extraditaria para os EEUU, que o prenderiam e condenariam por espionagem, e onde seria morto, segundo uma crença generalizada, numa prisão americana, esta é, de forma resumida a situação em que se encontra o Sr. Julien Assange, um dos nove membros do conselho executivo de uma associação que fundou, chamada Wikileaks, que com suas habilidades de 'hacker' conseguiu obter milhares de informações secretas que comprometem a ação de vários países dito democráticos, revelando-lhes uma face obscura e comprometedora, que pretendem manter oculta.

Penso que pretendem matá-lo lentamente com o confinamento, o Sr. Assange, pela pouca mobilidade, não pode caminhar, vê pouco o Sol, já vem demonstrando uma serie de doenças neurológicas que se vão agravando sem tratamento adequado, posto que o governo inglês sistematicamente recusa a sua ida a qualquer hospital seja para o que for, não atendendo a nenhuma das solicitações médicas, sendo mantido ilegalmente detido pelas ação combinada das autoridades britânicas e suecas, e o ilegalmente está a negrito porque a afirmação não é minha, é da ONU, que, analisando o caso, assim o declarou, nesta absurda condição o vão mantendo dia após dia, sabe-se lá até quando, ou, como podemos imaginar pelas decisões prolatadas ao mais alto nível pela 'justiça' dos países mais civilizados deste mundo, indeterminadamente.

O curioso nesta bolha que se criou para o Sr. Assange, esse mundo a parte onde o colocaram, na impossibilidade de o prenderem e condenarem, e mesmo o matarem, é que estamos a falar de países com uma tradição de liberdade, de justiça, e de liberalidade democráticas preponderáveis, de povos com altíssimo estado de avanço civilizacional: Suécia, Inglaterra, etc.. os EEUU com uma democracia sólida, dos quais não esperávamos de forma nenhuma que tratassem um ser humano como vem sendo tratado o Sr. Assange, pelo crime de divulgar segredos que assim, como segredo, queriam ser mantidos. Para contrariar este deplorável entendimento cito aqui as palavras de Thomas Jefferson, um dos 'founding fathers' americanos, mentor dos valores essenciais do país que se criava, e dos quais parecem se terem tanto afastado: "É mais seguro manter toda gente respeitavelmente esclarecida que uns quantos em alto estado de consciência e os muitos na ignorância."

Retornei a este assunto que já havia tratado no texto intitulado 54 meses de estupidez, Wikileaks... lembrado pelo The New Yorker no excelente artigo "Privacy and surveillance", de que a situação do Sr. Assange vem se deteriorando, e o faço pelas mesmas razões que denunciei um vizinho que mantinha seu cão confinado a uma varanda, onde o pobre dispunha de poucos metros para se movimentar, e estava se atrofiando vivendo ali naquelas condições. São desumanas as condições em que se mantém o Sr. Assange, e em suas próprias palavras que serviram de subtítulo a este artigo do The New Yorker, quando diz que devemos entender a realidade de que privação é morte, e que, pela ação cominada das nações mais evoluídas do planeta, vai sendo mantido na miserável bolha da embaixada do Ecuador.