quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Tempos modernos. (Da série: No universo das palavras.)





Não não tem nada a ver com cinema, ainda que tenha tudo a ver, apesar de eu adorar o filme deste título, aquela cena de apertar os botões do casaco da senhora é um achado, Chaplin era mesmo exepcional. Essa crônica é um reparo sobre a agilidade dos nossos tempos, ditos historicamente contemporâneos, e contemporâneos serão dos que neles viverem todos os tempos em que esses vivam, mas não se encontrou nome melhor, fico a espera de como irão denominar a próxima era na qual já entramos, e modernos, em oposição aos antigos, será para cada um de nós os tempos que nos forem próximos, que nos referencie de alguma maneira, opondo-se àqueles que não têm nada a ver conosco, nos sendo, destarte, estranhos, alheios, portanto de uma outra época que não a nossa, e os classificamos genericamente de antigos.

Portanto desses tempos que têm a ver conosco, dos ditos modernos, resulta uma primeira causa imaterial que transversalmente traspassa toda a gente, a pressa. Sim vamos cada vez mais vivendo tempos apressados, desde sempre vos digo, e aqui,  para afirmar isso, apoio-me no antigo provérbio latino que professa com firmeza: Bis dat que cito dat, mostrando já a valorização da urgência, pois duplicava o valor da dádiva se ela fosse ágil, rápida. 

Com o pausado passar do tempo a situação agravou-se porque os anseios deixaram de ser por rapidez, para reclamarem atendimento, satisfação, solução pronta, de tal ordem que começamos, sobretudo graças aos avanços da técnica que permitiu existirem máquinas, que aceleraram a satisfação das pretensões dos modernos, sempre mais rapidamente à medida que avançávamos no tempo, porque a tecnologia forneceu os meios para essa rapidez, a rejeitar tudo que fosse normal.

Tudo isso se reflete em tudo no que é do homem, sua saúde, sua casa, seu trabalho, suas relações, sua família, sua língua. Algumas dessas influências não são pela positiva infelizmente, posto que outro ditado nos ensina que a pressa é inimiga da perfeição, no extremo, mas a pressa é sempre inimiga de tudo que é feito pelo homem, as máquinas não, para elas esse fator não conta, para o homem sim, modifica de tal modo sua gramática, lato sensu, que sua prática torna-se defeituosa mor das vezes, torna-se insatisfatória ou incompleta; para não dar ideia péssima, que é a que fica, da ação da pressa em nossas vidas, não nos referiremos aos efeitos, em sua maioria danosos, que resultam dessa opção naqueles pontos a que me referi: na saúde, na casa nas relações et cetera, mais podemos verificar que essa pressa evoluiu, quanto mais modernos se tornaram os tempos, em aflição, aflição essa que atende pelo nome de imediata, na atenção cada vez mais pronta àquela pronta solução.

A busca da instantaneidade, de soluções cada vez mais repentinas, resultou, em seu reflexo linguístico, em quatro palavras para isso originadas do adjetivo: imediatez, imediatismo,  imediatidade, e imediaticidade, que querem dizer todas, rigorosamente, a mesma coisa: qualidade do que é imediato, que é a tal qualidade tão almejada por uma humanidade a viver numa velocidade cada vez mais frenética. O oposto a imediato, que é lento, moroso, vagaroso, demorado, só possuem um único substantivo, cada uma, para definir sua qualidade, o que revela ser uma qualidade menos apreciada. A ânsia antiga que nos envolveu desde sempre, e que os antigos consideravam que era dar duas vezes quem desse depressa, numa faina de agilidade que progrediu sempre e que progride sem parar, e que vai parar um dia quando chegue ao fim, pois que tudo tem um fim, e o fim da pressa é muito conhecido: é o trambolhão, o defeito, a imperfeição.


Imersos na busca do imediato perdemos a sensação da fluidez do tempo, e com essa perda a consciência de sua fluência, que é a melhor influência que possamos ter, pois a aceitação daquilo que não podemos modificar é a melhor política, como paira na oração de São Francisco, e que deixar seguir a onda, que é sempre o melhor remédio, aproveito e lembro um pagode que o Zeca cantando com sua rítmica evocativa nos dá uma lição existencial: "Deixa a vida me levar. Vida leva eu!!!....Se a coisa não sai do jeito que eu quero, também não me desespero,.... Vida leva eu! Sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu."   

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