sábado, 13 de março de 2021

( A beleza da dúvida 3) - O Infinito filosófico.



 As indagações e dúvidas humanas em suas sucessivas manifestações, formam e conformam um corpo de questionamentos, que, em sua lógica, estabelece o Universo filosófico, que tendo começado com as dúvidas de um só homem que se questionava, e depois de outros mais (os filósofos clássicos) evoluiu em áreas de dúvidas que se acumularam ao longo do tempo criando diversos e distintos campos de indagação filosófica. Dentro do campo racional, por exemplo, criaram a Lógica, e depois a Psicologia, e no campo do conhecimento a Epistemologia, criando desse modo, vários e diferentes campos bem delimitados em suas diversas áreas de questionamentos, demarcados pela natureza da indagação.  

Se na ciência haverá alguma esperança de remissão, na filosofia essa escapa. Inexoravelmente a filosofia estabelece novas confabulações, que inelutavelmente nos levam a outras dimensões da dúvida, que então abrem outras novas questões filosóficas desconhecidas, ou remetem ainda para outras, que, mesmo muito exploradas, agora se apresentam com nova roupagem face desta nova dúvida nova suscitada, tendo sido anteriormente desapercebida, não tendo despertado nossa sensibilidade para dar-lhe a atenção devida, com mais saber abre-se mais questionamento.   

São descobertas dentro das descobertas, revelações novas, novos caminhos que devemos percorrer para responder às perguntas, as incessáveis e incessantes questões que são propostas pelo simples ato de pensarmos sobre alguma questão.

<<Primum vivere, deinde philosophari>> diziam os antigos a gozar com os que, cogitando das coisas, não ganhavam seu sustento, aqueles que eram dados mais às coisas do espírito, secundarizando as da matéria, quase como na religião. Com a evolução da sociedade abriu-se espaço para esses, todos os que eram dados às coisas do espírito, que passaram a ser as coisas que mais importam (sucessivamente 4 revoluções industriais libertaram muito os homens da matéria) e fez-se o tempo dos filósofos, dos cientistas, etc... sendo estes hoje muito melhor remunerados do que os que antes priorizavam as coisas da matéria, excepção feita aos desportistas, ou aos grandes artistas, que lhes ultrapassam em ganho. Mudam-se os tempos mudam-se os valores e o que é valorizado.

Quem mergulha nesse universo sem fim, vê a beleza incrível que há nas coisas, e descobre seus padrões, os que, maravilhado, tentarão explicar, para achar suas razões e causas, perceber suas leis, suas regras de formação e existência, suas origens. Com a apreciação tão somente mental e sentimental das suas manifestações, uma vez que aquilo que se busca é, e permanece invisível, até que se venha dar a conhecer, e possa, então, ser reconhecido, ao revelar-se, o que antes era ignoto.

Como "o desejo não surge da inteligência", atendendo a assertiva de Unamuno no seu "Del sentimiento trágico de la vida", 1904, ao comentar a antiga máxima escolástica: <<Nihil volitum quin praecognitum>> que nos leva aos pontos cegos da observação, escotomas intelectuais, pois mesmo que não os percebamos, podemos ainda assim os desejar, uma vez que há toda uma gama de obscuridade que somos capazes de percorrer ignorantes na busca de um desejo. Esta a magia da filosofia, que mesmo sem contradizer o antigo apotegma escolástico o ultrapassa, uma vez que seu universo é atemporal e ilógico, e só em sua descoberta se tornará lógico, como consequência óbvia que resultará dos novos valores então descobertos. Camões em seu magnífico Soneto já nos prevenira: " Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades." (Sugiro sua re-leitura completa.) 

Eis que este fascinante universo filosófico traz, nas suas dúvidas, beleza infinita, que ao enganar o cérebro, que não reconhece o que não conhece, permite que este se dê conta do invisível, que era até aqui inexistente, e possamos entender como Camões: "E afora este mudar-se cada dia,

                                                                                Outra mudança faz de mor espanto,

                                                                                Que não se muda já como soía." 



 

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