quarta-feira, 30 de abril de 2014

20 anos sem Ayrton.






Foi há vinte anos num primeiro de Maio como este  dia do trabalho, que deveria ser designado do trabalhador como é no resto do mundo,  já que não há trabalho sem quem o faça, todos em casa por causa do feriado, vendo a corrida ao vivo, ficamos estupefactos com um terrível acidente em Ímola, o emblemático circuito italiano, mísero acidente que vitimou nosso herói da Fórmula Um Ayrton Senna da Silva, prova viva de quanto pode a obstinação.

Ayrton era mais que tudo um empenhado ao mais alto nível, valendo-se de todos os meios para conseguir as condições necessárias, físicas e psicológicas a nível pessoal, e mecânicas, de empenhamento, de ajustamento das máquinas  e equipamentos etc.. a nível de escuderia, e melhores pistas, mais seguras e com melhor manutenção a nível organizativo, tendo assumido a liderança dos pilotos, o que desagradou profundamente os senhores do dito circo da fórmula um (Circo porque muda de acampamento a cada apresentação, ou seja a cada corrida.).

Nunca será demais lembrar Ayrton, e o fiz recentemente pelo seu nascimento no começo do ano astral próximo passado no vinte e um de Março, em que o Google lembrou seu natalício com uma homenagem só feitas a tipos universais, dada a abrangência da marca, e aqui repito o que então disse, pois que fica aquela faceta sua que mais nos marcou: seu carisma!





 




Hoje o Google está lembrando que Ayrton Senna, se fosse vivo, completaria 54 anos. Morreu há vinte anos, completam-se no próximo primeiro de Maio. Nunca mais assisti a uma corrida de fórmula um, o que fazia costumeiramente naquelas manhãs de domingo, mesmo antes da era Ayrton, como por todo o tempo em que ele nos encantou, desde sua primeira vitoria no Estoril com sua Lotus negra. As corridas perderam toda a graça para mim desde aquele trágico dia em Bolonha. E as sucessivas vitórias sem emoção do alemão Schumacher nunca entrariam para a história sem a morte de Ayrton, porque não teriam acontecido.

Agora dou-me conta de que o trato pelo nome como se fosse íntimo, como se privasse com ele. Penso que privei, todos os que o seguimos privamos naquele final da década de 80 e começo da de 90 no século passado, no milênio passado, mas sua memória permanece, sua presença é incontornável se falarmos de fórmula um. Com ele o Brasil era o segundo país campeão, hoje terceiro, no mundial de pilotos, teria sido primeiro sem o acidente, ele tinha fome de vitórias.

Enquanto esteve vivo, seus gestos mais banais, como o de se envolver com a bandeira do nosso país, ou dar a volta da vitória com ela a tremular em sua mão saída da janela de sua máquina, o dedo levantado(Um!) o que nos fazia saber que estava a conduzir com uma só mão, suas brincadeiras com o champagne, suas declarações frontais e, por final, sua liderança incômoda dentro da fórmula, foram atitudes que marcaram tudo e todos, e que levaram a que sua  presença/ausência fosse/seja tão querida.

A dimensão humana das pessoas é a única que conta. Morreu uma dama também num acidente, aliás ambos acidentes difíceis de explicar, difíceis de engolir. O desta dama foi em Paris, no tunel d'Alma três anos depois do de Ayrton, e viu-se, assim como foi com Ayrton, a repercussão mundial de sua presença/ausência, tão forte que levou a Rainha, sua ex-sogra, a ir ao seu local de culto popular por flores como toda gente, situação inédita na História Britânica.

As coisas passam-se como se passam, pela presença da pessoa, pela força da sua presença. E quanto mais despretenciosa esta é, mais forte as torna. Houve os que fascinaram multidões como Ghandi, Mandela, JFK, Lady Di e Ayrton entre outros, não muitos neste universo seletivo do pendor popular, e que, penso, jamais serão esquecidos, como hoje lembrou-se de Ayrton o Google, e lembramo-nos todos, de tempos em tempos, destes que sutilmente se evidenciaram, com ou se mortes trágicas, pela força de suas presenças mais que tudo. A esta força  chama-se carisma.


Dorival Caymmi







Fica por saber.                                                               30/4/1914
                                                                                                                30/4/2014

                                                                                                           No centenário de seu nascimento.

Foi quase um século de paz.
Que conquista!
Com a calma que a brisa traz
E uma vida de artista.

Era quase sempre você, o seu violão e sua voz,
Raras parcerias, só você era mais que suficiente
Não há dúvidas, de que era pleno, para todos nós
Em sua rítmica prenhe, rica, pungente.

Numa batida única, própria, untuosa, e singular
Dizia tudo, do sentimento à uma receita culinária
Sem pretensão, muito simples, mas nunca vulgar
Com uma cadência mágica extraordinária.

Dói-me você não existir mais, meu grande babalorixá...
Parece que ainda o vejo como o conheci: todo de branco,
Até o cabelo. E, com seu estatuto, permitiu-me 'me achegá'
E deixou-me pra sempre prisioneiro desse seu sorriso franco.

Fiquei impressionado quando soube que só nos deixou 104 canções,
parecem muitas mil, 104 sucessos sem exceção, nem uma só escapa
Sente-se assim porque todas despertam muitas mais emoções
o que multiplica nelas sua expressão, e tudo muito à socapa

Era sua forma depurada de fazer, fazer devagar, fazer com alma
Bahianamente, docemente, humanamente, como só você
Eu não consegui aprender, sempre aflito e sem calma
Que saudades sinto de não mais lhe poder ver.

" Ai, ai que saudades eu sinto da Bahia"
d'"A terra de Nosso Senhor"
De tua voz  que era nossa companhia
Que cantava o povo, seu gosto e seu amor

" Ai. esta saudade dentro do meu peito"
" Que carrega com a gente"
" Eu pelo menos mereço o direito"
De encontrar alguém clemente
Que me 'acalante' e que me acalente

Bahiano burro nasce morto, diz o povo
E quão certo estão, podemos crer
Você então é que deveria renascer
Pra nos poder cantar tudo de novo

Muitas são como cantigas de rodas
Do mais puro que o povo tem
São eternas e são modas
Que vivem no ontem, no hoje e no mais além

"Um peixe bom eu vou trazer."
Pro Four men on a raftt de Orson Welles.
Ninguém nem nada os faria esquecer
Nem mesmo se quisessem, ou pudessem eles

Imagino Você entre as núvens com os arcanjos
E lá no céu todos começam a cantar
Cantam mulheres, crianças, cantam marmanjos
Já ninguém os consegue calar
E aguardamos aqui longe, longe dos anjos
Que por si, o pessoal não fica 'cansado de esperar'.








terça-feira, 29 de abril de 2014

O CDS E AS PRAXES.






Vem o partido popular propor a autonomização da criminalidade quando essas práticas criminosas forem cometidas no âmbito das praxes. Muito bem, não resolve nada, mas evidência que as praxes são um universo criminal á parte que amplifica a criminalidade, por serem suas práticas tendentes ao branqueamento da criminalidade que efetivamente contêm no âmbito em que se desenvolvem, logo apadrinham práticas criminosas determinando-as como outra coisa (tradição estudantil, brincadeira antiga) por isto  as querem ver autonomizadas e terem as penas de seus crimes alargadas. É  uma idéia verdadeira e útil que porém dependerá da denúncia e da comprovação, que é exatamente o que escondem as praxes, tanto pelo ambiênte em que decorrem, quanto pelas reservas que provocam entre os que são alvo delas.

O Bloco de Esquerda havia há pouco tentado a via de incluir a responsabilidade das Escolas nas práticas resultantes das praxes, integrando os outros agentes e atores do universo escolar em sua realização e desenvolvimento, comprometendo-os. O que também prova o perigo que estas representam como manifestação e realidade criminal, e às vezes criminosa, no  meio onde decorrem e às pessoas a que atinge e mor das vezes aflige.

Esta manifestação anti-cultural nociva como já deixei claro em artigos anteriores é deformadora do caráter de quem nela participa como agente ou paciente, e que há menos de uma semana em Braga veio a matar novamente, acidentalmente é verdade, mas se não tivesse havido praxe os alunos nunca teriam sentado naquele muro. As praxes vêm inquietando mentes e corações por este Portugal fora, e irá ainda revelar muito do lixo varrido para baixo do tapete que esta prática oculta, e que só a estupidez da cumplicidade classista vem impedindo, há enorme tempo, de mostrar a sua face mais perversa e mais verdadeira. Já que na verdade é uma perversão!

Em França estupidez similar mereceu legislação pertinente criminalizando essas práticas, o que não resolve o problema, mas que no texto da própria Lei o revela com a crueza do que ele significa. Vanos ao texto da Lei francesa: "Quem levar outrem, com ou sem seu consentimento, a submeter-se a conduta ou ato dependente será punido." Afirmando que estes que assim procederem serão punidos para o efeito inibidor da Lei, assim esta está a verificar a transgreção e a consenti-la ao mesmo tempo, pois é sabido que ela se verifica sempre; ou seja reconhece que há nas praxes agentes que levam outros a submeterem-se muitas vezes, ou na totalidade das vezes, contra suas vontades, já que a elas sujeitos. O que é isto? Escravidão? Subjulgação? Prisão? Condenação? É  uma destas opções, ou algumas combinadas. O que são as praxes? Segundo a Lei francesa e segundo qualquer lógica, o que na Lei faz depender a punição desta conduta, ou ato dependente, que é o mesmo que dizer que toda a praxe, como são conhecidas na prática em que se manifestam, são passíveis de punição, vale dizer são criminosas ! Se assim é, por que não são simplesmente proibidas?

Mesmo que algumas não sejam criminosas, são uma manifestação que humilha, rouba o caráter, diminui a condição humana, nivela por baixo, e são potencialmente assassinas, como se têm revelado. O mínimo que se pode dizer delas é o que tenho afirmado, e hei de repetir à exaustão : TODA PRAXE É ESTÚPIDA!







A COPA DO MUNDO NO BRASIL.





Sessenta e quatro anos depois o Brasil vai receber a disputa outra vez em seu território, algo muito desejado por todos os países do mundo, quanto mais aqueles que têm grande número de torcedores e nos quais o esporte das grandes emoções é uma paixão, e é o esporte nacional. Neste caso aumenta significativamente a importância do evento, sobretudo porque nestes países uma das pretenções é sagrar-se campeão em casa. No caso do Brasil estas condições atingem o mais alto grau de vivacidade, porque no Brasil o futebol não só é o esporte e a paixão nacional, com paixões ao rubro ("A copa do mundo é nossa, com brasileiro, não há quem possa.") pode-se dizer que praticamenete todos os brasileiros são torcedores, e, também, que têm grande pretenção em ser campeões, pois sendo o Brasil o país que mais vezes ganhou a Copa, e sendo o único país que tem uma taça, a Jules Rimet, em caráter difinitivo, ganha na primeira disputa de taça do campeonato, e estando bem colocado para conquistar a segunda, a taça FIFA, tem desejo de que isto aconteça em casa, evidentemente. Este conquistar é simbólico posto que esta taça ja não mais pertencerá física e definitivamente a nenhum país, como aconteceu com a Jules Rimet, a atual sempre será da FIFA.

Ademais o país anfitrião ganha muito com promoção turistica do quase um ano que fica na mídia mundial, mostrando suas belezas naturais, seus estádios e suas possibilidades turísticas. É uma vitrine única a que todos os países almejam, por todas estas razões, mais as do orgulho e vaidades nacionais de receber um campeonato mundial de futebol.

O Brasil desperdiçou tudo isto. Mostrou-se incopetente, revelou-se inóspito, desqualificou-se como destino turístico. Jogou fora uma oportunidade única de se promover por todo o mundo como um destino turístico viável, fazendo esquecer a violência que retira milhões de turistas todos os anos ao Brasil, e com eles retitra centenas de milhões de dólares ao PIB, bem como retira milhares e milhares de empregos, e a oportunidade do Brasil se tornar opção como destino de férias, num mercado disputadíssimo como o turístico. Esta incompetência nacional a todos os níveis, este desperdiçar um evento que só pode ocorrer num país, com sorte, duas vezes à cada século, é a prova máxima desta incompetência e da imcompreensão de como as coisas funcionam no mundo globalizado, em que cada milímetro do espaço é, e será cada vez mais disputado. Roubam com isto ao Brasil a chance de entrar definitivamente para o rol das nações desenvolvidas, roubam a chance do país ser considerado viável para tudo, para investimentos, para outros eventos, para opções de negócios de toda ordem, e com isto roubam empregos, roubam o espaço do Brasil no mundo, roubam dignidade e orgulho aos brasileiros de o serem.. É uma vergonha, mas mais que isto é um crime, CRIME DE LESA PÁTRIA, e como tal devera ser punido.

O Campeonato Mundial de Futebol, esta invenção maravilhosa que, assim como as Olimpíadas é tetraenal, e, assim como as Olimpíadas, muda de país a cada evento, levando a este país uma grande festa e a possibilidade de se mostrar como nação na grande vitrine da mídia mundial, tem fortes ligações com todo o mundo e todos os países, inclusive aqueles onde o esporte não era tradição, que fizeram e fazem ações para acolher o esporte em seu país com vistas a promover um dia uma Copa, foi o que se passou com o Japão no final da década de oitenta e durante a de noventa, e acabou por acolher o campeonato em 2002.

Este é o vigésimo campeonato em oitenta e quatro anos de existência das copas, e em quase séulo e meio do desporto, e é um dado adquirido, que a  intermitência é de décadas entre duas copas se realizarem num mesmo país, excessão feita ao México, exatamente pela competência na gestão de sua primeira copa. A primeira copa no Brasil foi do primeiro governo da segunda república, Dutra, como que quando  voltaram a se realizar copas, após a segunda grande guerra mundial, que interrompeu a realização em duas vezes, quizessem premiar o Brasil que também deixava os longos anos da ditadura do Estado Novo, velho é que era, nada mais velho que uma ditadura na História da humanidade. 

Pois o México, potência muito similar ao Brasil ( sendo ambos latinos, terceiro mundistas, atrasados, com enormes disparidades e injustiças, na mesma faixa de PIB entre 1 e 3 trilhões de dólares, com os mesmos problemas sociais, PIB per capta ainda mais próximo etc...) conseguiu cumprir as metas e receber duas vezes em menos de duas décadas a copa, explodindo como destino de turismo e negócios. O Brasil não tem justificativas para ter falhado, reunia e reune todas as condições, desde as indispensáveis, econômicas e humanas, técnicas e administrativas, até as espirituais e políticas, nada perdoará, aos responsáveis, este falhanço!

O Brasil desqualificou-se aos olhos do mundo, e, num mundo cada vez mais competitivo, vai demorar muito tempo a se requalificar. Não pensem que as coisas se resolvem pela alegria e boa disposição do povo brasileiro, não se resolve. E neste caso estas qualidades ainda estão por se verificar, indispostos como estão com a copa e o gasto excessivo de recursos. Recursos que poderiam em muito voltar com turismo e negócios, hipóteses que se distanciam pela má imagem que permanecerá pela falta de organização e cronogramas. O Brasil é rico, é verdade, mas não pode como nenhum país pode, dispensar as oportunidades que se apresentam. Viram a China o grande profissionalismo que demonstrou com as Olimpíadas, e o retorno, duplicou o afluxo turístico. Enquanto esta gente que se diz elite brasileira, a todos e qualquer nível, elite empresarial, elite administrativa, elite política etc..., não tiver em conta a grande responsabilidade que lhes apresentam as ocasiões que surgem num mundo com recursos cada vez mais escassos e caminhando para outra forma de economia e com outras formas de desenvolvimento, e que não podem perder estas oportunidades de forma alguma, porque elas representam o futuro do povo brasileiro, teremos a repetição deste triste espetáculo da copa, inquietando todo mundo e promovendo as manchetes mais desabonatórias nos jornais pelo mundo fora. 

Aproveitemos para lembrar aqui  a Constituição de artigo único sugerida para o Brasil por Capistrano de Abreu:   
               Artigo 1º -Todo o brasileiro deve ter vergonha na cara.
                      § 1º - Revogam-se as disposições em contrário.






segunda-feira, 28 de abril de 2014

ANTÔNIO DE OLIVEIRA SALAZAR 1 e 1/4.





Deixei passar o dia de hoje, 28 de Abril de 2014, esperando que algum órgão de comunicação lembrasse que hoje transcorrem cento e vinte e cinco anos do nascimento do Dr. António de Oliveira Salazar, ditador de Portugal por muitas décadas. Nem uma só palavra encontrei na mídia sobre a matéria, o que causa espécie por ser a figura em causa determinante na vida atual dos portugueses, e como tal devera ser lembrada. Ainda passarão muitas décadas para que restituam a este senhor seu lugar na História, porém é sempre bom lembrar que a História não se apaga, que a História não é um papel que se rasga ou, como fizeram com nome do ditador que denominava a ponte sobre o Tejo, se derruba a poder de marretadas. A História é algo imutável e deve ser sempre lembrada, até para não ser repetida.

Transcorridas, três dias antes, quatro décadas do derrube do regime do qual este Senhor se tornou o rosto, dever-se-ia já ter-se perdido o medo de sua sombra distante, e ter-se registrado a ocorrência com inteira normalidade histórica, inclusive para denotar a normalidade democrática destes tempos, pelo menos na aparencia.

A anormalidade de não se registrar a data é uma evidência do pouco apego ao registro histórico que no país da censura, dos pouco mais de oito séculos e meio de existência, só, sabidamente, as últimas quatro décadas foram vividas sem ela. Os dois primeiros séculos não ostensivamente e, o que lá houve perde-se nas brumas do tempo, depois quase seis séculos de censura ostensiva, com  todos os meios e modos institucionalizados. O Autoritarismo da mesma maneira até 1834 que aí cessa com a ação libertadora de D . Pedro IV, salvo antes uns aninhos com D. João VI, para depois voltar por longo período republicano, até o 25 de Abril. Os atrasos de todas as ordens sempre existiram no país, ademais do analfabetismo e dos atrasos crônicos em quase todas as áreas, em que, salvo escapadas num e noutro sentido, só mesmo o Marquês de Pombal e Salazar fizeram alguma coisa continuadamente mais paupável antes do 25 de Abril. Pombal era fruto da vontade de D. José e Salazar fruto de uma ditadura que já existia na mão de incompetentes que levaram Portugal a bancarrota e que o Dr. Salazar rapidamente retirou dela, logicamente tornando-se a cabeça da ditadura.

No mais este senhor era um homem do sécuo XIX, com ideias deste século, fortalecidas pela sua formação seminarista, que tornou-se ditador de um Império Colonial, e, como é absolutamente lógico não queria abrir mão dele -Perguntem a Inglaterra se ela abre mão de Malta, das Malvinas ou de Turk and Caicos - e é a grande e democrática Inglaterra, porque haveria de ser diferente com Angola e Moçambique, e o pequenino e autoritário Portugal salazarista?

Não estou fazendo a defesa do dr. Salazar de quem não tenho procuração de espécie alguma, mas estou fazendo a defesa da História que não se deve tentar omitir, para o bem e para o mal, a História é a História e, como tal deve ser contada. Gostemos ou não gostemos dela, concordemos ou não com seus acontecimentos, eles permanecem imutáveis e só os devemos contar como se passaram, e não procurar branquiar fatos menos agradáveis por quaisquer razões. Se o dr. Salazar tivesse deixado o poder nos anos 50, talvez tivesse, ainda que ditador, uma estátua em cada vila deste país, entretanto passou seu tempo, os benefícios que fez a Portugal perderam-e no mar de malefícios de toda as ordens que causou, sobretudo nos meios que implantou para manter o império, vendo-se, apesar de lembrado, odiado por muitos pelo regime, no qual excedeu todos os propósitos para o manter, mas se muitos fazem o mesmo no tempo de uma legislatura, imaginem este senhor apegado à cadeira por uma dezena delas?

Muitos de  meus leitores ver-se-ão incomodados com este meu reparo, sinto muito. Porém como acho de meu dever registrar todos os eventos significativos respeitantes ao mundo em que vivo, e, particularmente às duas sociedades onde estou inserido, não poderia deixar passar em branco data tão significativa na memória nacional portuguesa como os cento e vinte e cinco anos de nascimento do Dr. Antônio de Oliveira Salazar.









sexta-feira, 25 de abril de 2014

A REVOLUÇÃO DO CRAVOS.- o poema.

Uma flor em cada arma. Uma mulher anônima entra na praça Onde dois lados de uma nação se enfrentam Traz consigo cravos aos molhos, os quais por graça Põe nos canos dos fuzís dos pelotões que adentram Cravos vermelhos de um Abril tardio Que dão a cor e o mote de uma Revolução feliz Numa Lisboa a por termo a um tempo vazio Refeita em esperança por si, por nós, pelo país. Aquela mulher como que enfrenta aqueles homens todos a chegar Com seus cravos da cor do sangue não derramado entre irmãos Que ali à vista deles, irremediavelmente poderiam se matar Porém confraternizam todos e vão acabar por dar as mãos. Quem será esta mulher de resolução tão certa? Que eternizada está por seus gestos bem marcantes. Acalmou a incerteza. Tornou a cidade aberta. Tornando todos irmãos naquela hora, como eram dantes. Pois que com a magia que estava no ar, Aquela florista de Abril, da verdade, e do povo Sem nada dizer, sem nada pleitear... Trouxe a primavera à Portugal de novo.





                           

Celeste Caeiro, de 79 anos, foi a mulher que fez do cravo o símbolo do 25 de abril de 1974. Trinta e nove anos depois, "Celeste dos cravos" - como é conhecida - recorda um dos momentos mais marcantes da sua vida."  JN. 25/4/13- " Não tem explicação!"


quinta-feira, 24 de abril de 2014

PAY IT FORWARD !



Movimento em cadeia...


A idéia é muito antiga, creio mesmo que perde-se nas brumas do tempo. A primeira vez que foi registrada foi há mais de dois mil anos atrás, Menader na sua comédia O resmungão -Diskolos- no original grego, que até ganhou um prêmio em 317 a.C em Atenas, assinalou esta idéia de fazermos o bem a alguém não querendo nada em troca, referimos pay it forward, pague a alguém adiante, vale dizer retribua, retribua a outrem. A comédia de Menander esteve perdida parcialmente até ser republicada integralmente em 1957, o que não impediu a muitos outros de pensarem segundo esta lógica, como há vários registros históricos desde a rainha Santa Isabel, e Benjamin Franklin conforme está em suas biografias, até milhares de anônimos que sentiram e agiram assim desta maneira. 


O brilhante nesta idéia é estabelecer um movimento em cadeia que tem um efeito multiplicador fantástico, que bem empregado pode propiciar muita coisa boa, levando o Bem a muitos lugares e a muitas pessoas, e que se cristaliza na ideia de Lily Hardy Hammond (1916) Você não devolve o amor, você o dá mais adiante, que em inglês tem uma lógica redonda dizendo-se assim: «You don't pay love back, you pay it forward.»

Os norte-americanos têm absorvido  bem a idéia e a propagado, numa acepção calvinista bem a seu molde, até que Catherine Ryan Hide escreveu o livro que Leslie Dixon roteirou gerando o filme lançado em 2000 com Kevin Spacey e Haley Joel Osment, o menino ator de 12 anos então, que tem uma impressionante interpretação no filme, e que traz a idéia descrita no cartaz:" When someone does you a great favor, don't pay it back, pay it forward." Esta idéia cresceu até que a própria Catherine Hide fundou uma fundação em São Luis Obispo na Califórnia, com os direitos da expressão que lhe dá título registrados em 2013, e estabeleceu o dia 24 de Abril como o dia mundial do movimento em cadeia, o " Pay it forward day", estabelecendo um movimento mundial com ações já em 65 países, que se repetiram em 24/4/2014 com a ambição de gerar 3 milhões de ações de gentileza em todo o mundo neste dia. Uma boa lembrança e uma boa perspectiva.

No Brasil o movimento tem um site interessante, infelizmente em inglês e com dificuldades para 'log in', e com uma página no Facebook, também em ingês, e que já tem quase 7.500 'likes'. Em Portugal chama-se «Favores em Cadeia» tem página no Facebook e já conta com quase 2500 'likes'. Claro que nos países de língua inglesa tem prosperado mais - Canadá, África do Sul, Austrália e Grã Bretanha - são os exemplos mais fortes. Há também um 'website' oficial do movimento, que é no fundo a fundação da Sra. Hide por detrás. O importante é a intenção do movimento e a virtuosidade da idéia.

Este sentimento de ajudar é muito grande, felizmente, no mundo inteiro. Quantas instituições fabulosas dedicam suas energias, e muitos milhões de horas de trabalho, de milhões de pessoas, a fazer o Bem? Com maior ou menor êxito, com maior ou menor atividade, com mais ou menos efetividade, mais ou menos elitista, não importa,  entidades como A Cruz Vermelha ou O Crescente Vermelho, os clubes de solidariedade como o Rotary e Lions, outras como os Médicos sem fronteiras, e milhares de outras entidades, religiosas e não, que prestam assistência, apoio e caridade pelo mundo fora. No nosso mundo luso-brasileiro temos que destacar as Santas Casas da Misericódia, instituição multi-secular nos dois lados do atlântico, com imenso serviço prestado nos dois países.

Agora que surgiu este movimento a nível mundial com esta idéia magnífica que em inglês se expressa na expressão título deste artigo, e que é uma ideia que, quero acreditar, é bem ao gosto de Deus, e que tem no seu bojo vários princípios adoráveis: «Fazer o Bem sem olhar a quem.», «Não deixe que a sua mão direita saiba o que a esquerda faz.», « Dar de si, sem pensar em si.» e ao inverso: «Não faça ao próximo o que não queres que façam a ti mesmo» etc... etc... e que, com dia marcado, procura estimular as pessoas a serem generosas, procure você também exercitar este sentimento e estabeleça um movimento em cadeia, voluntarize-se numa das muitas instituições que merecem algumas horas de seu trabalho, e lembrando-se de quantos o ajudaram nesta vida... Retribua a outrem, Pay it forward!






quinta-feira, 17 de abril de 2014

Uma vida com Gabriel Garcia Marques.


                                                   
                                                                                                                                 falecido a 17/4/14
As palavras ficam.


Quando fomos todos viver em Macondo
Por causa desta prosa envenenada
Minha'lma ficou doente e tudo caiu redondo
Já que não havia remédio que sarasse nada

Era tudo uma febre, um frenesim, uma tensão
Já não eram canções, era uma marcha ou era um hino
A abraçar por inteiro a nossa solidão
Eu, menino doido, mais doido fiquei, e, creio, ainda mais menino,
Daquelas palavras, daquela gente, daquela situação

Foi tudo tão rápido, tão estranho, mas tão espontâneo
Que nos aprisionou de forma pura
Passamos mesmo nesta vida incauta a querer um sucedâneo,
Se não fôssemos morrer da cura

Sem remédio ou coisas iguais
Andamos uns certos tempos meio carentes
Depois acostumamo-nos, e fomos levados a outros locais
E conhecemos outras verdades menos atraentes
Fosse o que fosse, fosse do Gabo, queríamos mais...

Passada uma vida ainda queremos, e como queremos
Desfrutar desta salutar confusão
Porém bem sabemos que não mais teremos
Nos chegou assim essa conclusão

Os dias não esticam...
Não foi um fim, não será um fim,
Ainda me habitam.
Mas tem um gosto ruim, muito ruim
Mas as palavras ficam.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Chaplin.




Conversa com Carlitos.

                                                                       16/4/1889 -16/4/2014 125 anos do nascimento
                                   

        Sabes? Tu marcastes o século...
        Este XX em que vivestes por três quartéis.
        Transformando-te no seu régulo
        Dentre tantos menestréis

Pela magia de tua arte
Não só 'a Nova York', como a Kula Lumpur ou Roma
Toda a gente a adorar-te
Numa contagem em que só se soma.

        Porque nos tocastes no que temos de mais humano
        E por isto permaneces em nossos corações
        Num teatro que nunca baixa o pano
        E que transuda forte todas as emoções

Aquela sueter que deixas desfazer para não decepcionar a cega.
Aquele momento em que cais dentro do bumbo.
O Ditador a desejar o mundo
Toda a devoção que o amigo nega
E, é claro o eterno vagabundo.

       Na máquina de fazer sonhar
       Que dominastes como ninguém
       Podem passar séculos a voar
       Para substituir-te não se encontrará quem.




       

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Roma é então Frankfurt, Bruxelas ou Washington.





Roma locusta est, Causa finita est.

Estas palavras que são um adensamento apocopado da ideia agostiniana de que após ter falado Roma, a Sé, nada mais se poderá pleitear, pois que o assunto estaria encerrado, têm uma interpretação restrita no caso, e hierárquica também, que tem servido ao longo de muitos séculos para defender que após a autoridade máxima ter-se manifestado, o assunto estará encerrado. Com o passar dos tempos crivou-se a forma adulterada.

Quem se dedicou a leitura do "De excidio urbis" e do "De civitate Dei" sabe que esta era uma defesa apaixonada, e como tal facciosa, numa época de trancisão e de queda do Império. Portanto sempre haverão outras indicações para além daquela que expressa tão somente.

Quando o secretário de Estado disse o que era, e que viria (virá) a ser  mas não deveria, ou deveria, ter dito, ficou dito o que ficou dito e revelou-se, logo depois, que era aquilo mesmo e que não há nenhuma dissimulação que possa esconder a verdade, pois que esta, cedo ou tarde, tarde ou cedo, vem ao de cima. E não fugindo a regra, as declarações do Sr.Leite Martins sobre a contribuição especial de solidariedade e sobre a reforma do modelo do cálculo das pensões, com seu corte passando a permanente, disseram  o que ficou dito e que eram o que virá a ser. O secretário estava a dizer a verdade, como logo ficou evidente.

Ato contínuo já tendo dito o que dito ficou, não repetiria, nem negaria e citando a expressão agostiniana alterada, quis por termo ao assunto, como pensam alguns, por ter já falado sobre o mesmo o primeiro ministro português, destarte, então, ter-se-ia encerrado o assunto, o que justificaria a citação latina, o que é, como veremos, um grande equívoco de interpretação do que realmente disse o secretário de Estado, tendo este dito a verdade uma e outra vez.

A citação adequada era aquela: Roma falou, assunto encerrado. Só que Roma, no caso, e na afirmação do bem informado secretário de Estado, é, como se verificará logo a seguir, Frankfurt, sede do BCE; ou Bruxelas, sede de Comissão Europeia; ou Washington, sede do FMI ou as três mais certamente. Logo mais acertada ainda a citação posto que se tratava mesmo de uma cidade, ou de três melhor dizendo, em que não sendo Roma são as sedes do poder ao qual está, como bem tem em mente o Sr. secretário de Estado, Portugal sujeito. As vezes nem sempre o que parece, é, mas sempre aquilo que é, parece!



Comemorações dos 40 anos do 25 de Abril.

                                                       
               
                                                                 



A sensação de asco generalizada pela exclusão dos «capitães» das comemorações do 25 de Abril na Assembleia da República portuguesa na passagem de seus quarenta anos, fez-se notar em todos os que foram questionados sobre a mesma. A não participação dos militares de Abril na comemoração de sua Revolução, imposta pelo desconforto do atual  governo em conceder-lhes a palavra e de sua não aceitação em participar sem fazerem uso dela, é um reflexo da covardia e falta de inteireza de aceitar, em qualquer situação, críticas, e ouvi-las  resignadamente, mais que tudo porque o Direito de discordar é da essência da democracia em seu exercício pleno.

Há mais de três semanas a propósito de uma foto que a Associação 25 de Abril pediu-me para constar da exposição que irá fazer comemorativa dos quarenta anos da sua revolução, comentava com uma pergunta : Será que irão comemorar o 25 de Abril sem os do 25 de Abril? a possível ausência dos militares nas comemorações oficiais da data da Revolução dos cravos. Terminava afirmando que, com a cara de pau do costume, iriam excluir os «capitães» para livrarem-se de ouvir as duras críticas que estes têm sobre a atual situação do país. Não deu outra, foram excluídos! Não sem um episódio agravante propiciado pela falta de elevação da atual presidente da instituição que recebe as comemorações. Tudo somado foi a patética exposição das chagas de comportamentos pouco democráticos e maniqueístas.

Pensei em comentar o final da história, com sua atitude, por todos os  motivos deplorável, de terem optado pela exclusão. Havia fortes razões para tal artigo, como: 1. A Assembleia da República é a casa do povo e, consequentemente, o local onde comemorar a liberdade reconquistada por este povo. 2. Os que não podem faltar são, evidentemente, aqueles que propiciaram o que se comemorará. 3. Agrava a situação a força da data- 40 anos. 4. Aumenta a solenidade a presença dos que são os seus autores. 5. O ponderável de ser, a ultima oportunidade, quase certamente com suas faculdades plenas, de participação dos principais atores nas muitas e longas comemorações da data (Não estarão no centenário, estarão muito velhos no cinquentenário, se estiverem vivos, logo não poderiam faltar nestes quarenta anos.) a deplorar não estarem presentes por incompreensível. Recusei-me a comentar movido pela repulsa que me causou a decisão. Achei que a notícia por si mesma era suficientemente forte em causar a indignação geral, e que qualquer comentário seria excessivo.

O que ora faz-me pegar da pena é que este sentimento não era só meu, não é só meu. Todas as pessoas que perguntadas, de qualquer quadrante político, ou mesmo sem uma atividade política, ou, ainda, mesmo o cidadão anônimo, foram unânimes em demonstrar seu asco, sua repulsa, quem sabe seu desconsolo, ou, mais forte ainda, sua indignação, por esta decisão. Mesmo fugindo à resposta, até mesmo pela violência da mesma, ou que a mesma requer, sendo mister reprovar o governo e os partidos que o sustenta, seu asco, desta ou daquela forma, ficou patente, como, bem penso, não podia deixar  de ser, exceção feita aos que não têm dignidade, e se permitem não ter sentido crítico frente a comportamento tão pequenino.

Uma vez confrontado com a inescusável obrigação de comentar a sensação que se generalizou em toda a sociedade portuguesa, que num crescendo vem patenteando o intolerável da exclusão dos «capitães» fico-me somente pelo registro, posto que a sensação que a todos nós invade é suficientemente eloquente para que devamos acrescentar seja lá o que for.






domingo, 13 de abril de 2014

Elyseo Visconti Cavalleiro.






Vou morrer com esta saudade!


Só soube hoje, foi a onze de Março próximo passado, esta mania de ler os jornais com atraso, notícia de capa da Folha Ilustrada de doze, tendo em destaque a foto do Elyseo com a Payard-Bolex na mão a filmar, este que era o momento mágico em sua vida, e depoimentos da atriz Helena Ignez, que termina relembrando a casa da Siqueira Campos, na verdade três apartamentos juntos que o avô Elyseo deixara, e as reuniões com o Rogério Sganzerla e com o Júlio Bressane , o maior amigo de Elyseo.

Minhas lembranças mais fortes são outras, de outra cidade, de outro contesto, mas da mesma pessoa: o cineasta Elyseo Visconti Cavalleiro, meu querido amigo, de quem eu não me consegui despedir. E que, informa ainda a folha,  morreu de complicações da doença que ele «estimou», o diabetes e que fez-me ser seu amigo nos últimos vinte e oito anos, dos quais passei mais de quinze sem vê-lo, tendo-o visto quase diariamente nos outros doze. A cidade era Teresópolis, onde ele tinha sua casa de veraneio, porém a este tempo veraniava o ano inteiro, preferia estar em Tere, que no Rio, queria desenhar, pintar, escrever e tratar-se. Fazendo uma dieta rigorosa que controlava o diabetes, exercícios, longas caminhadas e boa alimentação, mantinha-se bem de saúde física e mental. 

Quem o conhecesse assim na primeira impressão, Pitoca, de seu apelido familiar, parecia meio maluco, porque tinha o hábito de falar das coisas, as realidades e a cultura do Brasil, como se fosse matéria do conhecimento do interlocutor. Entrava direto no assunto sem nenhum preâmbuo, falando ligeiro, muita vez acelerado, com sua característica florida, terminando por reafirmar a conclusão torcendo a mão e fazendo um espocar, como um foguete que chia e explode em beleza. Havia concluído a discussão, havíamos chegado a um consenso, e, este merecia ser o remate da conversa, que para ficar bem demarcado era repetido com um crescer de voz, uma parada súbita e um sorrisinho  e/ou arregalar de olhos expressivo, muita vez acompanhado de um gesto, tudo para enfatizar e sublinhar a conclusão da longa discussão, quase sempre das coisas do Brasil que o fascinavam. Tinha sido um espectador privilegiado em muitas delas, pelas amizades familiares. pelo envolvimento ou pelo trabalho de cineasta, onde ressalta o Brasil cabloco do documentarista, fazendo parelha com o Brasil surrealista do criador, já que Elyseo não só realizava e dirigia seus filmes, como os produzia e filmava também, às vezes como câmera-man.

Era um gosto ir lá na sua casinha, próxima a Rodoviária de Teresópolis, relembrar estes fatos e discutir com ele as múltiplas relações que de tudo isto advinham, na verdade com isto ele estava me tirando ao trabalho, sabia, porém achava que eu trabalhava demais, e era verdade, tinha neste tempo em Teresópolis um multi-usos, como se diz agora, misto de Bar-restaurante, mercado, antiquário, galeria, loja de decorações e carpintaria, onde procurava ganhar a minha vida. Começaram pelo mercadinho as visitas do Elyseo. Tinha uma secção de produtos sem agrotóxicos e esta era uma de suas preocupações alimentares. Como tinha também o Antiquário e a Galeria de arte, estabeleci com vários artistas um sistema de trocas. Pagavam o que consumiam ( no mercado, no Bar, no retaurante e às vezes no Antiquário) com obras de arte suas, ou outras. Assim tive dezenas de artistas ao redor do núcleo que construíra em Teresópolis na Rua Manoel José Lebrão, ocupando mais de dez mil metros quadrados das e nas minhas loucuras, como podem imaginar não tinha tempo para me coçar. Porém a uma determinada hora lá vinha o Elyseo em sua bicicleta, em tronco nu ou de camiseta, quase sempre de bermuda, visitar-me, interrompendo os trabalhos do dia. Começava de mansinho dando qualquer notícia nova, pespegava-se num caso, e em algo (um livro, uma gravura, um desenho seu ou familiar, filho de pai, mãe, avô e avó, artistas, entre eles dos maiores do Brasil, um artigo, um cartaz de filme, uma fotografia) e aí começava nossa charla que se desenvolvia por horas, interrompida, muitas vezes, pelos clientes que tinha de atender.A partir daquele elemento que ele trazia para me tentar, por exemplo 'une étampe japonais' como ele gostaria de frisar, das muitas centenas que o seu avô, Elyseo Visconti, havia adquirido na exposição de Paris que as deu a conhecer ao mundo, e foi com elas e com a arte tribal que nasceria a Arte Moderna, e íamos nós discutir a relevância, a importância, o contexto, daquela gravura, dias depois era outra, no dia seguinte um livro, noutro uma foto, e assim por diante, sei que devo bastante da formulação da minha inquietação cultural ao Elyseo. Ele não tinha praticamente outro amigo na cidade, não que não fosse sociável, o era e muito, é que ninguém entendia do que ele falava, portanto não tinha com quem falar. 

Elyseo era um tipo engraçado, cheio de histórias, elétrico, bom amigo, ainda hoje sei que recebi um telefonema (anônimo) que ele mandou alguém me dar para informar-me de algo de muito grave que se passava em Teresópolis, quando eu estava na Galícia, que fez-me não voltar ao Brasil, não queria sofrer, nem fazer inguém sofrer, resolvi as coisas de outra maneira. Ele podia ter-me telefonado, ele próprio, teve o recato, logo ele tão terra a terra, de fazer-se anônimo ao me informar, mas não fugiu a condição de amigo ao fazê-lo. Era assim com suas histórias, às vezes ele era uma personagem delas e se sabia enquadrar como se fosse  um de seus artistas a contracenar no acontecido. 

Dentre as muitas, a que eu considero mais expressiva para reproduzir aqui, é a do festival em Minas que envolveu várias cidades e no qual participou com o Lobisomem: O terror da meia noite de 1974, que são seis latas de filmes que podem ser projetadas aleatoriamente. Os filmes longos, muitas vezes, estão em várias latas, que guardam as bobinas, que seguem uma sequência, 1, 2, 3, 4, e assim por diante, é a sequência do filme. Elyseo fez este filme que não importava a sequência, em qualquer uma estava uma alegoria diferente (era como se fosse outro filme) e podiam, como disse, ser projetadas em qualquer sequência. Contava a história de uma família que vivia num ônibus abandonado, e que tinha hábitos noturnos, o que dá razão ao título. Claro que um espectador, com este título, acredita que aparecerá um lobisomem, e nisto o cartaz que o apresentava ajudava, pois  tinha o lobisomem desenhado a escorrer sangue, claro que a expectativa era ver um filme de terror, onde apareceria o dito lobisomem. Numa cidadesinha do interior de Minas Gerais, com apresentação de estreia, e com o tal cartaz pendurado à porta, a expectativa foi grande e encheu o cinema. Começa o filme passa-se a história da família, continua, vão se trocando as bobinas e nada de lobisomem, vai caminhando para o fim, e a espera do lobisomem atinge um clímax, acaba o filme, sem lobisomem bem entendido, e os espectadores, sentindo-se defraudados, quebram o cinema todo! Grandes críticas, o nome de Elyseo sai em todos os jornais, é considerado maldito, o circuito comercial diz que Deus o livre de apresentar semelhante filme. Ficam as seis latas por testemunho. Elyseo no intuito de preservar todo seu patrimônio artístico como cineasta, foi a Portugal, ao ANIM, e lá depositou os seus celuloides, que tinha em Teresópolis por ser mais fresco, mas que sempre corria o risco de incendiarem-se num dia de calor, foram para Portugal, porque o Brasil não dispunha de ambiente onde os conservar. Na cinemateca de Lisboa estão guardados para a posteridade, onde um dia, quem sabe, se recordará o meu amigo Elyseo com uma sessão do Lobisomem, numa projeção aleatória e, talvez, aí, então, entenderão esta criatividade ímpar que se chamou Elyseo Visconti Cavalleiro. 

Há três anos voltei ao Brasil, após doze anos ausente na Europa, queria muito rever meus bons amigos, muitos do tempo de Teresópolis, como Paulo Rabello de Castro, Ivan Lins, Angelo Rietti, Aluisio Gavazzoni entre outros, e Elyseo Visconti Cavalleiro, meu amigo Pitoca. Tendo ido duas vezes à casa da Siqueira e uma à de Tere, não o consegui encontrar, ficar-me-á esta saudade para sempre.



Puro Dadá :
                      É com sabor
                      Com desamor
                      Rubor e fulgor
                      E le Cabaret, le Cabaret, le Cabaret
                      VOLTAIRE
                      Sem senso
                      Dissensos e contrassensos
                      Pura intenção
                      Com amor e sem pão
                      Que sabe-se da coisa mais louca
                      E sabe a toca que brota, soa, é oca:
                     "O pensamento se faz na boca."
                "Na boca" !!!














Treze de Abril.





Beijos curtos
Beijos longos
Beijos na mão
Beijos no rosto
Ou com outro gosto
Beijos de ocasião
Sempre Beijos
Fogo posto
Beijos tímidos
Bitoquinhas
Beijos húmidos
Beijos com arte
Beijos sim
Beijos não
Beijos em toda parte
Beijos de sucção
Dia do Beijo...
Porque não?

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Dívida impagável.





Dizem que a dívida não é  sustentável. A dívida é sustentabilíssima ! Aliás é autofágica. E cresce de si mesma. A possibilidade de pagá-la é que não é. Já que vai carecer de muito esforço, muitas manobras, muito trabalho, muito sofrimento, e, quem sabe, muita miséria.

A menos que Portugal encontre petróleo, um pré Sal, ou Minas de Ouro como as do rei Salomão ou de diamantes como as da África do Sul, não tem saída para pagar esta monstruosa dívida em menos de um século. É isto que ninguém diz. Começou-se agora por falar em 25 a 30 anos com um crescimento anual na casa dos 4%, o que nunca houve nem há, só com um pré Sal, ou com as tais minas, para atingir os níveis de crescimento capazes de pagar as dívidas, conforme o que está pactuado para estas dívidas soberanas na Europa. Tudo isto é uma falácia que compromete o futuro, inviabiliza o presente e desgraça cada um e todos os portugueses.

Desgraça todos e cada um individualmente porque sem futuro todos, inclusive os autores desta situação miserável, ficam numa condição de instabilidade. E o que é isto? Podem estar cheios de dinheiro, podem ter os melhores empregos, mas terão um país instável. Pensarão alguns: Que bem lhes importa, vão viajar. Pode até ser, mas pode acontecer que um filho ou um neto sofra um atentado à sua vida, um assalto, uma qualquer desgraça, porque a situação como está, entre outras coisas, vai descambar nisto. Ficamos todos sob risco.

Do que nos fala o manifesto dos 74, que agora irá a Assembléia da República para discussão, é da necessidade de reextruturação imprescindível, o que é incontornável. O que falta falar é como, dentro da realidade portuguesa, fazer crescer a economia do país para dar espaço à vida cotidiana, inclusive a necessidade de investimentos, banida por uma pauta de juros proibitiva e pela  necessidade de pagamentos incomportáveis com sua atual riqueza.

E o que falta falar se é o mais complicado, é, ao mesmo tempo, o mais importante, pois só com um plano nacional, com medidas governamentais de incentivo, com motivação de toda a gente e rumos bem estabelecidos é que poder-se-á sair deste buraco. A própria Grécia vai tomando consciência disto. O que falta principalmente em Portugal é uma liderança política, alguém que todas as semanas diga ao país o que se deva ir fazendo, para que se possa, por um lado, reconstruir muito do que foi destruído pela ação da crise somada a estupidez da solução que encontraram para ela; e, por outro lado, possa construir progressivamente opções de futuro compatíveis com as inclinações e as características da economia do país, bem como do próprio país como espaço desta construção.

Enquanto não se tomar consciência que esta dívida nestes termos é impagável e, portanto, que  têm de ser alterados os termos como está negociada, no interesse de credores e devedores, para viabilizá-la, dando condições de Portugal crescer para a poder pagar entre outras coisas. Sem esta tomada de consciência, sem as condições de crescimento e sem estarem alteradas as formas de pagamento, esta dívida se tornará cada vez mais opressiva e impagável. 

Aristides de Sousa Mendes - nos 60 anos de sua morte.






«Qui sauve une vie, sauve un monde»

Em Viena, na primeira foto vê-se que é no bairro 22, Bezirk, Donaucity. Em Lisboa é em Telheiras, Carnide; no Porto no Nevogilde; em Coimbra onde viveu não há, e devia haver; no Rio de Janeiro não há uma rua com seu nome, pois ninguém o conhece. Em Bordeaux seu busto está na Esplanada Charles-de-Gaulle, tem seu nome em rua e numa escola, fotos acima. Porém em Portugal, seu país natal, o mais sintomático, passados hoje exatos sessenta anos de sua morte, é que seja com pouco destaque (o que denota pouco orgulho) que se lhe preservem a memória.

Entre as dezenas de milhares de almas que salvou do holocausto, curiosamente se encontravam Dali e Gala, e Robert Motgomery, o ator de Hollywood. Não teríamos tido o cowboy nem o maravilhoso pintor surrealista, sem a ação de Aristides. A conta disto passou privações, foi a sopa dos pobres em Lisboa, contou seus tostões para manter a sua numerosa família. Como uma praga bíblica, bem ao gosto dos judeus que salvava, estava conspurcado em seu país pelo ato que fizera. Insurgira-se contra a toda poderosa Alemanha nazi, e comprometera a neutralidade portuguesa, salvara tanta gente, mas pagaria o preço. 

Justo entre as nações. Quantos podem ser chamados assim? O Cônsul Aristides fora confrontado com o momento histórico e não fugira de dar a resposta mister, única resposta a qual um homem de bem não se furtaria e à qual um crente não se podia furtar. Num momento em que milhões foram testados, e, como ratos, meteram-se em seus buracos amedrontados, Aristides respondia com dar vistos até a exaustão, para salvar todos que pode salvar. Justo entre os Justos, não temeu o desafio.


O que distingue os homens não é sua aparência física, esta até os iguala, não é sua riqueza, esta até os diminui, não são suas vestes, estas até os normatizam, não são suas intenções, estas até são boas. O que distingue os homens é sua capacidade de fazer, mesmo quando não se os acreditem capazes disto, ou, para além de todas as possibilidades, não poderiam ter feito, o que deve ser feito.












Fernando Pessoa: Eterno!





Pessoa fest.

                     Aconteceu em Oslo. E é uma maravilha!  Chama-se Uroens bokhandel! É uma livraria. E deu esta festa para abrir portas. Um sonho de um jovem escritor norueguês chamado Christian Kjelstrup. E nos diz como é importante ter espaço para poder sonhar, e que as imponderáveis econômicas são secundárias, e que a pobreza é a coisa mais feia deste mundo. Lembra-nos num mundo onde há falta dele em muitas mesas, de que' Nem só de pão vive o homem'.


                     Tudo isto faz-nos lembrar um outro que era também Christian, deste mesmo Reino na época de seu nascimento, e hoje mundialmente conhecido, Andersen era seu  nome de família, sua profissão era contador de histórias, e que histórias, e com que força, e com que graça que todos as recontamos pelos anos fora. Ter o sonho como profissão é muito lindo. Já este Christian, Kjelstrup de seu apelido, de seus sonhos literários nada sei, mas este sonho de sua vida de abrir uma livraria - samba de uma nota só, que só vende exclusivamente um e somente um livro, é uma maravilha. Maravilha que só uma sociedade rica pode-se dar ao luxo de concretizar. Por isto a pobreza e todas as suas limitações são as coisas mais feias do mundo. Quando se aborta um sonho o mundo fica mais cinzento!

Thereses gate, 14, Oslo.


                     Este sonho, coloridíssimo sonho, entretanto nasce da convicção, que é também a minha, de que o livro do desassossego de Fernando Pessoa é o melhor livro jamais escrito, e, por isto esta livraria só vende este livro. Um único livro. E, portanto se chama como o livro. Isto diz-nos que um só livro pode preencher o mundo. Esta ideia é redentora porque como há muitos mais livros, temos um mundo cheio de maravilhas. Então porque ficarmos-nos pelas ninharias? Na verdade esta é a livraria do sossego. Sossega a nossa alma  saber de coisas assim. E, é claro, só podia ser Pessoa.


                     A só existência deste sonho, por breve que possa durar,  faz-nos, a todos, maiores.

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quarta-feira, 2 de abril de 2014

CARLOS DO CARMO, fado.



Eis que é como o vinho

                                                                                          Aos seus 51 anos de sucesso.

O Carmo da Lúcília não cai
Pode a Trindade talvez
Já que um vem,  a outra vai,
E se repete uma e outra vez.

É a voz que alegra o povo
E o bairro alto, mais alto fica ainda
Então vai: Canta de novo...
E a gaivota voa ainda mais alto e mais linda.

Desta luz fez-se sua sina
De seu cantar sempre a propósito, nunca à toa !
Tornado-a mais moça e mais menina
Quando nos canta Lisboa.

E onde é sempre Primavera
Na tua alma e na minha
Pois que nos revive esta quimera
Mesmo que morra a andorinha

No som de sua voz as canoas encontram rumo
Os putos aprendem a ser homens, pois nunca é tarde
Passa o Cacilheiro,vem a Varina, voa a Pomba Branca à prumo,
E o luar amanhece para que sua voz nos guarde.

Há quem chora, e há quem ri
E assim concita e conclama a todos nós
E se cumpre como proclamava Ary
Pois seu cantar tem o Sol dentro da voz

Então a palavra inescrutável
Do berço em que foi nado,
Eis que talvez ele não fosse viável
Se não cantasse o fado.





terça-feira, 1 de abril de 2014

Do crime preterintencional.




da série Toda praxe é estúpida.


 

Quando a ação ultrapassa a vontade do agente, ou seja quando o resultado da ação do agente ultrapassa a sua intenção, esta ação é dita  preterintencional, vale dizer que vai além de sua intenção criminosa ou dolosa,porque acontece para além dos limites desta.

O clássico exemplo é do assassinato do ladrão de galinhas que trepou na mangueira. A história passa-se assim: Ouvindo ruídos em seu quintal, com especial agitação em seu galinheiro, a dona da casa acorda o marido de seu sono profundo, avisando-lhe que estão sendo roubados. Entrementes o ladrão que realmente estava a furtar umas galinhas, se apercebendo do movimento e luz na casa, trepa para a mangueira existente junto ao galinheiro, esconde-se entre a ramagem desta. O marido levantado-se a contragosto, para satisfazer as solicitações insistentes da mulher pega a espingarda e dá um tiro para o ar, tiro que, coincidentemente, vai colher na direção da mangueira o 'ladrão' empuleirado nela, atingindo-o  mortalmente. No dia seguinte acordam com um cadáver estendido no quintal.

Pois esta categotria de crime excluída de muitos códigos criminais em diversos países, soi acontecer, inclusive com alguma frequência. A sua não intencionalidade não o exclui de ser crime, os fatos da ocorrência é que irão agravar ou atenuar a pena, consoante a gravidade de sua manifestação.

O caso da praxe, ouso afirmar que foi o que se passou, pois vai ficando mais evidente à cada dia, se tudo se passou como a imprensa nos informa, na praia do Meco, teve contornos óbvios de preterintencionalidade, se é crime, é nesta categoria que se há de enquadrar, uma vez que não se imagina, nem se acredita que o 'dux' sobrevivente, teve qualquer intenção de ferir ou atingir as vítimas em número de seis. Entretanto tendo se passado a infeliz ocorrência como a mídia vem demonstrando, não deve ter havido acidente, porque, em sendo como se relata, criaram-se as condições para ter havido crime. Este, certamente, para além de toda a intenção, mas não deixará de ser crime.

Por esta razão afirmei insistentemente que: TODA PRAXE É ESTÚPIDA!