quarta-feira, 26 de outubro de 2022

CENTENÁRIO DE DARCY RIBEIRO - O HOMEM QUE QUERIA SER DEUS.

Neste vinte e seis de Outubro de 2022, o Professor Darcy Ribeiro faria cem anos. Seria um século de bons serviços ao Brasil, como pensador mais que tudo, mas como homem de campo, antropólogo, sociólogo, cientista humano, historiador. Mas nunca podemos excluir o criador cultural, o educador e o político, atuando da Universidade, desde a que criou, a de Brasília, até a escola primária que criamos muitas, atividade à qual Darcy se dedicou também com muito empenho. Eu que fui muito perto da família do índio cor-de-rosa, o Noel Nutels, esse genial médico judeu ucraniano/pernanbucano, que foi o precursor da FUNAI, antes Serviço de Proteção aos Índios, que se casou com a mãe do meu amigo Salomão, Elisa Tratchemberg, o que me levou também a aproximar-me dos irmãos Vilas-Boas, tudo gente com um sentimento de civilismo, civilidade, coragem e decência, que já não há, e que pra com os índios, que são tutelados do Estado brasileiro, é imprescindível. E eles foram empurrados para a exclusão e a morte, nessa sua minoridade política, por falta de gente que os defendesse, o que percebemos com antecipação, o que os levou a participação ativa na vida política, tendo começado com uma ideia do Darcy, quando fomos candidatos no Rio de janeiro em 1982, tendo ele convocado um cacique Xavante para o feito, Mário Juruna, que foi eleito com expressiva votação. Esse centenário do Darcy, faz-me voltar a velhas convicções, tão necessárias hoje, como esquecidas, faz-me voltar a sentimentos de gente ímpar, com capacidades e empenhos que são difíceis de encontrar - lembro-me da casa circular que o Prof. Darcy construiu em Maricá, sua oca, sua aldeia, num último preito aos selvagens que amou tanto. Se o Brasil tivesse vergonha na cara a casa já era Museu, sem terem-na deixado degradar tanto, e tendo preservado suas coleções. Faz-me voltar aos Brizolões, essa ideia do Darcy para que as criança pobres, sem apoio, para que fossem levadas para um ambiente são, onde fosse alimentada, instruída, cuidada. A Criança entrava de manhã, tpmava seu café, tinha as aulas, como nas outras escolas, almoçavam, tinham extenso currícilo de atividades COMPLEMENTARES pela tarde, desde o esporto à biblioteca, passando pelo cinema, atividades lúdicas, assistência médica, jogos, etcetera, etcetera, e faziam um lanche reforçado, para que, se não tivessem o de comer em casa, estarem bem. Um conceito moderno de educação e ensino, que tirava as crianças do mau ambiente da favela, e abria-lhes alargados horizontes educacionais. Foi um passo de gigante no ensino básico. Tudo issso faz-me voltar à FUNAI, ao Museu do Índio no Maracanã, a São Cristovão, o palácio que tinha as maiores e fabulosas coleções... Faz-me voltar a Amazônia, que eu aprendi a amar nas minhas pesquisas entomológicas e ambientais, faz-me voltar a me sentir gente, quando vivemos cada vez mais num mundo de bestas. As ideias e palavras do Darcy. E quando lhe perguntaram em campanha o que ele gostaria de ser se não fosse o pensador, o antropólogo, o político, sua pronta resposta, com toda a sinceridade assustou toda gente, e ajudou a perdermos a eleição: "Queria ser Deus, poder criar as coisas, fazer um mundo melhor." E, é claro, ninguém entendeu, e choveram as críticas. Caro Darcy, aqui fica nesta forma improvisada e abrupta, minha saudade e meu respeito, lembro-me de quando ligava para tua casa para falarmos, quando eu coordenava suas publicações de campanha a Governador, e você atendia: "Sou eu", ou "É de minha casa.". Uma personalidade singular e intensa, peculiar e com imensa graça, que, tolamente, o povo do Rio de Janeiro não escolheu para seu Governador, tendo recaído a escolha no pior que podia haver. Mas a política é assim, as mentiras uma fraude, a desinformação uma angústia, para quem deseja o progresso social. Cante aí em cima seu Daro Wihã, dance seu Kuarup, pois que há mais festa na alma, que as misérias da política, como você costumava dizer: "JÁ VENCEMOS PORQUE NÃO ESTAMOS DO OUTRO LADO".

sábado, 15 de outubro de 2022

Das eternas cartas portuguesas.

Na senda de uma tradição mais que tri-centenária, desde quando Claude Barbin em 1669 publicara a tradução francesa, em idioma que as três Marias também utilizaram, de cinco cartas de amor de uma mulher, uma Mariana, como as Marianas que também evocam essas três Marias, agora por pura obstinação estética, e revolta em seu tempo. Aquelas são cinco cartas que desde o tempo de Luís XIV seguem revelando uma sensibilidade, um grito, aquele emitido desde um claustro, mas que na mesma sensibilidade da mulher, e com a razão, a mais expressiva de todas, o amor. 'Ut ego amo te amo''Amor me ad vos', um desejo singelo, um Direito mesmo, tão reprimido, tão esmagado, que a sua só revelação é um escândalo, mas é junto, uma expressão sublime de beleza que muda o caminho da literatura por existirem aquelas cinco cartas, e em existir se resume muita vez a razão perene de que as coisas sejam de um modo e não de outro, assim como existem essas novas cartas.

Assim como existem também essas três Marias suas autoras, a Teresa, a Velho, e a Isabel, duas que nos deixaram, mas das quais ficaram seus gritos, uníssonos com a outra, a Maria Teresa que segue guardando o testemunho, no mesmo tom, como o daquele grito da Mariana Alcoforado, a anônima, que a partir de seu claustro, o fez ecoar pelo mundo fora, e que, pela sua força e beleza, permanece e permanecerá. É como no registo sentimental de Wainewright quando afirma que "A Arte tocou o seu trânsfuga; pelas suas influências elevadas e puras se purgaram os miasmas fétidos; os meus sentimentos ressequidos, fogosos e crestados, foram renovados por uma efloração fria e fresca, simples e bela para um coração singelo." Melhor definição não poderá haver para o efeito. Porém para a Alcoforado eram apenas seus sentimentos latejantes, já paras as Marianas das três Marias e as suas palavras, foram um exercício para um tempo miasmático em si mesmo, em que o antigo regime se decompunha, e cuja comiseração que nos inspira, hoje histórica, era já prenúncio do "…dia inicial inteiro e limpo…" como o quis Sophia, mas de cuja "noite e do silêncio" uns já se tinham aventurado sair.

São suas cartas, as do XVII, que, assim como as novas, portuguesas ambas, revelam a magia do tempo, cada qual de per si, neste lapso temporal de três séculos entre ambas, assim como existe um sentimento de mulher que cumpre seu desígnio, assim como há forças que se lhe opõem, haverá sempre a expressão desse sentimento que, feminino, vem revelar, quem sabe?, "O lugar comum" como queria a Maria do meio em um dos seus primeiro trabalhos publicados, essa Velho, que com a força de sua escrita marcou seu tempo. Ave Maria de Fátima de Bivar Velho da Costa! Essa que esconde geralmente o nome de sua santa, uma Nossa Senhora, a mais portuguesa de todas as Nossas Senhoras.

Ou quererá a outra o mesmo, a da santa que poderá ser a d'Ávila, a de Lisieux, preferida no diminutivo, a dos Andes, Edith Stein, a judia, ou a santa do último dia de Abril, a de Calcutá, para também nos libertar? Não importa, haverá sempre uma "Minha Senhora de Mim" a nos dar "Educação Sentimental" Ave Maria Teresa de Mascarenhas Horta Barros!

Como ficará para sempre em nós a memória da também Maria que primeiro nos deixou, a do nome dessa santa portuguesa que foi rainha, certamente a mais portuguesa das santas, que n'"A Condição da Mulher Portuguesa", marcou a "Crônica do tempo" sendo um d'"Os sensos Incomuns", esse, de sua época, que, como mulher, recusou-se a ficar n'"As Vésperas esquecidas" fazendo-se presente, expressando sua totalidade na plenitude de sua existência que nunca terminará. Ave Maria Isabel Barreno de Faria Martins!

AS NOVAS CARTAS.

O texto, marcante texto de coragem e ousadia, sobretudo em sua época, traz-nos as muitas Marianas, transgressoras, ou trânsfugas, como quereria Wainewright, suas faces femininas emergentes do Universo reprimido da mulher, hoje alcandoradas pela ousadia, como sempre foram alcoforadas, como pressagiava o apelido da primeira Mariana, aromatizadas por seus sentimentos, mas não incensadas por seu amor, como aquele, o que, verdadeiro, buscou a fórmula epistolar para expressar-se, e cuja "beleza da forma" encantou Barbin, e que na história da literatura manteve-se, após o longo eclipse diegético da fórmula, vivo na alma de muitas Marianas e Marias.

Que Deus abençoe a todas.

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

"Como el musguito en la piedra..."

Em respeito a Violeta Parra e Mercedes Sosa, mestras do sonho. Mesmo em pedra dura As coisas que são tenazes À mínima fissura Põem lá suas raízes. Há sempre uma outra dimensão, se não fosse assim, eramos lixo, ou eramos apenas pedra, dura e sem valor, mas a outra dimensão nos abre a porta do infinito, e nos torna melhor, porque conseguimos sentir, porque conseguimos sonhar. Em nós, para além de nós, esta impossibilidade constante tornada possível, pela simples razão de irmos além, de nos lançarmos face ao infinito, na medida em que nos acreditamos ser maiores que as misérias, maiores que as circunstâncias, maiores que as necessidades, voltados ao infinito em todas as suas dimensões. Em Itaipu, Niterói. Nunca esquecerei a promessa. Lutava contra a destruição da Laguna de Itaipu, loteada pela Veplan-Residência, lotes sub-aquáticos, na busca do puro lucro, a querendo transformar em um monte de ilhotas com mansões de milionários em cada uma. Nada contra os milionários, nem contra suas mansões, mas não ali, ali não. A laguna de Itaipu é um criadouro natural de peixes, não podia ser destruída para gozo de esportes náuticos e habitação de uns poucos. Tinha dezessete anos. Dava uma entrevista à beira da laguna, à Folha de São Paulo, um dos poucos jornais que compraria essa briga contra o imobiliário. E alguns anos depois me foi dito, um pouco em forma de afirmação: "A vida, o trabalho, os compromissos, nunca mais se faz a revolução... Não é?" foram as palavras. E eu respondi, comigo só quando eu estiver morto. Mas a gente morre de vários outros modos além do físico, eu talvez não soubesse, mas mantive a promessa de nunca desistir, nunca abandonar a causa da Natureza e dos excluídos, passado meio século ainda estou nisso, e espero morrer lutando. Mas para isso há sempre que se voltar aos dezessete. "VOLVER A LOS DIECISIETE" Porém aos dezessete é de maneira diversa dos 67 e não é, pois para quem luta com convicção, a luta é a mesma, a energia é a mesma, só não é a resposta do corpo desgastado, mas a maior sabedoria compensa isto um bocado. Tudo depende dependerá sempre da opção de vida, e da promessa. "Brotando" Santo Tomás de Aquino dizia que "a santidade se renova a cada dia". Digo eu que assim como a sede e a fome têm que ser saciadas a cada dia, para que vivamos, toda nossa obra também tem de ser guarnecida todos os dias, provendo-lhe o necessário para que se mantenha, ou irá ruir, uma vez que é frágil e imperfeita, posto que obra humana. Assim é o que se passa com a democracia, obra humana feita de ideias e ideais, mas que se mantém viva e ativa, como corpo material e social, na medida em que se realiza, mas que muitas das forças da matéria e da sociedade, com interesses egoísticos, autocráticos, populistas, enganadores, contra o que é mundano e verdadeiramente burguês e popular, atacam-na todos as horas. Carece de nossa ação e vigilância para que se mantenha viva, posto que a democracia é muito frágil e necessita de nossa ação para que se renove e sustenha-se a todos e a cada dia. Como uma planta, a Democracia tem de crescer para se renovar, como o "musguito" que vive o dessafio constante de brotar, e brotar sempre, para resultar e ser efetivo, assim como o amor e a santidade que se não se renovarem, desvanecem, morrem e desaparecem. "Como el musguito en la piedra, Ay, ay si si si" Se entendemos e concordamos que é assim, o que devemos fazer? Sim sim sim, como o musgo na pedra, brotarmos! Mas como se brota? Velando, como a uma criança pequena de quem cuidamos a cada hora, e vigiamos para que não sofra nenhum dano. Velando os sonhos, as expectativas, os valores, mesmo o amor, verdades muito fáceis de serem corrompidas ou destruidas, se não cuidarmos. Para isso falamos, atuamos, participamos, prevenimos, e mais que tudo expressamos nossa convicção, que, como nosso amor que vai tocar o coração do ente amado, nossa convicção vai inundar a sociedade com toda a certeza, e vai espalhar a força da verdade, para que ela prevaleça ante tudo que seja engano ou mentira, e seja nossa solidariedade, para que ela bloqueie o que quer que haja de egoísmo, de tirânico ou de autoritarismo, posto que esse mundo é de todos e de cada um, e temos que preservá-lo, todos e cada um. Essa é uma ação que exige repetição e persistência, como "el musguito en la piedra". É dificil, eu sei, é cansativo, pois é, lembremos, e tinha de ser um poeta, Gonçalves Dias, na sua "Canção do Tamoio" quando diz. " A vida é luta renhida que aos fracos abate, e aos fortes só faz exaltar." e vá brotando, brotando... Em respeito a Violeta Parra e Mercedes Sosa, . mestras do sonho. . As coisas que são tenazes . Quando mesmo em pedra dura . À mínima fissura . Põem lá suas raízes. Há sempre uma outra dimensão, se não fosse assim, éramos lixo, ou éramos apenas pedra, dura e sem valor, mas uma outra dimensão nos abre a porta do infinito, e nos torna melhor, porque conseguimos sentir, porque conseguimos sonhar. Em nós, para além de nós, esta impossibilidade constante tornada possível, pela simples razão de irmos além, de nos lançarmos face ao infinito, na medida em que acreditamos ser maiores que as misérias, maiores que as circunstâncias, maiores que as necessidades, e voltados ao infinito em todas suas dimensões. Em Itaipu, Niterói. Nunca esquecerei a promessa. Lutava contra a destruição da Laguna de Itaipu, loteada pela Veplan-Residência, lotes sub-aquáticos, na busca do lucro rápido, a querendo transformar em um monte de ilhotas com mansões de milionários em cada uma. Nada contra os milionários, nem contra suas mansões, mas não ali, ali não. A laguna de Itaipu é um criadouro natural de peixes, não podia ser destruído para gozo de esportes náuticos e habitação de uns poucos. Tinha dezessete anos. Dava uma entrevista à beira da laguna, à Folha d São Paulo, um dos poucos jornais que compraria essa briga contra o imobiliário. E alguns anos depois me foi dito um pouco em forma de afirmação: "A vida, o trabalho, os compromissos, nunca mais se faz a revolução…" foram essas as palavras. E eu respondi: Comigo, só morto. Bem que tentaram. Mas a gente morre de vários outros modos além do físico, eu talvez não soubesse, mas mantive a promessa de nunca desistir, nunca abandonar a causa da Natureza e dos excluídos, passado meio século ainda estou nisso, e espero morrer lutando. Mas para isso há sempre que se voltar aos dezessete. "VOLVER A LOS DIECISIETE" Porém aos dezessete é de maneira diversa dos 67, e não é, pois para quem luta com convicção, a luta é a mesma, a energia é a mesma, só não é a resposta do corpo desgastado, mas a maior sabedoria compensa este handicap. Tudo depende da opção, e da promessa. "Brotando" Santo Tomás de Aquino dizia que "a santidade se renova a cada dia". Digo eu que assim como a sede e a fome têm que ser saciada a cada dia, para que vivamos; toda nossa obra também tem de ser guarnecida todos os dias, provendo-lhe o necessário para que se mantenha, ou irá ruir, uma vez que é frágil e imperfeita, posto que obra humana. Assim é o que se passa com a democracia, obra humana feita de ideias, mas que se mantém viva e ativa como corpo material e social, na medida em que se realiza, mas que muitas das forças da matéria e da sociedade, com interesses egoísticos, autocráticos, populistas, enganadores, contra o que é mundano e verdadeiramente burguês e popular, a atacam todos as horas. Carece pois de nossa ação e vigilância para que se mantenha viva, posto que a democracia é muito frágil e necessita de nossa ação para que se renove e sustenha-se todos e a cada dia. Como uma planta, a Democracia tem de crescer para se renovar, como o "musguito" que vive o dessafio constante de brotar, e brotar sempre, para resultar e ser efetivo, assim como o amor e a santidade que se não se renovarem, desvanecem.  "Como el musguito en la piedra, Ay, ay si si si" Se entendemos e concordamos que é assim, o que devemos fazer? Sim sim sim, como o musgo na pedra, brotarmos! Mas como se brota? Velando pelos nossos valores, como fazemos a uma criança pequena de quem cuidamos a cada hora, e vigiamos para que não sofra nenhum dano. Para isso falamos, atuamos, participamos, prevenimos, e mais que tudo expressamos nossa convicção, que, como nosso amor, irá tocar o coração do ente amado, nossa convicção irá inundar a sociedade de certeza, vai espalhar a força da verdade, para que ela prevaleça ante tudo de engano ou mentira, e nossa solidariedade alastrar-se-á, para que ela bloqueie o que quer que haja de egoísmo, de tirânico ou de autoritarismo, posto que esse mundo é de todos e de cada um, e temos que preservá-lo, todos, e cada um. É difícil, eu sei, é cansativo, pois é. Lembremos, e tinha de ser um poeta, de Gonçalves Dias, na sua "Canção do Tamoio" quando diz. " A vida é luta renhida que as fracos abate, e aos fortes só faz exaltar." e vá brotando, brotando…

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

À BUSCA DA REALIDADE PARALELA - I.

COISAS COM AS QUAIS CONCORDARÁ CERTAMENTE: A- Tão bom se nossos sonhos fossem todos verdade. Pudessemos concretizar os mais irrealizáveis delírios, que de imagináveis se realizariam pela só ação de nossa vontade. Querer é poder, entretanto (I) só se pode o que é possível. B- À tudo que acreditamos ser de um determinado modo, costuma sempre se apresentar alternativa diferente da que escolhemos, e, para além de nossa vontade, existe outra opção, ao menos uma, posto que (II) tudo tem seu oposto, e também seu obstrutor. C- Cabe-nos sempre fazer escolhas, e baseados nelas tomamos muitíssimas decisões todos os dias, muitas vezes sem nos darmos conta, será mesmo assim? Esse processo de muitas possibilidades são as respostas, sempre as mesmas, à muitíssimas situações e fenômenos, sempre os mesmos, que atuam como variáveis invariáveis, e nos enganamos tantas vezes. Mas (III) fazemos sempre nossas escolhas, pelo menos assim o cremos. NO MUNDO DA MENTIRA. Dentro de nossa dualidade indesvencilhável, e tendo esses três pontos determinantes em vista, dividimos essa análise filosófica, sociológica, científica e artística em três partes correspondentes, e, face a impossibilidade de apresentar os diferentes prismas num mesmo único texto sem acabar por ser confuso, com reflexos de uns altercando com os de outros, assim o dividimos também em três, na intenção da proposta. Sendo que temos o propósito de analisar tendências que se verificam em tudo que existe, e nos confrontam quase sempre com perspectivas muito inesperadas, desde as que a ciência nos vai propondo ao estudarmos os diferentes fenômenos, posto que todos e cada um admitem sempre outra possibilidade de entendimento e interpretação, logo outra conclusão, portanto esta a razão de que Ciência se faz com comprovação da ocorrência do fenômeno em sua igual e fiel repetição, verificando-se este sempre de igual forma, posto que nas mesmas situações-condições, quando repetidas, dá-se o mesmo fenômeno, e deste modo o comprova e explica. Isto não elimina a realidade paralela, só determina a realidade que encontramos em determinadas condições; até às coisas mais banais com as quais lidamos, e para as quais somos muitas vezes convocados a acreditar em narrativas difrentes das da 'realidade', que é ao que chamamos mais simplesmente mentira, e que tem muita utilidade àqueles que as tentam impingir como uma realidade diversa da que ocorreu, e com uma interpretação distinta da ocorrente. Ante a realidade, e com ela cnfrontada, a mentira é anti-ciência, é anti-realidade, anti-arte, anti-normalidade, por mais que grasse como verdade, e seja aceita ou desejada, por só algum tempo que seja. A mentira em si mesma não é realidade paralela, já a sua crença, acreditar nela, é. Sendo isso que permite as tentativas das crianças em propô-las quando um acontecimento não lhes agrada, e mentem inocentemente, na mais singela alteração da realidade, até o que fazem os abjetos desavergonhados como Trump, Boris, Bolsonaro, que, do mesmo modo mentem, mas que pretendem que suas sucessivas mentiras acabem por se impor, e se transformem em realidade, a paralela que traçaram, como possíveis verdades para interpretarem o mundo a seu talante. Entretanto para a maioria que empregue tal opção, a de criar uma realidade paralela, logo verá prontamente dissolvida suas afirmações, lembrem-se da Máxiam de Lincoln (a), (apesar de que por outro lado a capacidade de convencimento desempenhe função muito distintiva em cada caso) eis pois o exemplo dos advogados às barras dos tribunais, se forem confontados com factos provados, logo vêm sua peroração diminuída, ou anulada, o que não os impede de tentar fazê-la prevalecer, até por fé de ofício que seja. E temos ainda esses que têm representatividade mais alargada, eleitos que foram, que, ao criarem essas pseudo-realidades, puras mentiras, as conseguem imputar como alternativa à realidade, tão somente pelo arbítrio que lhes é possível, este alvedrio que é afeto só aos que tem poder, grande poder, o de influênciar pessoas. Entretanto analisando o comprtamento dos humanos, verifica-se que há uma tendência universal para a mistificação, por isso mentimos tanto, e é de tal forma essa tendência, que se vai generalizando como recurso de resposta (uma solução de recurso para poder responder) para toda e qualquer situação indesejada, seja em que campo for, exceto o científico, onde os fatos têm de ser comprovados, em todos os outros campos da atividade humana se vêm ampliando a criação de universos alternativos ao gosto do gerador dessas múltiplas versões, mesmo no campo jurídico, que por princípio segue norma homóloga a da ciência, está legalmente autorizada, e vem prevalecendo tantas vezes a mistificação. (a) "É possível enganar algumas pessoas todo o tempo; é também possível enganar todas as pessoas por algum tempo; o que não é possível é enganar todas as pessoas todo o tempo" (Abraham Lincoln - February 12, 1809 - April 15, 1865) 1. SÓ SE PODE O QUE É POSSÍVEL? A ideia, muito utilizada, de que se algo não significa nada, não existe, é a grande peta, posto que tudo é significante, mesmo o que não alcançamos, ignoremos, ou desconheçamos. O significado é que pode não ser o desejado, ou o sentido não ser o pretendido, ou mesmo não ter a importância ou eco esperado, o que em nada diminui, muito menos anula, sua existência e significação (b). Nosso grande problema é que queremos que as coisas sejam segundo nossa ótica, e, mais grave ainda, que tenham representatividade e peso no tal significado entendido-pretendido, mas as coisas não são assim. As coisas são por si mesmas. (b) Uma coisa poderá ter significante e não significado, já o oposto é impossível. Uma árvore que nasceu, é apenas uma árvore, sem entender sua razão, seu porque, terá funções determinadas (seu Determinismo certamente), mas a razão de sua existência é sincopada num infinito de realidades que não são suas, apesar de lhes serem correlatas, todas e cada uma. Assim é com a maoiria das coisas e conosco. Nossa insistência em lhe atribuirmos, à árvore, como à tudo, um sentido, uma razão, um significado, dirá de sua retidão, se assim crescer, ou, se não, de sua tortura. Dirá de sua utilidade, de suas qualidades todas, adjetivos múltiplos que por infinitos estudos, na busca de inúmeras significâncias, realizamos; trajetória infinita da cultura. Entretanto a árvore, antes de tudo, é tão somente a árvore, para além de qualquer questionamento ou suposição. A interpretação nossa, de todas e cada uma das qualidades que se lhes atribuirmos, é nossa, e só nossa; o que não acrescenta nem retira nada à árvore, que continuará a ser tão somente árvore, como é, independentemente de tudo que lhe venhamos a considerar, e atribuir, ou não. Aqui se impacientará meu erudito leitor afirmando:'Mas ela tem características próprias, umas dão frutos comestíveis, outras não, as árvores...' Peço a Vossa infinita capacidade de compreensão, de que todas as 'características' que tenha reconhecido a árvore, em qualquer árvore, como em qualquer coisa que observe ou estude, são interpretações Vossas, que, como disse, nada acrescenta ou retira ao objeto estudado, que, nesse caso elencado, continuará sendo apenas árvore, independentemente do que possamos lhe querer imputar. Uma árvore é uma árvore, uma árvore, uma árvore, tudo o mais é conosco. Coníferas para obter celulose, as macieiras para se ter maçãs, como não pode ser de outro modo. As coisas são o que são por si mesmas, classifiquemo-las, ou não, é tão somente nosso juizo. Encararmos o caracol. Temos de entrar em sua concha para o vermos cara-a-cara! O caracol não será menos caracol por se encapsular, nem mais por jogar a defesa, é sempre e apenas caracol. Entretanto o passar do tempo, as experiências vividas, o atrito com a realidade, foi generalizando respostas, das mais efetivas, às muitas e diversa situações que se apresentaram. E, como a reação animal é geneticamente determiada ao longo de sua evolução, e o comportamento aprendido, especialmente nos animais superiores como os primatas, portanto há muito pouco espaço de manobra para a invenção ou a experimentação, essas já foram todas feitas e incorporadas, ou, as que não resultaram, rejeitadas. O que não elimina eventuais ocorrências nihilistas, que provocam respostas diferentes das costumeiras e esperadas. E com tudo isso, com o esperado e o inesperado, se criaram muitas estruturas de mecanismos responsivos, que a inteligência humana agrega em diferentes campos, sob diversas perspectivas, criando as mais díspares áreas da cultura, como fez com quase tudo que estudou, onde, saído o caracol de sua concha, revela tudo o que conseguiremos entender da realidade, nua e crua, uma vez assim exposta. DA CONVERSÃO E O ESTABELECIMENTO DO PARALELISMO. Temos porém que existem conceitos que não são transversais a tudo que existe, como a vida e a inexorável morte, comum a todos, porém há outros que são conceitos exclusivos de entendimentos particulares, alguns intelectualizados, o que no entanto pode ser obra de pura ficção, e que nos lança mesmo na realidade paralela, muito para além de nós e nossas possibilidades. Com isso temos implicações originais de várias ordens: => => => De ordem sentimental. A realidade nos inspira energias e emoções muito próprias, que obtêm diferentes respostas, consoantes nosso entendimento e percepção do que ocorre. Entretanto para despertarem nossas emoções passam pelo filtro dos sentidos, esses cinco elementos enganadores que nos desassocia da própria relidade, posto que oferecem-na já adulterada pelo sentido que a captou, ou pela combinação dos vários que assim procederam, criando pois realidade adulterada, ou mesmo alternativa. Ademais nos ocorre muita vez també intuir a realidade, através do que ficou conhecido como sexto sentido, que modifica significante e significado a um só tempo. Temos pois que a realidade é orgânica, já sua narrativa é conceitual. Esta constatação nos leva a um cabuloso conceito jurídico e de investigação criminal, o do testemunho ocular, no qual qualquer pessoa ao afirmar seja o que for, distorce o que viu, por isso o questionamento deve restringir-se aos fatos, e se o conhecimento destes vier de uma narrativa, quase sempre serã desprezados. Porque nossos sentidos nos enganam muita vez. => => => De Ordem Ética - tida como Moral. No âmbito das coisas, que são todas infinitamente interpretáveis, há alterações de perspectiva que se dão por conversão, posto que mantendo a mesma matéria, sofrem profundas mudanças na forma e/ou qualidade como a interpretamos. Esse processo altera o costume, esse a que estamos geralmente afetos, e, convertidos, os apreciaremos diversamente. Olhem um pouco para a História e verão que muito do que se acreditava de um modo, logo passou a ser doutro com a mudança ds costumes, e muito do que era proibido, passou a ser aceito, mesmo até desejado e louvado, e vice-versa, somos pois circunstâncias do tempo. Como verificamos o problema da Humanidade é a adjetivação particular que cada um de seus grupos componentes faz das coisas, tornando-as interditas aos outros que as percebem diferentemente - fonte de conflito - segmentando as perspectivas, para quem as têm, em diferentes porções de gente que à mesma substância atribui formas e qualidades outras. Desse modo os costumes são adjetivados de bons, àqueles que entendemos como os nossos - sãos, úteis, meritórios, bons enfim - sendo os demais o oposto por princípio. Os bons costumes, irmão siamês dos bons modos, os quais muitos tentam impôr ambos pela força e não pela conversão, com o evoluir de sua imposição por que via fôr, tornam-se convenção, que de pacto, e acordo inicial, aquilo que é geralmente admitido, torna-se obrigação, imposição, resvalando de sua função civilizadora, para a de encargo ou ônus. Cabe aqui avaliar as expressões que definem esses critérios: O que será bons modos? Quais são, por exemplo, os trajos ditos menores? Essa ideia abstrata que norteia tanta legislação restritiva. Reflitam sobre isso. Abandonado o âmbito da ética, original e filosófica, mergulha-se fundo no da moral, que imaterial, e muitas vezes não instintiva, pressupõe regras estrictas, logo de pré-conceitos, que preconceituosas logo se verificam, tendo abandonado a amplitude de entendimento de seus conceitos originais, para o restricto âmbito da regra. Perdidos nesse emaranhado de interpretações, aqueles que não detêm as bases da perspectiva de conversão que levou à convenção vigente, tornam-se sensíveis à outra realidade, paralela que será. => => => De Ordem Religiosa. Como a doutrina religiosa compõe-se de preceitos morais, estes edifícios orgânicos da religião, acrescidos das suas particularidades de crença, formam suposta verdade absoluta, compartimentando o mundo, portanto as implicações dessa ordem são as que mais comumente geram fanáticos, religiosos e anti-religiosos, não admitindo outra qualquer interpretação. Eis pois o fim de linha da conversão, na fiel e plena vivência da realidade paralela. => => => De Ordem Jurídica. Para fugir à letra 'morta'(?) da Lei, há o humano que julga, e a jurispridência que se estabelece, gerando doutrina para além da Lei, esta é a realidade paralela no seu melhor, recriando e redirecionando a Ordem Jurídica. A dita correspondência, ou rciprocidade. => => => De Ordem Filosófica. Quanto ao entendimento de querer elevar nossos espíritos para lá dos falsos conceitos -adjetivação-, esse recai nas questões da Ordem Moral em quase todos os casos, já quanto a filosofia do conhecimento, esta é a única que escapa destas implicações convencionadas e assume a postura científica consistente da epistemologia. Aquilo que é moral é a realidade paralela do ético. => => => De Ordem Artística. Salvo esta corrente pós-moderna que pretende fazer a Arte, moral; toda as artes clamam por liberdade e transigência, quando não diretamente, através da mescla das possibilidades, exceção feita a marcial, sendo conceitualmente as artes mais desordem que ordem, logo em tudo atendem à realidade paralela, esta que cria e estabelece, abrindo as portas às possibilidades distintas que a sociedade, mor das vezes reacionária, geralmente rejeita. Certamente esta é a magia da Arte, de todas as artes. Advertência. Nunca esquecendo que na vida cultural nada é garantido convocar, para além de que não há espaços vazios, e que mesmo na busca de uma veradde alternativa, na realidade paralela que se busque, só se pode o que é possível, porque há restrições, mesmo ao ficcionado. E que, mais cedo que tarde, esta realidade criada logo se revelará como fraude, ou terá, entretanto geral aceitação. O que, no primeiro caso, não impedirá a muitos de a escolherem como sua verdade, e no segundo, de vir a tornar-se absoluta verdade.