sábado, 29 de abril de 2017

It's a matter of time . . .



Dump Trump!

            (Waiting for the impeachment.)

Trump, Trump is just a dump
Trump, Trump is just a dumb
Trump sucks, see the pump
Trump, the bumbling Trump 
. . . . is just a bump. 

3 requisitos para bem reinar.





Vocês não se enganem, António Costa é grau 18! Seu professor Marcelo Rebelo de Sousa apostou até, e lhe deu o grau 18 porque ele merecia. Agora a História se repete, só que com Marcelo como Presidente da República e com António Costa como Primeiro Ministro, a capacidade desse homem em fazer política, em cumprir objetivos, de alcançar metas é imensa, que ninguém se engane! E sabe escolher o time, o grupo que vai conseguir realizar os desígnios a que se propõe. Vejam o Centeno! Costa não é especialmente carismático, mas é especialmente cidadão e absurdamente político, e de um político espera-se que o seja, e, destarte, cumpra ao que se propõe, quantas voltas vai dar para isso não importa, importa é chegar e realizar os propósitos.

Quanto ao mais, a longa estrada de quatro décadas de atuação política já lhe mostrou perspectivas as mais diferentes das paisagens que vão passando quando se caminha. Portanto tem vária posturas, muitas de silêncio, para ir cumprindo seus compromissos e propostas. Sabe que não pode fazer tudo, mas que deve sempre fazer seu melhor. Quanto ao principal ruído discordante, sua principal resposta é deixa-lo se afogar em sua própria espuma, pois que sabe que só espuma de raiva quem não tem razão. Ademais, como tudo cansa, Pedro Passos Coelho e sua mesma repetida cantilena vazia, já cansou. A política é uma arte subtil que requer atitudes também subtis como resposta, e uma malícia no lidar com as situações que se vão apresentando, e que são sempre as mesmas: desequilíbrios e insatisfações, que têm de ser atendidas, e uma preocupação constante em não deixar de escolher o melhor caminho, caso que requer muita vigilância e empenho. No mais sabemos que há muitos malucos e desvairados, carentes e destemperados. Que devemos invariavelmente buscar tranquilizar os apetites insaciáveis, controlar os desejos e paixões inflamados, acalmar os imoderados, descomedidos e imodestos, bem como os estróinas, dissipadores ou esbanjadores.

Como falamos de História, lembrei-me de um homem inaugural como António Costa, D. João I, o grande Rei que inaugurou a segunda dinastia, assim como Costa inaugurou uma nova relação política, um novo tempo onde a cabeça do governo sabe que é a besta de maior carga, que é ele que, como um camelo, aguenta todo o peso, e é o que lhe cumpre. Assim mandou bordar um trajo com um camelo, e as três metas que pretendia cumprir como tal, os perigos que teria que ultrapassar, D. João tinha a noção que se deve buscar desígnios e tê-los em vista:
                                                                                                  1. Temor de mal reger.
                                                                                                  2. Contentar corações desvairados.
                                                                                                  3. Justiça com amor e temperança.
Foi o que D. João mandou bordar em seu traje.

Vejam bem que o tempo passa, temos seis séculos volvidos, mas as metas centrais não mudam, assim como a essência da natureza humana não muda, logo o fato que Costa mandará bordar tem as mesmas metas que D. João I escolheu há 600 anos, porque a besta de maior carga terá sempre que ter em atenção os mesmos pontos, porque governar exige essa arte, e é essa 'A arte de bem governar'.
                                                                         

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Mário Contumélias.


                                                                                            > Nem afrontas nem rapapés.<

Há gente que passa pela gente,
inesperadamente
como se não houvesse passar . . .
Gente que deixa seu sorriso,
sua alma,
seu apreço, e seu estar . . .
Assim fica esse momento,
no desalento,
quando deixam de passar.

Só soube hoje, foi no 13, deixou sua Ana, deixou sua sina, deixou sua rama, deixou a  menina, e os meandros que ele cantou. Deixou "O ofício das coisas", não mais vai ter "Conversas à Quinta-feira", nem essa, nem outras besteiras que nos entretecem a teia da existência. Deixou "Versinhos de brincar", "Uma mão cheia de histórias"que ninguém mais as saberá contar. E o Areias voltará para o deserto, lugar das areias?

Para muita gente será o escritor, o poeta, o jornalista,o Grande Reporter, o fabuloso letrista, o professor, para mim será apenas Mário, o homem que me ofereceu sua amizade tão despretensiosamente que aceitar seria quase um dever, dever de retribuição do gesto, da mão que se estendia, fosse noite, fosse dia, sua presta sensação.

Adeus Mário, até sempre!

Pós-capitalismo. . .




O The Guardian, essa instituição, muito para além de um jornal, traz-me a crônica intitulada: O fim do capitalismo já começou. Eu gostaria de desdobrar as considerações feitas pelo Sr. Paul Mason, o autor da crônica nas páginas do The Guardian, para que nós possamos discutir não só o tema, mas a indefectível realidade envolvente, que, em sua marcha, lentamente nos encaminha para o futuro, empurrando-nos para a sua nova realidade, estejamos preparados, ou não.

Eu devo de antemão confessar que não estou preparado, e que só estarei preparado se esse Pós-capitalismo quiser referenciar o Bem. Pois que o Capitalismo, que entendo como um mal que nos aprisionou a todos com a Revolução Industrial e seus desdobramentos, prisão absoluta porque abrangendo tudo e todos, apesar de clamorosas resistências, tendo sido a derradeira a albanesa, talvez, fato é que englobou todo o planeta e não há forma de viver que não seja em capitalismo.

Diz o jornal em seu preâmbulo de apresentação, verdade que por insuspeita que seja, está em processo, e nos convida à utopia. Vamos por partes, primeiro dou-lhes a apresentação do The Guardian em seu texto original: "Without us noticing, we are entering the postcapitalist era. At the heart of further change to come is information technology, new ways of working and the sharing economy. The old ways will take a long while to disappear, but it’s time to be utopian "


O qual para falarmos a mesma língua faço a tradução: "Sem que percebamos, estamos entrando na era pós-capitalista. No cerne da mudança futura está a tecnologia da informação, novas formas de trabalhar e partilhar a economia. Os velhos caminhos levam muito tempo para desaparecer, mas é hora de sermos utópicos."

Eu cá por mim sempre fui utópico, um utópico rematado, por exemplo sempre fui contra o capitalismo (Pode-se ser mais utópico nesses tempos que vivemos?). No que poderei ser contra o Pós-Capitalismo, enquanto sempre acreditei ser aquele, o Capitalismo, a quinta essência do mal, e seu reino ditatorial, os mercados, sua mão armada? Que poderei pensar da fase que o ultrapassa, e o faz segundo Mason na intenção de "reformatar o Capitalismo com novos valores e crenças" e "criar algo mais dinâmico do que o que existe"? Ou seja com as novas tecnologias teremos um capitalismo instantâneo, tão instantâneo que deixará de ser Capitalismo pela nova dinâmica alcançada, e assim seria mais justo porque atenderia aos anseios e propostas dos participantes. Eu desconfio!

O Homem sempre quis atender tão somente a interesses egoístas, logo imaginar que um equilíbrio pela manifestação instantânea desses interesses no âmbito do mercado irá criar uma justiça inusitada, pode parecer utópico demais para um seguidor de todas as utopias. Não que me sinta agrilhoado pelas forças da restrição às manifestações do egoísmo que foi o que sempre vimos, e essas forças reguladoras, coactoras, normatizadoras ou policiais, sempre falharam, nunca conseguiram regular ou restringir os mercados, que corroeram e destruíram toda ordem desejada. Talvez esse Pós-Capitalismo de que nos fala Mason seja algo bom, não que se desregule o pouco que tem ordem, não; mas que com a ação imediata do agente no mercado, esse se constitua em algo (um monstro como sempre) contido por suas próprias forças criadoras. É uma utopia, como é óbvio, mas ele nos convida a ela.

"Similia similibus curantur", assim como é do próprio veneno que se faz o antídoto, talvez isso possa resultar, quem sabe? Não que eu fique de coração leve, não fico, mas é fato que o que temos há dois séculos é, por si, a maior desgraça que a humanidade criou, e que sempre se foi agravando com as sucessivas revoluções industriais, e, agora com a quarta, é mesmo a desumanização, e, portanto. permanecer nela não é solução, portanto talvez já seja tempo da redenção.



NB: Seis dias depois o The Guardian repete a publicação da crônica do Sr. Masom. (27/4/2017)

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Revisitando Ema de Teresa Horta.




Ema é um nome trágico na literatura! Uma relação, uma pontuação, uma explicitação da incongruência existencial. Se fosse psicólogo desenvolveria aqui toda uma tese, e seria infeliz nesse proceder, porque veria conexões improváveis entre Emma Bovary e essa Ema que também é madame, mas sem apelido pelas artes e ofícios de Maria Teresa Horta, que diferentemente de Flaubert, não é Ema, a infeliz e assassina, Flaubert se confessou em Tribunal Emma Bovary, também infeliz e assassina como essa Ema, porém quem ela mata é a si mesmo, suicida, mulher na essência do tempo de subjugação, ser simbólico, ser paralelo numa esquizofrenia social machista onde desejos, gostos, preferências e intenções contam pouco, posto que numa sociedade salutar haveria espaço para todos, mas predominam espaços de exclusão, porque as Emas podem ser subtraídas de um contesto de representação, sendo anuláveis, sendo desprezíveis, até que se revoltem e matem.

Dentro de uma linha quase escolar, onde as mulheres são treinadas a vários níveis para aceitarem a subjugação, sendo o pior de todos os treinos o maternal, miséria recebida e transmitida em fé de ofício, gerando infelicidade, gerando assíncronias existências que só se resolvem com a morte ou com a sujeição plena, as Emas tornaram-se símbolos para além do literário, do realismo, do trágico, símbolos de uma temeridade: discordar do status quo!

Além de serem ambas adúlteras, signo marcado a ferrete para sua culpabilidade, as duas Emas, a de Maria Teresa Horta e a de Gustave Flaubert, divergem na interpretação de sua infelicidade por disparidade de temperamento, mas não fogem da repulsa social de seu tempo, que será a mesma de hoje ainda por incrível que pareça, e também com morte, seja com sangue a correr, seja com envenenamento, a solução lenta da ausência, da exclusão, seja com a vida-morte a que se sujeitam inúmeras Emas apetecidas por existirem como fêmeas da espécie, e nada mais; mas jamais por serem aceitas como mulher, no que possa representar essa condição à qual Teresa Horta dedicou sua vida para explicitar, e que Flaubert, num rasgo de criatividade literária inicial, cria, na trama da existência feminina, um escândalo de sua época, meados do XIX, e que se repete um século depois na pele de Teresa.

Poderá Teresa dizer que é Flaubert, não por esse ter sido Emma Bovary, mas porque teve a mesma pretensão literária de contestar seu tempo, e ambos consolidaram um tijolo na grande construção literária da sociedade, que pode ser também dita como a grande construção social da literatura, essa relação biunívoca entre a arte e a vida, que não se consagra em imitação, mas em pura interdependência intelectual, no que o termo explícita do espírito, esse que há por detrás de todas as coisas, e que faz delas sua manifestação, e que na mesma relação biunívoca é manifestação de todas as coisas, posto que tudo nos molda na mesma forja em que moldamos as coisas, e só pela aceitação e entendimento dessa relação deixaremos de ter Emas, e poderemos, eventualmente, descobrir sintonias de espírito a todos os níveis da sociedade, que permitam realizar os valores pelos quais postulam ao longo dos séculos gente com a visão, literária ou não, de Flaubert e Maria Teresa Horta.

Quanto mais tempo será mister para ultrapassarmos essa condição estreita das Emas que por enquanto ainda existem?

terça-feira, 18 de abril de 2017

Com uma cegonha na turbina.









A Companhia das Lezírias que desde que foi privatizada perdeu sua maior parte, área que era destinada ao plantio, e cumpria paralelamente suas funções ecológicas, pois a região é desde tempos imemoriais local de invernação e nidificação de muitas aves, tanto do norte da Europa como africanas, que, na sua maioria, dirigem-se à região para procriar, multiplicando-se ali o número de aves, pois se chegam duas, partirão quatro ou seis, ou mais, sendo portanto naquele ambiente muito particular, beira rio, no estuário do Tejo, estabelecido como zona de proteção especial (ZPE), que transforma-se num grande parque zoológico todas as primaveras com a arribação de inúmeras espécies que ali se congregam em grande número para cumprirem seu ciclo anual, sua proteção estando sujeita a acordos internacionais. Com a diminuição da área das lezírias devida à venda de grande parte destas áreas para finalidades de construção, um grande e antigo crime, os locais de procria e nidificação restringiram-se, havendo grande concentração de animais em área menor.


Montijo na zona de ingerência da ZPE, onde a  avifauna, que não lê mapas, penetra , e vê-se a todo instante grande número de animais por lá a sobrevoarem o aeroporto militar ora existente, que devido aos tipos de aviões que utiliza, não são aviões a jato, e à prudência estabelecida pelos militares em longo convívio com as muitas espécies migratórias e locais que ali vivem em diferentes épocas do ano, não ocorreu um acidente terrível envolvendo aviões e aves. São milhafres, perdizes-do-mar, milharangos e maçaricos, patos de várias espécies, marrecos e marrequinhas, narcejas, muitos tipos de corujas, enormes colhereiros, ibis de diversos tipos, corvos marinhos, gaivotas, gansos bravos, muitas pernas-vermelhas, gigantes flamingos e cegonhas; abibes, alfaiates, tartaranhões de muitos tipos, os passarinhos lá são muitos e de muitas espécies diferentes, pilritos de todos os tipos, as lindas alvéolas-brancas- enlutadas, ou não enlutadas, são tantos pássaros que seria fastidioso enumera-los. E é no meio disso tudo que o governo pretende fazer o novo aeroporto internacional de Lisboa, com imenso tráfico aéreo. Com a instalação ali de um aeroporto comercial, sua utilização irá jogar dezenas,  talvez centenas, de rotas para dentro da ZPE. Isso é insano, é de loucos!

O Estudo de impacto ambiental estimará o constante confronto que se vai estabelecer entre as aeronaves e as aves? Terá em conta o longo voo incerto das cegonhas? As revoadas dos flamingos?  Os bandos de patos rumando sul nas rotas dos aviões? E à noite o voo picado das corujas por toda parte onde houver caça, e nós sabemos que os aeroportos ficam infestados de ratos, quem deterá as corujas de lá irem caça-los? Ou preverá o impacto ambiental de imprevistos que surgirão aos milhares quando se põe um aeroporto dentro de um parque zoológico?

Um aeroporto e suas terras devem estar o mais distante possível de tudo que seja vivo, que se mexa com autonomia, que possa tomar um destino inesperado, criando o perigo imprevisto que gera o acidente fatal. Um aeroporto é uma mini-cidade com características muito especiais, sobretudo agora com o terrorismo, exige medidas de segurança muito rígidas, um aeroporto é uma pequena cidade com suas regras bem definidas, e com perigos múltiplos, uma iluminação diferente, um enorme movimento de gente e cargas, com acessos múltiplos e diversificados, atendendo às exigências aeroportuárias, seus terminais, suas populações especializadas, e com picos imprevistos de ocupação e acessos. Isso tudo junto de uma zona de proteção especial, que como o próprio nome indica, existe para ser protegida, especialmente protegida, não para ser perturbada e conturbada com a imensa pressão ambiental que representa um aeroporto. Só de pensar é de loucos, mas o governo não pensa, parece não ter entendimento. Se tivermos aeroporto no Montijo, verão que os aviões ainda acabam com uma cegonha na turbina.


domingo, 9 de abril de 2017

Preparação da Páscoa.




Celebração perene de comunhão,
Somos todos judeus nesses dias
Desde que Jesus entra em Jerusalém
Para a Pessach, a libertação do Egito, da escravidão
Nossa Páscoa, e a de Esters, de Saras e de Marias
As de Davids, de Moisés e de Golias, eternamente, Amém!
Da liberdade nunca calarão este grito
Que vive em nós, eterno e circunscrito ao coração
Esse que vê no judeu e no árabe, igualmente, o irmão.

domingo, 2 de abril de 2017

NO DIA SEGUINTE.




2 DE ABRIL.


FOI-SE O DIA DA MENTIRA
FIQUEI A AGUARDAR VERDADE
DAQUELA QUE SE ATIRA
COM TODA A SINCERIDADE

PREVALECERAM AS FALSIDADES
AS DE TODOS OS DIAS, AS DE TODA HORA
OBLÍQUAS IMPARIDADES
AS DE ONTEM COMO AS DE OUTRORA

NÃO IMPORTA QUE DIA FOR
É SEMPRE PRIMEIRO DE ABRIL
DESABROCHA SEMPRE A MESMA FLOR,
PRIMAVERA QUE JÁ SE VIU

DESEJO DE ENGANAR
FLORADAS DE MENTIRAS MIL
SEMPRE VOLTAMOS A ESTAR
NUM PRIMEIRO DE ABRIL . .



Ema. Maria Teresa Horta. Ema.







Como é.

                                                                                        "Dentro de mim mora um anjo
                                                                                          Que tem a boca pintada
                                                                                          Que tem as unhas pintadas
                                                                                          Que tem as asas pintadas...
                                                                                          Que passa horas a fio
                                                                                          No espelho do toucador.
                                                                                          Dentro de mim mora um anjo
                                                                                          Que me sufoca de amor."
                                                                                                        Sueli Costa musicada por Cacaso.



A fatalidade de ser mulher é uma condição excludente, vale dizer, é tornar-se um ser à parte, algo  diverso e único, algo como avis rara, razão do mistério de ser mulher, do mistério de toda a mulher, daquela nuvem envolvente que as cerca, as embala, e as traduz para além da realidade cotidiana, que inesperadamente podem promover um encontro absoluto, ou a expatriação total, em ambos os casos situação exclusiva, única e paralela, condicionante da qualidade de um entendimento metafísico, pleno e transcendental, para além do mistério da vida, para ao de lá da condição de existir, posto que existir traz a banalidade, enquanto penetrar a nuvem traz magia e surpresa, exclusiva condição da emoção.

A absoluta fatalidade desse sentimento, bem como desse desejo, manifestação incompleta de possibilidades infinitas e tradução inquietante, realidade difusa ao observador, confusa ao ator, e contusa a todos que penetrem a nuvem, ainda que ocasional ou displicentemente, porque cada anjo terá garras muito próprias e afiadas, que, pintadas ou não, cumprem sua lacerante função de serem reciprocidade ao peito que rasgam, ainda que involuntariamente, fatais como a vida, dilacerantes como a morte.

Entre a fatalidade relativa e a absoluta a mesma condição, projeção atroz da impossibilidade necessária, corrupio obsequioso de necessidades impossíveis, expectativa e realização, mas nunca afinal realidade pela constante presença da nuvem, essa intromissão e transcendência, essa disparidade.

Ema, como toda mulher, sempre prenunciou seu paralelismo, e nessa noção é hamletiana, ser e não ser, exclusão e pertinência, guardando aí dois opostos imanentes de uma mesma fonte oculta, não ser e ser, pertencer ou fugir, sempre a mesma contradição. Quando falava desse prenúncio disse abordando sua possibilidade:
                                Mas ser possível será bastante?


A resposta pessoana: “Baste a quem baste o que lhe basta O bastante de lhe bastar” indica a satisfação de alguns face a reação de outros, porém o possível indica a permanência da barreira que demarcava o limite até onde se ia, mesmo sendo ainda possível se ir mais longe para além, aquém estamos, rematando como o poeta  “A vida é breve a alma é vasta” denunciando o limite e o infinito além a que estamos expostos, ambos nessa dualidade existencial do corpo e da alma, a que dura e o que não dura, logo assincrônicos.

Então uma das Marias, a Teresa, volta ao eterno tema do feminino, se é que algum dia saiu dele, onde sua Ema, uma mulher paralela como prenuncia a capa com o pescoço longo da mulher modiglianesca, o cisne no lago, que ali não está só para ser contemplado, ali está porque existe, porque é, e geme, e mexe, e vive, não teme, é tema: Ema !

Uma face de mulher, mas não um perfil, um sentimento, uma emoção, uma presença poética, como não poderia deixar de ser. (Eu já havia comentado, e, aqui, repito, por pertinente.)



Mas quem é Ema? 

                                 Que ser presença não basta. Que nos virá dizer?


                                                                                                   "Nem só o que eu aparento
                                                                                                     Eu gosto,
                                                                                                     Nem tudo o que eu represento
                                                                                                     eu mostro,
                                                                                                     Existe a outra,
                                                                                                     Existe a outra . . ."
                                                                                                               Ivan Lins e Vitor Martins.

Tudo pode ser percebido se seguirmos as 152 perguntas do texto, atento a que este começa com uma pergunta, o que vem antes é uma circunstância e um estado d'alma que se irá repetir às páginas 19, 39, 67 e 87 (*): "Não entendo sabe?-Éramos duas, sabe?-Fusionam-se?-Aceite?-Que afeto conheci eu até hoje?-Que mãe me assistiu no parto?-mãe de que mãe?-estive a morrer, sabe?-Estou pronta, minha mãe?-Fascinava?-Matei?-Matei?-pelos limos?-Rosas, lembras-te?-dançando?-A esperança?-Quem é ela, afinal, para deste modo o afastar dos livros?-Segurança?-Comê-la?-Sabe a mãe?-Balança da infância?-Os dois conversando?-Sou estéril já lhe disse?-Quantas vezes lhe repeti isso?-Um trapo, um trapo, percebe?-resguardada?-defendida?-E eu? e eu?-Sabe o que é fecundidade?-Quantos minutos me darás dos teus cadernos, dos teus livros, dos teus jornais?-Que mal tem?-A quem deve então pedir auxílio?-A quem deverá pedir auxílio?- Nunca?-Cambaleia?-Cambaleia?-Quem mais a possuirá?-E quem não está suspenso do seu gosto?-Sou o centro do mundo vêem?-Esperança?-Porque não reparas em mim?-Quem sou eu afinal para te afastar os livros, dos teus jornais, do teu trabalho?-lembras-te?-Tens tudo o que desejas não?-Precisas de mais dinheiro?-Será possível que eu algum dia venha a ter quietude?-Será que vou ter descanso?-Acha que sou um monstro?-Me amasse?-se soubesse teria vindo?-Da minha mãe?-cambaleia?-Tudo o que?-Tudo?-Cambaleia?-A paz?-E tu?-Eu que?-Que mais será preciso?-mármore?-A mulher sorri?-Ladainha?-Mortal?-Duas?-Dos seios?-à risca?-Acha que eu sou um monstro?-Que crime?-Que fiz eu de mal?-Que mal é que eu fiz?-Porque desvias sempre os olhos da estátua no meio da praça?-Saberias o modo atento como eu gostava daquela mulher de pedra a dançar na sua alegria de pedra?-Excitam-me vês?-Não achas curioso como eu afinal consegui inverter os acontecimentos?- É a loucura, sim, mas que importa?-Que importa mais que o medo da expressão seu rosto, quando lhe entregar a filha?-Como é que lhe hei de explicar?-Um crime?-De tudo?-Que fogo apaguei dentro de mim e esqueci?-Que desejo escuso, cheio de mal?-Que ódio?-Porque não confessar que ele continuava a perturbar-me?-Acha que estou perdida?-Quantas vezes te disse que te odiava?-Nenhuma?-Cambaleia?-Morre-se de ódio?-De paixão?-(quantos?)-duas?-Acusador?-Teme, sempre temeu por si?-A sede?-Há séculos?-Que invenção reinvenção maior foi preciso para aguentar e aguentar o caminho dos dias, dos meses e dos anos?-Lembras-te?-Ou sei?- A carta foi uma vingança apenas?-Ou já o próprio crime no seu começo?-(empalidece?)-Hesita?-sabe quem escreveu aquela carta?-será isto que o juiz vai entender logo, que o matei?-De amor?-Liberdade condicional sabe o que é?-desse desejo de morte e da sua execução?-Como?-E você, não terá afinal medo de mim'-como posso eu amar um homem como tu?-Como?-Será que o meu pai te pagou para que casasses comigo?-mas afinal quem sou eu para te acordar, te tirar o repouso?-sua vaidade e sedas, não?-Faz parte da mulher ser louca, sabes?-Como internaram minha mãe, não é?-Destino?-O escritório dele ou o teu escritório, que diferença faz?-Considera que eu sou louca como a minha mãe?-Quem tocou nos meus livros?-Já reparou que são as mulheres que ao longo dos tempos têm escutado vozes?-Mulheres histéricas?-Sempre ouvimos vozes, todas, já alguma vez pensou nisso?-de sofrimento?-era?-E tu?-que fiz eu para sofrer tudo isso? -Todo este castigo este destino de desdita e de amargura sem fim?-Nojo entendes?-Será que mais alguma vez te verei mina irmã?-Uma voz?-Minha mãe?-como eu?-Acredita que possamos viver várias vezes a mesma vida?-Acredita?-Acredita?-Que importa?-porque me deixa partir?-Condenatório?-Uma vontade adiada?-Lembra-se daquele meu sonho em que eu criança matava com uma pistola um homem e o enterrava no chão de pedra da cave de meus pais?-Apenas uma substituição?-Já alguma vez te contei que o meu marido me havia ameaçado de internamento?-Quantas vezes já lhe falei do medo que tenho da loucura?-Quantas?" E que termina com uma pergunta, a do medo da loucura, expressão da condição de oprimida. São perguntas que tudo respondem.





Legítima defesa da sanidade.


Vita Sackville-West, musa e amante de Virginia Woolf, tinha uma defesa para seus pensamentos, toda mulher a devia ter, para poderem resistir às invasões constantes, invasões vorazes, predadoras, impostoras. Ema não sabe o que fazer, tenta um amante, tenta fugir, fugir para onde? (página 103*) Tenta aceitar, tenta calar, tenta entender, mas existe a outra . . . Cada mulher é todas as mulheres dentro de si num universo à parte, uma nação à parte, outra tribo que canta e dança amargurada. Mesmo em suas alegrias há imensa tristeza.

A narrativa de Ema segue um relato para a psicanálise, e ocorre em multi-temporalidade, uma multi-temporalidade intercalar, que por fim gera atemporalidade, mesmo estando claro que desenvolve-se nos princípios do século XX pelo décor das cenas, o tempo torna-se difuso, nebuloso, onde tudo realmente se passa mas só Ema o sabe e intui, nada se passa, aceitando tudo inclusive ver-se diante de si, confrontando a realidade das mulheres de todos os tempos, passados (pág 126*) e futuros (pág 127*), uma condição, é verdade, mas uma manifestação sísmica, terremoto, furacão, maremoto (pág 136*), onde as banalidades da vida são tão intensas, - lágrimas, medos, dores, náuseas, vômitos - essas coisas tão femininas e tão eloquentes. 

Ema não se conseguindo defender, defender-se-á totalmente, Ema mata!



Uma razão.



Anseio e ânsia, fios condutores de uma realidade incontornável para além das perguntas que demarcam tudo, há também umas quantas afirmações que também o fazem, revelando uma postura, desvendando situações subliminares, aquém da consciência e prenhe de odores, sabores, pudores, horrores, amores irrealizados, desamores, sensações entrecortadas, e Ema condena-nos a todos! Vestir-se-á o vestido preto que torna-se branco, duas formas de luto, o da alma e o do corpo: "Esta mulher é louca... - Cale-se! - Olham-na por um segundo... - Nunca tive prazer com ele, nem com homem nenhum aliás. - Ela detesta isso porque lhe dói. - ...mordedura de víbora... - Não vais aguentar o parto. - ...segurar... - ...duas mulheres que se afastam. - ...a tentar passar despercebida... -  ...o silêncio dele punha-me doida! -  Antes de morrer... - A mulher que ontem viste da janela, parada na praça, era Ema. - ...a loucura toma conta do meu corpo. - ...o único prazer... - Primeiro recusou-se a ouvir a voz. - ...dúvida...- Mas porque é que o fazia? - Estou cansada. - ...a dor, a raiva, a náusea. - ...ela era a voz. - ...entendeu que havia a outra." E aos dois fios condutores se entrelaçam, e só pode haver curto-circuito.



Das coisas.


Uma estátua, dois biscutis, dois quadros, umas quantas bonecas, um pendente de rubi. Também nos dá conta das coisas, de seu fim, terminada sua razão de ser, duas árvores, a do balouço e a de Natal, e entre elas transita toda uma vida, resta a pergunta várias vezes repetida: "Cambaleia?"



É má Ema?

Da maldade e da bondade das pessoas prevalece interpretação subtil, que não poderemos sequer tatear,  quanto mais discernir. . . A catarse sem  a devida licença aristotélica não é purificação, é chafurdar-se. "Cambaleia?"


As banalidades da vida, na maioria das vezes, são tão eloquentes como penetrantes, e nós não nos damos conta as crendo apenas banalidades.



(*) Da 1ª Edição da D. Quixote de Janeiro próximo passado.