sábado, 27 de outubro de 2018

E o amor venceu o ódio.




O que poderemos esperar dessa fase que o Brasil atravessa?

Apropriei-me deste sound-bite de campanha para intitular essa crônica porque define absolutamente o que se vai passar de um modo ou de outro, se não vejamos.


A Democracia está tentando se implantar no Brasil, e carece de se enraizar para que todos definitivamente percebam que a Democracia é o pior dos regimes, exceptuando todos os demais, ou seja essa herança grega da forma de resolver os problemas da polis, é a única solução humana plausível de ser alcançada para a vida em comunidade com justiça. Quando isto estiver bem entranhado nas mentes e corações dos brasileiros, eles não mais correrão o risco de ditaduras, de ditadores, de regimes de exceção, de todos os desvios que existem e afastam os governos sob estes desvios da vontade soberana do povo para atender a outros interesses, coisa que também acontece com os eleitos democraticamente por se deixarem tentar pelas mais diversas canções (cantos de sereia) e pelos mais escusos interesses que sempre condenarão aos seduzidos por assim procederem. Até lá...

A ainda insipiente Democracia brasileira está sendo sujeita a um teste pesado que a trará renovada para a tona dos acontecimentos futuros, e isso faz-me lembrar de duas verdades esclarecedoras, uma dita por mim, outra é um conto de Machado de Assis.

1. Numa entrevista que dei certa vez logo após o caso da UNE, perguntaram-me em quem pretendia votar para presidente se a escolha que se me apresentasse fosse Lula ou Afonso Arinos de Melo Franco, que já no final da vida voltava por aquele tempo à ribalta, daí a pergunta. Vieram os minutos do intervalo da propaganda televisiva, e meu entrevistador queria saber em off da resposta que iria dar. Resisti, passaram-se aqueles breves minutos, e a conversa termina com ele dando-se a certeza de que eu votaria Lula, homem de esquerda que sou, e que portanto... Voltamos ao ar, ele repete a pergunta, e para seu espanto respondo que voltaria Afonso Arinos. Estupefacto pergunta-me porque. E eu respondo prontamente: Porque a esse meu pai já pagou o champagne e do outro (Lula) terei eu de o pagar. Risada geral no estúdio, termina a entrevista, a hipótese das duas candidaturas não se coloca, passam-se anos, quando viemos a saber do Petrolão e de todas as ações do PT, e foi quando me dei conta que tristemente tinha tido razão antes do tempo.

2. O conto de Machado a que me refiro é o intitulado "A Igreja do diabo." Delicioso e educativo como toda a escrita machadiana, nos fala que o diabo tendo entendido que o êxito de Deus residiria na sua organização, subiu das profundezas indo ter com Deus, dizendo que a razão de Seu sucesso estava por ele ter igreja, com intermediários eficientes, um culto organizado etc...etc... E que ele, diabo, não, tinha tudo sem uma ordem bem estabelecida, sem entidades que o coadjuvassem, sem nada, e era esta a razão de seu pouco sucesso em contraste com o espetacular sucesso divino. Deus respondeu-lhe que se assim achava deveria, então, se organizar, e imediatamente sentindo-se autorizado, começa a constituir sua igreja muito à semelhança da Igreja de Deus, mas com os seus pressupostos e ritos diabólicos evidentemente. Assim procedendo sua igreja encheu, a devassidão e a libertinagem atraíram milhões de fiéis. O diabo regozijava-se de ter uma igreja que de dia para dia tornava-se cada vez mais poderosa. Porém a licenciosidade cansa, sobretudo em confronto com a índole da maioria que não é salaz, e toda aquela depravação que de início tinha tido seu poder sedutor, transformou-se logo numa ação desgastante, esvaziando a igreja do diabo de seus seguidores fartos e exaustos.


As instituições serão posta a provas, e talvez o PT tenha aprendido a lição e perdido sua voracidade e vá buscar um novo caminho mais próximo da ideologia que o formou, e, por outro lado, se estiver em nosso Karma passarmos pela experiência que presentemente se intitula pesselista, o povo sairá refeito como os adeptos da igreja do diabo que logo retomaram ao bom caminho, assumindo propostas menos odiosas; e retornando à senda das boas propostas cedo se desiludiram da pretensão que há um caminho curto, cheio de ódio que nos possa levar a uma sociedade justa e equilibrada. É bem verdade que num país onde há dezenas de milhares de assassinatos todos os dias, seis, sete dezenas de milhares deles anualmente, o que leva a um absurdo número de ocorrências diárias, as coisas alcançaram um grau de distorção que requer muita ação sociológica para repor os carros nos trilhos, e é compreensível que os menos esclarecidos acreditem em medidas miraculosas, igrejas dos diabos, que os possam conduzir às situações desejadas. Só que não há milagres sociais, por mais que se evoque Deus. Só que não há soluções rápidas para a construção de uma nação. UMA NAÇÃO É UM LONGO E DEMORADO EDIFÍCIO QUE SE CONSTRÓI AOS POUCOS. O Brasil tem necessidade de estimar-se, de respeita-se, de valorizar a vida humana, e ter presente os sentimentos mais próximos como nos ensina Deus em seus mandamentos, e está nos valores do paradigma sociológico respeitar o próximo, e só assim poderemos alcançar o ensinamento cristão e com o amor vencermos o ódio.

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

A estupidez do Montijo.





É urgente um novo aeroporto para Lisboa, porque a realidade portuguesa mudou, porque Portugal está na moda, porque a TAP quer e precisa crescer, por toas essas razões e muitas outras, só que não pode ser no Montijo.

Só um idiota que não conheça a região é que pensa que o aeroporto pode ser construído ali. Zona lodosa, de difícil consolidação, muito afeta às subidas das marés, que devera ser parque natural intocável. E, ademais como se apresenta o projeto, ameaça o mais importante logradouro de pouso para as aves que migram de África para nidificar na Europa, destruindo boa parte do sapal, os terrenos que caracterizam um ecosistema único, que para além das lezírias, esse paul é a expressão ambiental que traduz o local de atração das aves, tudo o mais no projeto é indício forte da ignorância ambiental de quem o realizou. Ademais como escrevi na crônica intitulada Com uma cegonha na turbina, onde deixava claro a inadequação do local para trânsito de aeronaves, onde o efeito ambiental é óbvio, a brutal agressão para as aves.

Pode o governo insistir em 10, 100, 1000 relatórios, a conclusão  será sempre a mesma, o local não se adequa para a instalação de um aeroporto internacional, muito menos com as exigências que tem o hub de Lisboa. Estão promovendo enorme perda de tempo e dinheiro. Há ano e meio escrevi esse artigo onde deixava claro que o local não se adequa a instalação de um aeroporto. Fi-lo de graça, baseado na pura lógica, sem maiores estudos ambientais, apenas baseado nas minhas muitas visitas para observar as aves que fiz em vários anos, para ensinar o amor à natureza a minha filha Rafaela. Passado este tempo, dois estudos de impacto ambiental depois, que mostram claramente a inadequação do Montijo para receber um aeroporto, muitos milhões jogados fora, e uma insistência abstrusa por uma escolha absurda, vem a público (SIC 22/10/2018) o que qualquer pessoa de bom senso sempre sabia: O MONTIJO NÃO SERVE PARA RECEBER UM AEROPORTO. (PONTO FINAL.)

Depois dessa enorme perda de tempo e recursos com uma escolha errada, em detrimento de escolherem local próprio, ainda que mais distante, e darem-lhe as condições de viabilidade (Por exemplo um trem bala, de alta velocidade, para chegar em minutos a Lisboa.) resolvendo o problema de um aeroporto que já devia estar em construção há mais de um ano, e que já estaria se não fosse a teimosia em insistir n'A estupidez do Montijo.

sábado, 20 de outubro de 2018

A Ilusão Bolsonaro.







Quem não tem ideologia, tem impulsos. Quem não tem âncora vive à deriva, vive de ilusão, e se deixa constranger por modismos, por momentos, por expectativas, por crenças passageiras, e essa condição não é um privilégio brasileiro, vamos vendo a estupidez e o engano pulsarem por toda parte. Quem pode aceitar o que se passa na Venezuela? Ou nos EUA? Portanto a estupidez está longe de ser um privilégio brasileiro. Fica cada vez mais claro que as pessoas votam não em propostas, em projetos, ou nas capacidades dos candidatos, mas na sua capacidade de expressar as sua indignações, de corporificar suas múltiplas inquietações, os que são capazes de representar sua revolta, só que isso tudo é engano e erro. O mundo tem muita sorte de não ter havido muitos mais Hitlers, Stalins e Trumps, personalidades ao pé das quais O Sr. Jair Bolsonaro, além de ser um menino de coro é um sábio, pois não reúne nem toda a maldade, nem toda a estupidez ou a ignorância necessárias para ombrear com essas figuras, que chegaram ao poder por circunstâncias semelhantes que viviam seus países quando de sua ascensão,  ou souberam oportunamente lançar a inquietação, a mentira, a contradição, ou, mais provavelmente, tudo isso junto, os meios eram diferentes, mas os métodos eram os mesmos.

Mais cego é aquele que não quer ver.

O noticiário e os 'opinion makers' após o resultado da primeira volta no Brasil foram unânimes por todo o mundo fora, a sensibilidade das pessoas chocadas com a possibilidade de outro desqualificado e facistóide ascender, estampavam sua surpresa e indignação: O New York Times afirmava "Fears rise over..." The New Yorker afirma que Bolsonaro é metade Trump, metade Rodrigo Duterte, o fascista Filipino que se compara a Hitler e chamou o Papa Francisco de filho da puta, e tem toda sua campanha baseada em mentiras (fake-news). Até os vetustos jornais franceses não escusam em vê-lo como fascista.  Nos jornais portugueses todos os dias há comentários, e quase nunca são favoráveis, e todas as figuras públicas da esquerda a direita já expressaram sua opinião do atraso que representará a eleição de Bolsonaro. Os comentaristas todos já debateram lucidamente, expondo seu entendimento do atraso que será essa eleição, só os brasileiros seguem cegos, em Portugal desde Catarina Carvalho no DN até o José Carlos Vasconcelos na Visão que chama Bolsonaro abertamente de fascista, há uma unanimidade clara do que ele é e representa, não há enganos ou meias palavras, só no Brasil se instalou uma nuvem de ilusão. Porque o Brasil estará preocupado com a segurança, que certamente não será um item de se menosprezar, mas dar tanta ênfase ao assunto que se escolha um presidente por suas supostas qualificações para o combate à criminalidade, é menosprezar dúzias de outras prioridades que requerem igual ou maior atenção, subvertendo todos os valores de um país em troca de um único ponto que ressalta por certamente inspirar terror.

As pessoas estão perdidas e voltadas para um só ponto, desinformadas que são, menosprezando outras tantas soluções que deviam estar sendo debatidas, sobretudo a reforma partidária e eleitoral, maior prioridade.

Assim vem fazendo o Sr. Bolsonaro, despreparado, não vai a debates, ignorante, não apresenta projetos, inconsistente, não tem programa, lança ideias esparsas que servem de atração aos milhões de 'injuriados' pela má governação, que se sentem melindrados com a falta de governo eficiente, e se sentem ofendidos com a inoperância política em geral, e mesmo traídos pela opção que fizeram que usaram o poder para fins inconfessáveis. Por outro lado o Brasil vive desde há muito um 'encilhamento' político, que nem o Lula teve coragem de desmascarar. Deveria ter exposto o processo de negociatas que há em torno de qualquer negociação parlamentar para votar qualquer medida. Tendo evoluído o toma-lá dá-cá de uma negociação que atenda aos legítimos interesses políticos de qualquer deputado, ou grupo parlamentar, para uma outra que atende só a seus interesses pessoais, desta maneira institucionalizando-se e corrupção (Mensalão). NADA MUDOU! E nem 1000 salvadores da pátria na presidência poderão deter o surto de desgraça promovido por existirem dezenas de partidos, que atuam apenas como agentes de seus interesses e nada mais. O país está dilacerado por ter suas riquezas canalizadas para grupos de poder, em detrimento de gerar mais progresso, e de promover a melhoria do povo em geral. Se não fosse tão rico já teria falido! O Brasil deveria contrapor através de uma imposição constitucional não poder haver mais de meia dúzia de partidos. Partidos de denominação religiosa, regional, classista, deveriam ser absolutamente proibidos, não tolerados à luz da constituição. Ou o Brasil se reforma ou morre. Eu que amo tanto o Brasil, vou ficando convencido que não é mais pra mim, e que se vai transformar outra vez numa republica das bananas por culpa de terem deixado espaço para emergir uma extrema direita que conquiste votos porque a esquerda falhou em atuar no poder, e a direita falhou em ocupar seu espaço enquanto oposição e se preparar para voltar ao poder.

 Esses jovens que estão na rua hoje, deveriam começar um movimento pela reformulação da classe política, exigindo legislação que impeça a qualquer político, sua eleição para um terceiro mandato no mesmo cargo eletivo, para que possa haver uma constante renovação, sem permitir que se criem raposas felpudas, prontas a ludibriar o sistema, e negociar até o último centavo seu voto parlamentar, só visando atender a seus interesses particulares, ou ao enriquecimento pessoal, voto que só deveria ter em meta o interesse público. E numa postura de rechaçar um retrocesso, esquecendo a ignorância, sobretudo a política, que impera no Brasil, esses jovens gritam com propriedade: Somos todos anti-fascistas! Somos, os que sabemos o que isto é. 


Quem quiser leia a notícia do NY Times:

• The fate of the Amazon, the largest tropical forest in the world, could be shaped by the next president of Brazil
The front-runner in the Oct. 28 runoff is Jair Bolsonaro, above, a far-right congressman who has said that Brazil’s environmental policy is “suffocating the country” and recently received an unwelcome endorsement from David Duke, the former grand wizard of the Ku Klux Klan. 
Mr. Bolsonaro has promised to fold the Environment Ministry into the Agriculture Ministry, which tends to favor those who would convert forests into farmland. He also dismissed the idea of setting aside any reservations for native Brazilians, who have lived in the Amazon for centuries and may provide some of the best protection against deforestation. 
Separately, our climate team explains how climate change is affecting our future as well as our past in this week’s Climate Fwd: newsletter.

sábado, 29 de setembro de 2018

NEXO DE CASUALIDADE.






Não me digam que foi fortuito. Morreram 64 pessoas, certamente haverá uma razão para essas mortes além da simples coincidência ou da ocorrência inopinada. Haverá uma relação causal, cujo drástico efeito revela mais para além da ocorrência, revela incúria, falta de prevenção, falta de aplicação dos que têm a responsabilidade de prevenir situações dessas. Homessa, não haverá de faltar vínculos para estabelecer o nexo de causalidade mister a revelar essas responsabilidades, deixando-se ficar pela lógica que dá título à crônica, como se apenas se somassem fatores imprevisíveis para o acontecido.

Imprevistos foram, o que sempre será uma atenuante, mas que não eximem aos envolvidos (ora denunciados) da condição de responsáveis. A alegação, recurso da defesa, de que terão sido casuais os fatores que concorreram para semelhante tragédia, no que todos acreditamos, não retira a responsabilidade causal dos acusados por serem em última instância obrigados a dar resposta eficaz em tais circunstâncias casuais, para isso eles existem e são remunerados, resposta que evite mortes, que evite a tragédia, o que não aconteceu.

Com fatalidade, mas sem fatalismo, redundou na desgraça maior que pode ocorrer -Pôr em causa vidas humanas- não podendo ser excluída a responsabilidade que vincula toda e qualquer decisão inadequada. E inadequado é tudo que pode pôr em risco uma vida, apenas uma, quanto mais ceifá-la. E na origem dessas decisões estabelece-se o tão terrível nexo vinculativo, em desprezo de qualquer lógica fortuita. A pergunta que deve ser feita para estabelecer o vínculo pretendido, o dito nexo de causalidade, é a seguinte: O que levou, aos que morreram, a estarem naquela hora no lugar que teve as condições que os mataram? Mais simplesmente: Porque foram parar ali? E a resposta é só uma:  Foi não lhes ter sido oferecida outra alternativa, não lhes terem indicado outra solução. Fosse qual fosse, qualquer outra que não os matasse. (Ou por terem indicado aquela alternativa, ou por não terem indicado outra, são responsáveis.)

Não havendo nenhuma casualidade a ser invocada, fica clara a relação de causa e efeito que se estabelece, formando a culpa de quem lhes apontou o caminho da morte.

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

O torpe Mapplethorpe.





Pousada a fumaça e poeira que se levantaram em Serralves, nome icônico no mundo das artes em Portugal, podemos estabelecer um quadro mais nítido das ingerências em jogo ao redor das luzes e interesses que estiveram em discussão, motivadas pela virulência da exposição do fotógrafo homossexual norte-americano que morreu de SIDA, e tido como sensível no tratamento de temas controversos.

O que se revelou um fato foi que os temas de Mapplethorpe cumpriram mais uma vez seu desígnio, o de suscitar contestação e dúvidas, expressão pela qual se tornou conhecido o fotógrafo que morreu há 20 anos. Homossexual, teria uma sensibilidade especial para a matéria específica, a qual fotografava, dando visibilidade a uma temática mais reservada, sobretudo durante o período de vida do fotógrafo, e que depois foi ganhando as praças públicas sob a sigla LGBT, dando expressão às diferentes sensibilidades sexuais, deixando de ser uma condição pessoal, para passar a ser uma situação a dever ser reconhecida por todos como temática de interesse geral, uma vez suscitada.

E aí o busilis, tanto do assunto como das fotografias expostas em Serralves, porque trazem à baila assunto hermético, expondo à luz (no caso à luz captada pela câmara fotográfica) expressões que acredito não deveriam estar expostas em Serralves, e que por razões de disfuncionalidade gestora da Fundação, lá foram parar imagens que nunca deveriam lá ser expostas, face do público frequentador da mesma, e da necessidade imperiosa (atendida) de restringir a visibilidade das mesmas ao referido público que maioritariamente visita as exposições lá promovidas.

Faço só uma pergunta: Porque expor algo que nem todos podem ver?

E o verbo empregado em meu questionamento é o poder, não o dever,entendimento acolhido, uma vez que a própria fundação restringiu o acesso. E aqui devo informar ao Dr. Pacheco Pereira que restrição de acesso é uma forma de censura (ainda que concorde com ela) que poderia ser evitada, não fazendo semelhante exposição. Mas Serralves tem de ser moderna, Serralves tem de ser de ponta, e é verdade, e Serralves tem cumprido um papel único no cenário das artes em Portugal, trazendo o que há de mais arrojado, promovendo cultura, espalhando saber, criando educação, nada mais meritório pode haver, mas esta exposição era escusado. Tudo que se faz tem lugar próprio, e as imagens que traz o fotógrafo de especial sensibilidade, terá um público alvo que não são as crianças que frequentam em magotes de avultado número as salas da fundação tripeira.

Erraram todos. E, na fogueira que se acendeu, chamuscou-se a mais respeitável entidade de promoção das artes contemporâneas em Portugal, com muitos dignos nomes enfumaçados pela tisna grudenta que se levantou, e queimou-se de forma irrecuperável o curador da exposição, que surge como um metafórico ícone da trapalhada, mostrando vileza contra o pano de fundo da torpeza da sensibilidade do fotógrafo, não por abordar o tema, seu direito, mas por o crer universal.



quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Das eternas Cartas Portuguesas.












    Várias Marianas, três Marias e uma Inês.
    Na senda de uma tradição tri-centenária, desde quando Claude Barbin em 1669 publicara a tradução francesa, idioma que as três Marias também utilizam, de cinco cartas de amor de uma mulher, uma Mariana, como as Marianas que também evocam essas três Marias, aquelas eram cinco cartas que desde o tempo de Luís XIV revelam uma sensibilidade, um grito, aquele emitido desde um claustro, mas a mesma sensibilidade da mulher, e a razão, a mais perene de todas, amor. 'Ut ego amo te amo'
    'Amor me ad vos', um desejo singelo, um Direito mesmo, tão reprimido, tão esmagado, que a sua só revelação é um escândalo, mas é uma expressão sublime de beleza que muda o caminho da literatura por existirem aquelas cinco cartas, e em existir se resume muita vez a razão de que as coisas sejam de um modo e não de outro, assim como existem essas novas.
    Assim como existem também essas três Marias suas autoras, a Teresa, a Velho, e a Isabel que hoje nos deixa, mas da qual fica seu grito, uníssono com as outras duas que seguem guardando o testemunho, como aquele grito da Mariana Alcoforado, a anônima, que a partir de seu claustro fez ecoar pelo mundo fora, e que, pela sua força e beleza, permanece e permanecerá. São suas cartas, que, assim como as novas, portuguesas ambas, revelam a magia de um tempo, cada qual de per si, neste lapso temporal de três séculos entre ambas, assim como existe um sentimento de mulher que cumpre seu desígnio, assim como há forças que se lhe opõem, haverá sempre a expressão desse sentimento que, feminino, vem revelar, quem sabe?, "O lugar comum" como queria a Maria do meio em seu primeiro trabalho publicado, essa Velho que esconde o nome de sua santa, uma Nossa Senhora, a mais portuguesa de todas as Nossas Senhoras, ou quererá a primeira a da santa que poderá ser a d'Ávila, a de Lisieux, preferida no diminutivo, a dos Andes, Edith Stein, a judia, ou a santa do dia de hoje, a de Calcutá, não importa, haverá sempre uma "Minha Senhora de Mim" a nos dar "Educação Sentimental" Ave Teresa Horta! Como ficará para sempre em nós a memória da Maria que nos deixou, do nome dessa santa portuguesa que foi rainha, certamente a mais portuguesa das santas, que n'"A Condição da Mulher Portuguesa", marcou a "Crônica do tempo" sendo um d'"Os sensos Incomuns" de sua época, que como mulher recusou-se a ficar n'"As Vésperas esquecidas" fazendo-se presente, expressando sua totalidade na plenitude de sua existência que por fim terminou. Ave Maria Isabel Barreno de Faria Martins.
    E por fim uma Inês, não como aquela perdida para a vida que só morta foi coroada, mas muito viva, ativa, quem sabe até aflita da aflição bendita de querer realizar, das atribulações de enfrentar os desafios, do imponderável esforço de realizar e realizar-se, que empreende o obra da Sibila, não aquelas gregas, depois romanas longínquas, mas dessoutra que se expressa, em páginas de tinta e papel, buscando espaço num mercado tão difícil como é o livreiro. E se lhe perguntarem porque essa obstinação, essa intenção, certamente responderá que é porque transita entre a "Eternidade e o desejo." e mais dirá ao mundo que constrói: "Fazes-Me falta." Far-lhe-á falta a industria, pois sobra-lhe engenho e arte. E labuta para que todos os que carecem do diálogo mudo da leitura, possam ter o objeto mais fadado do desejo, colocando-o "Nas tuas mãos.", nas tuas leitor voraz, que a profética Sibila é sua editora.  Ave Inês Margarida Pereira Pedrosa.
    Que Deus abençoe a todas.

    Façam outra golpada.











    A crise das dívidas soberanas ocasionada pela crise da negociata dos EEUU no subprime, que fez uns quantos bilionários, todos desfrutando tranquilamente de suas golpadas, remeto-vos para o Expresso de 23/9, crise que não acabou (NYT - 14/9) e que custou milhares de vidas e negócios arruinados, com milhões de pessoas afetadas em todo o mundo, para que umas quantas dezenas de Yuppies tivessem milionárias contas bancárias. Nenhum banqueiro foi preso, excepto na Islândia, Espanha (alguns) e Irlanda (alguns) e mais uns gatos pingados, a administração ruinosa ficou por isso mesmo, as promessas do Sr. Obama do começo do seu mandato de que iria resolver o assunto, ficaram no esquecimento, terminaram dois mandatos do homem e nada. O mercado continua desregulado, e nada foi ou pensa ser feito dez anos depois (2008 - 2018). A conclusão lógica é de que o crime compensa, e mais hora, menos hora, fazem outra.

    No outro prato da balança temos as pessoas afetadas, que empobreceram, muitas faliram, algumas suicidaram-se, outras estão sem emprego, é gente que come pior, não se trata - não tem dinheiro para médicos e medicamentos - países inteiros passam fome com as economias destroçadas, com dívidas absurdas (Grécia, Irlanda, Portugal - por exemplo) vidas arruinadas e o futuro comprometido, este é o resultado da golpada do subprime, e é como se nada se tivesse passado!

    Mas é do futuro comprometido que vos quero falar, a notícia do NYT de hoje (27/9) diz que a pobreza infantil aumenta, e que um terço das crianças atingirão a plena pobreza em 2021, não é na Somália, ou na Gâmbia, no Ruanda, no Burundi, ou no Madagascar, na Colômbia, no Haiti, não!
    É na Inglaterra. Quando a perspectiva inglesa é essa, já se pode entrever a do resto do mundo, exceptuado uma dúzia de países, a miséria está rondando-nos a todos . O futuro ficou comprometido por uma jogada financeira e ninguém fez(faz) nada. Eu já escrevi muito sobre isso, apontando responsabilidades, exigindo regulação para evitar que se repita essa desgraça, e quando penso naqueles golpistas ladrões que roubaram bilhões, a pensarem se compram ou não o próximo Picasso que vai a leilão na Christie's, e, ao mesmo tempo, nas crianças que precisam de um prato de comida, perco um bocado a vontade de escrever seja o que for.  

    E tanta gente que acorda enregelada porque não pode pagar nenhum tipo de aquecimento, quantas crianças irão mal vestidas para a escola com alimentação insuficiente, ou sem alimentação, enquanto a secretária do golpista americano liga para o alfaiate do mordomo do patrão para dizer-lhe que faça nova coleção de uniformes para o mordomo, porque o patrão não gostou do tom do azul desses que ele vieram, ou chama àquela firma especializadíssima e caríssima para vir ver umas quantas poucas algas verdes que se formaram junto ao ralo da piscina quente, a das estufas das orquídeas. Eu conheço muita gente que tem essas piscinas aquecidas, e as conseguiram com trabalho, gerando empregos, fabricando umas quantas utilidades, ou prestando uns quantos serviços, e eu acho muito bem que desfrutem, mas quando o dinheiro vem da especulação financeira, essa mesma que continua desregulada, é indecente, é um convite ao crime, o que compensa, um desrespeito com a miséria alheia, e, ademais, grita a plenos pulmões: Façam outra golpada!